Correio Braziliense, n. 21752, 06/10/2022. Cidades, p. 13

"Não fomos perfeitos e precisamos evoluir"

Entrevista: Ibaneis Rocha


​Após fazer história como o primeiro governador do Distrito Federal reeleito em primeiro turno, com 50,3%, Ibaneis Rocha (MDB) prometeu priorizar saúde, assistência social e infraestrutura no próximo mandato. “Foram as pautas que nos deram a reeleição”, justificou ontem, durante entrevista ao CB.Poder, programa do Correio e da TV Brasília. O governador reafirmou o apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições contra o ex-presidente Lula (PT). Em relação a políticos aliados, ele creditou a derrota de Flávia Arruda (PL) para o Senado ao ex-governador José Roberto Arruda, marido de Flávia, que teria “atrapalhado” a campanha da esposa, ao “atrair os holofotes para ele próprio”. Ela disputou a vaga de senadora pelo DF com a ex-ministra de Bolsonaro, Damares Alves (Republicanos), eleita com 45% dos votos. Arruda chegou a registrar o desejo de concorrer ao Buriti, mas, em meio a disputas com Ibaneis pelo apoio de Bolsonaro, um acordo foi feito, com a bênção do presidente, e o ex-governador decidiu ser candidato a deputado federal. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), porém, acabou cassando a candidatura de Arruda.

A deputada federal Celina Leão (PP), vice-governadora de Ibaneis no próximo mandato, será responsável pela articulação do governo local com o Congresso Nacional e as pastas ministeriais. A entrevista foi concedida às jornalistas Ana Maria Campos e Denise Rothenburg.

 

Qual vai ser sua prioridade para o ano que vem?

Temos prioridades na saúde, assistência social e infraestrutura. Precisamos seguir essas pautas, que são fortes para a cidade e foram as que nos deram a reeleição. Tivemos prejuízo deixado pela covid-19 e estamos correndo atrás para resolver os problemas da saúde, como ampliar a rede de atendimento e contratar mais profissionais. Precisamos ter uma melhoria significativa dos índices da saúde. Não podemos parar as obras, (porque) ainda restam problemas. Temos de avançar em diversas pautas que ficaram de, certo modo, atrapalhadas, seja pela covid-19 ou pela falta de investimentos que existiu no passado. Assumimos um DF quase sem projetos e hoje temos em quase todas as áreas. Só de investimentos, temos quase R$ 10 bilhões previstos no orçamento dos próximos quatro anos, todo para a melhoria da nossa cidade.

 

O que dá para deixar preparado, agora, para o próximo mandato? Vai trocar o secretariado?

Vou me dedicar bastante, agora, para a reeleição do presidente Bolsonaro. Vamos trabalhar com toda nossa base e militância, para ampliar a vantagem aqui no DF. Após isso, quero reunir vários grupos de trabalho — espero arrumar um espaço (físico) fora do Palácio do Buriti — para discutir os principais problemas da cidade e colocar metas, para iniciar o próximo governo com o pé no acelerador. As mudanças necessárias vamos fazendo ao longo dos meses de novembro e dezembro, vou anunciando aos poucos. Naturalmente vão surgir nomes desse movimento. A partir desse trabalho, feito ainda em novembro, é que vamos escolher nosso secretariado. Durante o fim deste mandato, não vou retornar com nenhum que saiu para concorrer.

 

Com as urnas abertas, que análise o senhor faz da composição de forças políticas do DF?

Acho que as eleições trouxeram grande apoio para a proposta liberal, de desenvolvimento da cidade e infraestrutura. Fizemos uma campanha bastante propositiva, voltada a debater os temas do DF, sabendo que não fomos perfeitos e precisamos evoluir — até porque se tivesse sido perfeito, eu não seria candidato, me recolheria. Temos muitas coisas a sanar, foi exatamente nessa confiança que o eleitor apostou. Teremos 17 deputados na Câmara Legislativa (CLDF) da base e sete de oposição, com quem tenho diálogo muito amplo também, não tenho problema nenhum com eles. O que for bom para Brasília a CLDF deve aprovar. E no Congresso Nacional nossa vice-governadora (Celina Leão) vai apresentar a todos os deputados do DF nosso caderno de obras, com o que temos para fazer, para que possam colocar emendas.

 

O fato de ter garantido o segundo mandato e não poder disputar um terceiro facilita a construção política para um mandato mais tranquilo?

O primeiro mandato não foi tranquilo por conta da pandemia. Tivemos vários problemas relacionados à saúde, porque o momento era diferenciado. Mas em uma análise da CLDF (Câmara Legislativa), atravessamos (o mandato) com muita paz. Em relação ao Congresso Nacional, tivemos aplicação de recursos e executamos 100% das emendas colocadas, o que não existia no passado. Quando eu assumi, só de emendas paralisadas eram quase R$ 3 bilhões. Conseguimos mexer com todas elas e colocamos várias obras em andamento, exatamente pela capacidade de organizar os projetos e a cidade. Agora, vamos seguir para um segundo mandato com mais força ainda. Temos todos os projetos na prateleira, sabemos do que a cidade precisa e vamos avançar ainda mais.

 

O senhor esteve com o presidente Bolsonaro hoje (ontem). O que ele disse e o que o senhor prometeu para ele? Como pode ajudar no segundo turno?

Eu me comprometi a fazer um trabalho para ele aqui no DF e no Entorno. Tenho excelente relacionamento com os prefeitos do Entorno por meio da associação (Associação dos Municípios Adjacentes a Brasília), presidida pelo Pábio (Correia Lopes), prefeito de Valparaíso (GO). Temos conversado com esses prefeitos, até auxiliando no que é necessário. Hoje, houve uma reunião com o candidato a vice-presidente de Bolsonaro, Braga Netto e o Flávio Bolsonaro com a nossa coordenação política, para que a gente coloque toda a máquina que temos aqui e que ajudou a me eleger na campanha de Bolsonaro. Confiamos muito que vai dar certo. Bolsonaro está preparado, muito mais maduro do que estava no primeiro mandato Não teremos mais o problema da pandemia, a economia tem melhorado e o índice de desemprego está cada vez melhor. Temos, nós dois, condições de ter melhores mandatos.

 

O ex-presidente Lula teve 6 milhões de votos a mais, mas Bolsonaro conseguiu apoios importantes nesta semana — dois governadores eleitos no último domingo, Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, e Cláudio Castro (PL), do Rio de Janeiro, e Rodrigo Garcia (PSDB), atual governador de São Paulo. O senhor acredita em uma virada em quatro semanas?

Acredito, até porque houve estelionato eleitoral nas pesquisas. Muita gente queria encerrar a demanda no primeiro turno e várias pesquisas indicavam que havia a possibilidade de o presidente Lula se eleger no primeiro turno. Isso se mostrou errado. Muitas pessoas, agora, terão a oportunidade de pensar melhor seu voto para o segundo turno. Acredito em mudança de pensamento. Vai ser uma campanha muito dura, (os dois candidatos) terão de visitar os estados e conversar muito com os governadores eleitos e os que estão disputando. Acredito em uma virada de jogo.

 

Chico Vigilante (distrital eleito pelo PT para o quinto mandato) esteve aqui ontem (terça-feira) e disse que Lula tem condições de virar os votos no DF. De onde ele tiraria esses votos? O senhor acredita que Lula pode ter mais votos do que teve?

A população do DF mostrou, no domingo, que a maioria é bolsonarista. Não vimos ruas pintadas de vermelho, mas, sim, de verde e amarelo. Isso mostra a força do presidente Bolsonaro na cidade. Não consigo entender de onde eles pensam que vão tirar esses votos, mas, de qualquer modo, vamos aguardar o resultado das urnas, porque as urnas falam por todos nós.

 

A ex-ministra Damares Alves foi eleita em uma virada, a favorita durante a campanha era a deputada Flávia Arruda. Para o senhor, que acompanhou as duas, suas aliadas, o que aconteceu? Qual análise faz?

Houve alguns erros na campanha da Flávia. Teve a discussão de o Arruda querer ser candidato ao governo, depois desistir e sair para deputado federal. Isso terminou atraindo os holofotes não para a campanha da Flávia, mas para ele próprio. Isso tirou o protagonismo da Flávia durante a eleição e fez com que abrisse o campo para a Damares crescer, principalmente o campo bolsonarista, muito forte aqui no DF. As urnas mostraram isso. Faltou essa união da campanha da Flávia ao presidente Bolsonaro. E faltou um pouco de protagonismo, que Arruda tirou da Flávia.

 

Ele atrapalhou a Flávia?

Acredito que sim. Vi vários candidatos a deputado federal dizendo que não iriam acompanhar a Flávia exatamente porque o Arruda estava como candidato a federal. Isso atrapalhou muito os acordos políticos que poderiam ter sido feitos e que poderiam ter levado a deputada ao Senado.

 

Pensa em dar algum espaço no seu governo a ela?

Vamos discutir. Eles (PL) elegeram quatro deputados distritais (Daniel Donizet, Roosevelt Vilela, Joaquim Roriz Neto e Thiago Manzoni) e dois federais (Bia Kicis e Fraga). É uma bancada importante. Fez parte da nossa coligação e vamos conversar com os deputados eleitos e com a presidente do partido no DF, que é, justamente, a Flávia.

 

O PT espera hoje (ontem) que Simone Tebet declare apoio ao ex-presidente Lula. Como fica essa questão, com o senhor apoiando Bolsonaro?

Acho que esses apoios são naturais. O MDB, desde o primeiro turno, liberou as bancadas estaduais para apoiar quem quisessem. Agora, no segundo turno, vai ser da mesma maneira, teremos estados apoiando o presidente Lula e outros estarão com Bolsonaro. Depois vemos como fica. O MDB conseguiu crescer, aumentou a bancada de deputados federais, o que é muito bom. É um partido que vai ter expressão no Congresso Nacional, tanto na Câmara quanto no Senado. Isso nos ajuda muito, inclusive, nas negociações que precisamos ter para evoluir com os projetos para o DF.

 

Os três candidatos mais votados para a CLDF são de esquerda (Fábio Félix, do PSol, Chico Vigilante, do PT, e Max Maciel, do PSol), o que vai na contramão do movimento que as urnas mostraram, de um eleitorado mais bolsonarista. O senhor vai ter diálogo com esses deputados?

Sem dúvida alguma. Sempre tive bom relacionamento com deputados do PT, em especial Chico Vigilante e Arlete (Sampaio, deputada distrital, que não foi candidata neste ano e é vice-presidente do PT-DF). Eles não atrapalharam nosso mandato e estavam sempre presentes no Plenário para votar os projetos, mesmo que de forma contrária. O Chico diversas vezes me ligou para tratar das categorias que ele representa. Vamos continuar com esse diálogo e apresentar os projetos que acreditamos ser o melhor para a cidade. Vamos debater com a câmara legislativa, esperando sempre o melhor para o DF.

 

O senhor mudou de vice, agora é a Celina Leão. Qual vai ser o papel dela?

Vai nos ajudar na articulação. É uma política nata, nos ajudou muito na campanha e durante o mandato. Sempre esteve ao nosso lado, trazendo recursos para o DF e fazendo interlocução com o governo federal. Ela vai ter um papel muito importante, principalmente na busca e liberação de recursos. Não conseguimos trabalhar sem o apoio do governo federal. Esse trabalho de articulação ficará por conta dela porque já tem relacionamento com o congresso e os ministérios. Ela tem o perfil para isso.

 

Qual futuro pensa para a carreira política?

Sou candidato a fazer um excelente mandato. Tenho que me consolidar na política do DF. Surgi há quatro anos como uma novidade. Vinha de uma instituição forte, a OAB (Ibaneis foi presidente da seccional do DF da Ordem dos Advogados do Brasil de 2013 a 2015) e tinha uma visão muito clara do que queria para o DF. Agora, tenho oportunidade de me consolidar como uma liderança da cidade. Meu primeiro projeto é esse. A partir disso, quando estiver perto de 2025, vou pensar no que vou fazer da minha vida. Mas garanto que estou gostando da política. É uma maneira muito importante de transformar a vida das pessoas, o que acontece de verdade quando a boa política é feita. Tenho expectativa muito grande de continuar dando minha parcela de colaboração, não só para o DF, mas também para o Brasil.

 

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