Correio Braziliense, n. 21756, 10/10/2022. Política, p. 3

Lula investe pesado em Minas

Ígor Passarini  
Matheus Muratori  
Natasha Werneck  
Thiago Bonna 


Belo Horizonte — A região centro-sul da capital mineira amanheceu com o dia nublado, ontem, e as ruas lotadas de camisas e bandeiras vermelhas. A presença do candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, mobilizou milhares de mineiros para uma caminhada entre as praças da Liberdade e Tiradentes, no Bairro Funcionários. Além de ressaltar a representatividade de Minas Gerais, o petista mandou recado ao governador reeleito de Minas, Romeu Zema (Novo), sobre o apoio dele ao seu adversário neste segundo turno, o presidente Jair Bolsonaro (PL). O petista também afirmou que, se for eleito, destinará mais recursos para Minas Gerais. O ato faz parte de nova estratégia do presidenciável para a reta final da campanha. “Carta marcada” na agenda de ambos os candidatos desde o primeiro turno, Minas foi uma das principais pautas do ex-presidente.

A sensação é de que Lula quer “defender o cinturão” conquistado no estado, segundo maior colégio eleitoral do país. Além disso, o papel dos mineiros nas eleições é histórico. Desde o pleito presidencial de 1955, quem venceu em Minas chegou à Presidência do Brasil. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 12.655.228 de eleitores do estado foram às urnas em 2 de outubro, ficando atrás apenas de São Paulo, com 27.189.714 de pessoas. Na apuração final, Lula venceu Bolsonaro com diferença de 563 mil votos.

Antes de iniciar o percurso entre as duas praças da capital mineira, o petista deu coletiva de imprensa. Ao lado dele, estavam diversos aliados políticos, como o prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD); o ex-prefeito Alexandre Kalil (PSD); a presidente do PT, Gleisi Hoffmann; o deputado federal reeleito André Janones (Avante) e a sua futura colega na Câmara Duda Salabert (PDT).

Um dos temas abordados pelo ex-presidente foi o apoio do governador reeleito de Minas, Romeu Zema (Novo), a Bolsonaro no segundo turno. No primeiro, o chefe do Executivo estadual evitou associar seu nome ao do presidente. O partido de Zema lançou Felipe d’Avila à Presidência. “Quero deixar bem claro que o governador Zema tem liberdade de apoiar quem ele quiser. Não me oporei e nunca pensei que fosse ser diferente. Segundo, a única coisa que tem que levar em conta é não pensar que o povo é gado, é não pensar que o povo pode ser tangido para lá ou para cá. O povo tem consciência do que está acontecendo no país. Então, é só tomar cuidado para não tratar o povo como rebanho, tratar o povo como cidadão de inteligência, consciente, sabendo do que quer”, ressaltou Lula.

“Se o governador souber 10% do que nós fizemos em Minas Gerais, ele terá um problema de remorso ao não me apoiar. Quando ele souber que no nosso governo, em 13 anos, foram colocados à disposição do governo de Minas Gerais R$ 260 bilhões”, disse o petista, ao mostrar uma colinha com todos os feitos de sua gestão no estado. Lula também disse que, caso eleito, quer conversar com Zema sobre o hospital regional de Divinópolis, no centro-oeste do estado. Segundo ele, esta é uma prioridade a ser tratada em seu governo e será negociada com o chefe do Executivo estadual.

“É engraçado que tem um hospital regional sendo feito lá na cidade que está com as obras dele paralisadas. Eu não conheço o governador Zema, mas sei que ele foi eleito governador do estado no primeiro turno. Se eu for eleito presidente da República, ou ele vai conversar comigo em Brasília, ou eu venho para Belo Horizonte conversar com ele, porque a gente vai acabar esse hospital-escola e fazer ele prestar serviço à comunidade da região de Divinópolis. Não podemos deixar, num país que precisa de saúde, hospital parado”, disse.

Lula também destacou que o diálogo com Zema ocorrerá independentemente de partido ou apoio durante as eleições de 2022. “Durante o processo eleitoral, cansei de dizer que quando você é chefe de Estado, você não faz distinção na relação com os entes federados. Não quero saber de que partido é o governador ou prefeito. Se ele foi eleito, merece ser tratado com dignidade, respeito e decência em qualquer lugar do país. Foi assim que eu tratei prefeitos e governadores durante oito anos. A minha relação com o Aécio (Neves) sempre foi uma relação altamente produtiva”, apontou.

Já no discurso ao final da caminhada, Lula citou a Inconfidência Mineira, de 1789, que lutou contra o domínio português, e a execução de Tiradentes, que dá nome à praça onde parte do ato desse domingo, ocorreu pelos governantes da época. “Foi aqui em Minas Gerais que surgiu o primeiro embrião da Independência do Brasil. O que vocês estão demonstrando hoje é que os ditadores da época enforcaram Tiradentes, esquartejaram, salgaram e penduraram em um poste a sua carne para que ninguém nunca mais ousasse falar em independência. O que eles não sabiam é que eles mataram apenas a carne. As ideias continuaram com o povo de Minas Gerais”, declarou Lula.

Na sequência, o petista disse que “Minas não suporta ditadura, Minas não suporta opressão”. E defendeu uma política pública voltada para emprego, cultura, mais oportunidades para os jovens e respeito às mulheres. Ao tentar conquistar votos dos eleitores mineiros, ele chegou a comparar com futebol. Segundo o petista, quem torce para um time não abre mão para o rival, como é o caso de Cruzeiro e Atlético.

“Quem é cruzeirense não abre mão de ser cruzeirense e quem é atleticano não abre mão de ser atleticano. Nós temos aí alguns torcedores do América que nós vamos tentar ganhar, que é o pessoal da abstenção, pessoal que está aí, que não votou no primeiro turno”, brincou.