Título: Ajuda externa para o crime
Autor: Ricardo Albuquerque
Fonte: Jornal do Brasil, 18/10/2005, Rio, p. A13

O arsenal do crime vem das fronteiras - tanto as reais, que separam o Brasil dos outros países da América do Sul, quanto daquelas que estão entre o bem e o mal. Setores de inteligência da Polícia Federal estimam que cerca de 200 mil armamentos ilegais - granadas, fuzis, submetralhadoras, explosivos - abastecem atualmente o tráfico de drogas no Estado do Rio de Janeiro. Cálculos do Instituto de Estudos da Religião (IER), mostram que 159.723 armas clandestinas estavam em mãos de criminosos em 2003. A estimativa da PF indica que 20% do materia bélico que atravessaram as fronteiras brasileiras, nos últimos dois anos, estão em poder de traficantes cariocas e fluminenses, principais receptadores de fuzis fabricados no exterior. As rodovias estaduais e federais, que cortam o Estado do Rio de Janeiro, fazem parte das rotas escolhidas para abastecer morros e favelas do Rio e Niterói com os armamentos. O delegado Vantuil Cordeiro, chefe da Divisão à Repressão ao Tráfico Ilícito de Armas (Darm), explica que os 6 mil quilômetros de fronteiras terrestres do Brasil, difíceis de serem vigiados, facilitam a entrada de armas e outros produtos (drogas, eletrodomésticos, gados) contrabandeados.

O vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), João Valderi de Souza, diz que o governo federal não investe na capacitação de profissionais que trabalham nas áreas de fronteira, o que prejudica o monitoramento e fiscalização de regiões sensíveis à ação dos contrabandistas, como as fronteiras dos estados do Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Rondônia com o Paraguai e a Bolívia.

- Isso acaba refletindo no Rio e em São Paulo, estados que mais sofrem com o comércio ilegal de armas. Por isso, o poder de fogo dos traficantes é grande - observa ele.

Levantamento da Darm indica que os fuzis fabricados nos Estados Unidos são importados por empresas paraguaias dentro da lei. O relatório policial mostra que comerciantes revendem as mercadorias a atravessadores brasileiros e de outras nacionalidades sem pagar os impostos. Inteiros ou desmontados, os fuzis ultrapassam clandestinamente a fronteira brasileira de caminhão ou carro, antes de seguirem para seu destino: em 40% dos casos, estados da Região Sudeste.

- Um fuzil desmontável ultrapassa a fronteira com facilidade, mesmo que leve dias para o comprador ter o produto inteiro - explica.

Cordeiro participou do primeiro treinamento básico de combate ao tráfico de armas realizado em agosto, em Foz do Iguaçu, com a participação de autoridades policiais da Argentina, Paraguai e Uruguai.

- Este tipo de crime é transnacional, por isso a importância de trocarmos informações e atuarmos em parceria para mudar esse quadro - observa Cordeiro.

Com base nas informações do livro Armas de fogo: proteção ou risco?, de Antônio Rangel Bandeira e Josephine Bourgois, 17.010.941 armas estariam em circulação no Brasil, das quais 8.492.857 seriam ilegais, e 8.518.084 legais.

Dados do Sistema Nacional de Armas mostram que o Brasil tem pouco mais de 5 milhões de armas registradas, número que poderá aumentar até 20 de dezembro de 2006, quando expira o prazo para os policiais obterem o registro federal único de suas armas. Cada agente ou militar tem o direito de registrar em seu nome até duas armas sem pagar as taxas previstas em lei. Caso notifique a existência de outras, é obrigado a desembolsar R$ 300 por cada uma.