O Globo, n. 32567, 06/10/2022. Saúde, p. 21

Compasso de espera

Melissa Duarte


A decisão foi tomada pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização do Programa Nacional de Imunizações (CTAI/PNI), da qual esses técnicos fazem parte, na última terça-feira. O colegiado marcou a reunião inicialmente para a última sexta-feira, mas o encontro foi remarcado — segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, o adiamento ocorreu porque o ministério não havia enviado aos técnicos o termo de confidencialidade que agora é exigido para acompanhar as discussões.

O grupo tem função de assessoramento, sem poder de decisão. É formado por representantes da pasta, de secretarias de Saúde e por especialistas do setor privado, que já haviam se posicionado a favor da vacinação em ocasiões anteriores.

Como mostrou O GLOBO, o Ministério da Saúde dizia aguardar a avaliação da CTAI e de integrantes da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) antes de chancelar a decisão da Anvisa. Com isso, a decisão ficou para depois do primeiro turno das eleições presidenciais. A avaliação de interlocutores ligados ao ministério é de que uma ala do governo federal é tão resistente à vacinação de crianças que busca adiar o início da aplicação do imunizante.

Depois do aval da Anvisa, o ministro Marcelo Queiroga afirmou em entrevista que sua decisão se basearia em aspectos técnicos.

— A área técnica fará as análises necessárias e diante da recomendação, as vacinas podem ser disponibilizadas dentro do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 — disse Queiroga ao GLOBO, no mês passado. — Temos que fazer uma análise técnica para a tomada da melhor decisão.

Imblóglio público

Numa comparação, a pasta levou 20 dias — de 16 de dezembro a 5 de janeiro — para liberar a vacina da Pfizer para crianças de 5 a 11 anos após o aval da Anvisa. O período ficou marcado por um imbróglio político durante consulta e audiência públicas que deram voz a integrantes do movimento antivacina.

Dados reunidos no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe) apontam que 52,3% das internações por Covid-19 na faixa etária infantil ocorrem de recém-nascidos a bebês de até 1 ano.

A projeção é de que o Brasil tenha 12 milhões de crianças de seis meses a 4 anos. Segundo a Anvisa, a vacina deve ser aplicada em três doses: a segunda vem três semanas após a primeira e a última, depois de oito semanas. A dosagem é de 0,2 mL (equivalente a 3 microgramas), um terço da aplicada no grupo de 5 a 11 anos, o que exige a compra de novas doses.

A Pfizer informou que não comenta possíveis negociações em andamento. O contrato vigente, de 100 milhões de doses, permite que a Saúde peça imunizantes atualizados, para variantes como a Ômicron ou formulações para outras faixas etárias, desde que haja aval da Anvisa.

“As estimativas de entrega da vacina para a nova faixa etária contemplada pela Anvisa, que inclui crianças de seis meses a 4 anos (4 anos, 11 meses e 29 dias), dependerão das definições junto ao Ministério da Saúde”, diz a nota da Pfizer.

Procurado, o ministério não respondeu até a publicação desta reportagem.

Mais internações

Na semana passada, a Fundação Oswaldo Cruz divulgou um levantamento que mostra o crescimento de hospitalizações de crianças por Covid. Entre julho e setembro deste ano, menores de 5 anos passaram a responder por 8,5% do total das internações pela doença no Brasil, um aumento de 50% em relação ao primeiro semestre do ano, segundo um levantamento feito pela Observa Infância.

Entre janeiro e junho deste ano, o grupo representava 5,6% das hospitalizações por complicações da doença.