Título: Eleitor vota na campanha de TV
Autor: Torres, Bolívar; Barbosa, Marco Antonio
Fonte: Jornal do Brasil, 05/09/2008, Tema do Dia, p. B2

Bolívar Torres Marco Antonio Barbosa

Humor, ironia, inteligência e surrealismo não são, tradicionalmente, características da propaganda política brasileira. Nessas eleições, a história mudou. Com a campanha Vota Brasil, que a agência W/Brasil criou para o Tribunal Superior Eleitoral em torno do pleito municipal a ser realizado em outubro, os tons burocráticos e desinteressantes de peças de marketing do passado morreram. A importância do voto (e de se votar com consciência) vem sendo ilustrada numa série de comerciais veiculados desde 31 de julho ¿ que estão mudando a forma de tratar de política na TV e o modo como os telespectadores encaram a propaganda eleitoral. A campanha, dividida em três fases, já pôs no ar seis filmes que surpreendem ao usar de ironia e metáforas nada previsíveis. A terceira etapa, iniciada na última segunda-feira com um filme estrelado pela atriz Lavínia Vlasak, procura explicar para o eleitor como votar.

¿ Esta última etapa será mais didática ¿ explica Eiji Kozaka, diretor de arte da campanha Vota Brasil, que teve em sua concepção a colaboração da Fundação Padre Anchieta. ¿ Mas tudo será apresentado de uma forma nova. É possível falar sério sem ser sisudo. Quem inova consegue atrair a atenção.

Na primeira fase, as mensagens alertavam a necessidade de não desperdiçar seu voto. Um rapaz postava-se, luneta em punho, a esperar a aparição de um cometa. Por um infortúnio, o cometa passa e ele não vê; estava olhando para o outro lado. No segundo filme, um motorista aguardava a passagem de um longo trem de carga. A composição rompe o cruzamento e, por falta de atenção, o motorista perde a chance de cruzar a linha férrea ¿ logo em seguida, outro trem gigante surge. A moral fica clara com a narração: "Perder uma oportunidade pode fazer você perder muito tempo".

Campanha mais leve

Na segunda fase da campanha, o clima dos anúncios ficava ainda mais surpreendente. Pessoas precisando conviver com problemas intrigantes (um homem com uma abelha zumbindo dentro do ouvido, uma mulher com a compulsão de andar em círculos) por quatro anos. A analogia: escolha bem seu candidato, pois você vai ter de aturá-lo até a próxima eleição. "Quatro anos é muito tempo. Principalmente quando as coisas não vão bem. Por isso, antes de votar, pesquise o passado dos candidatos. Porque são eles que vão cuidar da sua cidade nos próximos quatro anos", diz a narração.

Silvana de Freitas, assessora-chefe de comunicação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), explica a opção do órgão por mensagens menos convencionais para 2008.

¿ Normalmente as propagandas do TSE são mais sisudas ¿ diz. ¿ É uma bandeira nossa tornar a campanha mais leve, tirando o peso da obrigação de votar. A ideia é diminuir a sensação de obrigatoriedade, mostrando que o voto é um direito do qual o cidadão usufrui.

Eiji Kozka complementa:

¿ Escolhemos metáforas beirando o surreal e evitamos problemas que pudessem soar como críticas reais, específicas. Se mostrássemos, por exemplo, uma cidade violenta, ou cheia de buracos, poderiam achar que estávamos nos referindo a alguma cidade real.

A própria escolha da W/Brasil para assumir a campanha foi inesperada. A agência ¿ uma das mais bem-sucedidas do país, premiada inúmeras vezes no exterior e criadora de campanhas icônicas, como a do primeiro sutiã da Valisère ¿ nunca realizara trabalhos a mando de políticos ou anúncios institucionais para qualquer instância do governo.

Também no YouTube

Nas reuniões com o TSE, acompanhadas pelo ministro Carlos Ayres Britto, presidente do órgão, o consenso foi que a campanha teria de ser "diferente".

¿ O público está muito acostumado a um padrão conservador. Era importante causar impacto ¿ lembra Kozaka.

Uma boa amostra deste impacto é a reação aos vídeos da campanha postados no site YouTube (www.youtube.com). O anúncio Sapateado, no qual um rapaz sapateia descontrolado quando fica nervoso, foi visto por 45 mil pessoas em 10 dias. "A Justiça Eleitoral sempre fez comerciais fortes... mas esse ano está atuante em quantidade e qualidade inigualável... e espero mesmo que dê resultados e bons... Não votam e falam mal! e ainda se acham na razão de tal feito!", comenta um usuário do site.

Silvana de Freitas diz que a resposta do público tem sido satisfatória.

¿ A avaliação da eficácia da campanha será feita pela Fundação Padre Anchieta depois das eleições. Não fizemos um levantamento sobre o impacto ainda. Mas, extra-oficialmente, temos informações que a campanha está sendo bem recebida pela população.