O Globo, n. 32569, 08/10/2022. Brasil, p. 12

Contas refeitas

Bruno Alfano
Paula Ferreira


O ministro da Educação, Victor Godoy, anunciou ontem, em um vídeo no Twitter, que as universidades, os institutos federais e a Capes terão recursos financeiros desbloqueados. Na sexta-feira da semana passada, às vésperas das eleições, o Ministério da Economia determinou que a pasta da Educação estaria impedida de gastar R$ 2,4 bilhões, com a promessa de que o valor voltaria a ser liberado em dezembro. Desse valor, R$ 328 milhões sairiam das universidades federais e outros R$ 147 milhões dos institutos federais, o que gerou forte reação dos setores educacionais.

— O limite de empenho será liberado para universidades federais, institutos federais e para a Capes. Temos uma gama muito grande de instituições. Conversei com o ministro (Paulo) Guedes, ele foi sensível e vamos facilitar a vida de todo mundo. Eu já tinha dito que não haveria impacto para as universidades e para os institutos, porque trataríamos caso a caso. Agora estamos fazendo uma liberação para todo mundo, para facilitar e agilizar — afirmou Godoy em um vídeo nas redes sociais, anunciando o resultado de uma negociação com o ministro da Economia.

O anúncio não especificou se foi liberado uma parte ou todo o valor bloqueado para universidades, institutos e Capes. O restante do bloqueio, em áreas do MEC que não foram detalhadas, segue em vigor.

— Esse movimento está sendo feito pelo Ministério da Economia, mantendo a responsabilidade fiscal, que é um pilar do nosso governo, mas também mostrando essa sensibilidade de facilitar a vida do gestor, do reitor. Meu gabinete continua aberto para qualquer reitor das universidades federais e dos institutos para conversar sempre e buscar as melhores soluções em cada universidade para fortalecer o ensino superior desse país. Sabemos a importância que isso tem para nossos estudantes e estamos juntos para poder trabalhar pela melhoria desse serviço para a população — finalizou o ministro no vídeo.

Temor político

Nos bastidores, o governo temia a repercussão negativa do bloqueio às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais e agiu para esvaziar possíveis protestos que pudessem impactar na imagem do presidente Jair Bolsonaro. Contrariando o que é feito usualmente, o Ministério da Economia não detalhou o bloqueio, depois de ele ser anunciado na semana passada, temendo impactos negativos na campanha à reeleição.

Alunos da Universidade Federal da Bahia, em Salvador, já haviam se manifestaram contra os bloqueios, na quinta-feira. O Nordeste é a região onde o ex-presidente Lula ficou à frente de Bolsonaro no primeiro turno, e o presidente quer reverter essa vantagem. Novos protestos, em outras universidades, eram organizados pelo país, antes do anúncio de ontem do o ministro.

Na véspera do recuo, Godoy havia afirmado que não haveria perdas de recursos, apenas uma "limitação na movimentação financeira". O ministro também disse que havia uso político nas críticas ao bloqueio, com a distorção das informações, para se disseminar que estaria havendo um corte do orçamento, o que negou. Na mesma conversa com jornalistas em que defendeu o bloqueio, Godoy havia rejeitado a possibilidade de que as universidades parassem por falta de dinheiro.

Em nota, o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif ) informou que recebeu a notícia do desbloqueio do empenho pelas redes sociais, sem ter havido comunicação oficial do MEC. "Aguardamos a liberação via Siafi — módulo gestor do orçamento das instituições — para a confirmação da informação", diz o texto, referindose ao Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal.

Ainda falta

A liberação não resolve os problemas financeiros das universidades e colégios federais, pelos cálculos dos dirigentes destas instituições. Em junho, o MEC já tinha cortado R$ 437 milhões das instituições de ensino superior e R$ 184 milhões das unidades de educação básica. Além disso, o orçamento de gastos discricionários de 2022 (R$ 5,1 bilhões) é 26% menor do que o de 2019 (R$ 6,9 bilhões).

A UFRJ recuperou R$ 18 milhões que teriam sido bloqueados e agora possui R$ 18,6 milhões para o custeio. Mas o custo total por mês com essa despesa é de R$ 24 milhões.

— Ainda não fomos informados oficialmente do desbloqueio. Caso ele se concretize integralmente, diminui bastante o risco de paralisação do semestre neste ano. Acredito que teremos problemas em alguns contratos, por conta do corte de R$ 23 milhões no primeiro semestre. Mas algo generalizado, creio que evitaremos — afirmou Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ.

A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições de Ensino Superior informou que se posicionará quando as instituições forem informadas oficialmente do desbloqueio, o que só deve acontecer na segunda-feira. Na quinta-feira, o presidente da associação, Ricardo Fonseca, havia dito que as universidades teriam problema em se manterem abertas.

"Estamos fazendo uma liberação para todo mundo, para facilitar e agilizar" _

Victor Godoy, ministro da Educação, um dia depois de defender bloqueios no MEC