Valor Econômico, v. 20, n. 4961, 17/03/2020. Legislação & Tributos, p. E1

Tribunais decidem manter apenas sessões virtuais

Beatriz Olivon
Joice Bacelo

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O comunicado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendendo os julgamentos presenciais para evitar a proliferação do coronavírus gerou um efeito cascata no Judiciário. Depois do anúncio, na manhã de ontem, pelo menos oito outros tribunais decidiram seguir esse caminho, além do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).

As sessões presenciais, no STJ, não serão realizadas até o dia 27. Já nos tribunais do trabalho, regionais e federais as decisões são diferentes. Cada um estabelece, a sua maneira, como funcionará nesse período.

O Carf suspendeu os julgamentos de todo o mês de abril. As sessões que já estavam marcadas para esta semana, a partir de hoje, serão realizadas com restrição ao público. Somente os advogados que atuam nos casos em julgamento terão acesso às sessões.

Já o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o maior do país em número de processos e de servidores, decidiu suspender todas as audiências e também as sessões de julgamento presenciais por um período de 30 dias. A Corte também optou por reduzir o horário de funcionamento para seis horas, das 11h às 17h.

“Diminui o trânsito de pessoas e, dessa forma, todos teremos mais segurança, o cidadão e servidores e juízes”, afirmou ao Valor o presidente do TJ-SP, desembargador Geraldo Pinheiro Franco. “Mas todas as medidas urgentes, seja no campo penal, no de direito privado e no público, estão sendo apreciadas pelos desembargadores e pelos juízes de primeiro grau. A população precisa estar segurança quanto a isso”, ressalvou, acrescentando que os julgamentos virtuais e as decisões monocráticas continuarão ocorrendo.

Praticamente todos os tribunais, na semana passada, já haviam adotado medidas básicas de segurança. Entre elas, permissão para o trabalho remoto aos servidores que viajaram ao exterior e também ao grupo considerado de risco - aqueles com doenças respiratórias e os que têm mais de 60 anos. A maioria também já havia limitado o acesso aos prédios.

Além do TJ-SP, seguiram os passos do STJ e ampliaram as regras de proteção por meio de novas portarias publicadas ontem os tribunais do Rio de Janeiro (TJ-RJ), do Rio Grande do Sul (TJ-RS) e de Minas Gerais (TJ-MG). Entre os tribunais regionais federais, o da 2ª Região (RJ e ES) e o da 5ª (que abrange cinco Estados) suspenderam os julgamentos. O da 3ª Região (SP e MS) decidiu que as sessões presenciais previstas serão realizadas por meio eletrônico.

As sessões também foram suspensas nos tribunais regionais do trabalho da 2ª (São Paulo) e da 10ª Região (DF e TO), no primeiro grau. É provável que esse número aumente nas próximas horas, podendo atingir inclusive a totalidade dos tribunais.

A suspensão das sessões não significa, necessariamente, que os tribunais ficarão parados. Com o processo judicial eletrônico, juízes e servidores conseguem ter acesso aos casos, conceder decisões monocráticas e realizar julgamentos virtuais.

No STJ já estavam previstas sessões virtuais para todos os dias deste mês. Nelas, são julgados recursos em que não há discussão do mérito - embargos de declaração, agravos internos e regimentais.

“Se fosse há dez anos [a suspensão de sessões] seria um caos total. Agora não vai ser”, afirma Maria Cecília de Araújo Asperti, professora da FGV Direito São Paulo. Segundo a advogada, hoje há amplo uso da tecnologia nos tribunais e as partes já estão acostumadas com esse intermediário. De toda forma, há perdas com a não realização de audiências, especialmente na Justiça do Trabalho, que tem muita prova oral, segundo a professora.

“Há prejuízo por não poder despachar ou comparecer a julgamentos, mas é algo a que os advogados já estão se habituando”, afirma. Segundo Maria Cecília, já existe um processo de afastamento na Justiça.

Mesmo com o Judiciário adaptado, o trâmite dos processos deverá ser prolongado. “Vai aumentar um pouco a morosidade”, diz a professora. Além disso, não é claro o que será considerado urgente para julgamento, já que não é a mesma situação de um plantão de fim de semana.

Ainda segundo a advogada, é válido pensar que as decisões do Judiciário nessa situação poderão ser seguidas em casos semelhantes no futuro, por doenças ou desastres ambientais, por exemplo. “Quem sabe o momento pode promover um avanço nas audiências à distância. ”

A suspensão dos julgamentos vai impactar no estoque - que soma atualmente cerca de 80 milhões de processos em todo o país. Para o presidente do TJ-SP, desembargador Geraldo Pinheiro Franco, essa possibilidade é “óbvia”. Ele acredita, no entanto, que a situação será normalizada ainda neste ano. “Nós hoje julgamos mais de 20% a mais do que entra de processos. Não temos um estudo exato do impacto. Mas como será uma medida para poucos meses eu acredito que nós consigamos resolver esses processos que não poderão ser julgados no período do coronavírus. ”