Valor Econômico, n. 4955, 10/03/2020. Brasil, p. A6

Extinção de municípios afeta receita per capita

Rodrigo Carro


Parte de uma proposta de emenda constitucional apresentada pelo governo federal, a extinção de municípios com menos de 5 mil habitantes e arrecadação própria inferior a 10% da sua receita total acarretaria - se aprovada e implementada - queda na receita per capita das novas cidades a serem constituídas. A conclusão é parte de um estudo do Observatório de Informações Municipais (OIM) sobre os possíveis desdobramentos da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) nº 188/2019, em tramitação no Senado.

Pelos critérios estabelecidos na PEC, 1.160 municípios brasileiros - pouco mais de um quinto do total - poderiam ser extintos, segundo estimativa do OIM. O número é similar ao projetado pela Confederação Nacional de Municípios. A CNM calcula que 1.217 municípios deixariam de existir. “A análise das finanças dos municípios mostra que aqueles de menor porte demográfico possuem uma receita per capita mais elevada, o que representa dizer que, ao serem promovidas as incorporações, a receita [pública] per capita dos novos municípios constituídos tenderá a ser reduzida”, explica François Bremaeker, gestor do Observatório de Informações Municipais (OIM), no estudo.

O levantamento indica ainda que dificilmente a incorporação de municípios por outros de maior porte demográfico e economia mais robusta traria uma economia de recursos relevante. “A eliminação das cidades não significa a redução de boa parte de suas despesas. Afinal, continuarão necessariamente os gastos com educação, saúde, manutenção das vias públicas, e outros de urbanismo. Eles são maiores que os custos políticos - estes sim que poderiam ser reduzidos ou eliminados”, afirma o economista José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), referindo-se aos salários de prefeitos e vereadores.

De acordo com as projeções da CNM, perderão receita do Fundo de Participação de Participação dos Municípios não somente os 1.217 municípios a serem extintos, como também as 702 cidades que os incorporarão. A perda de arrecadação se daria - argumenta a confederação - porque o mecanismo de partilha do FPM se baseia em coeficientes por faixa populacional. Os coeficientes variam de um mínimo de 0,6 a um máximo de 4.

Municípios com até 10.188 habitantes, por exemplo, possuem coeficiente de 0,6. Dentro dessa lógica, duas cidades com menos de 5 mil habitantes que se fundissem (conforme a regra estabelecida na PEC nº 188) continuariam a receber o mesmo valor de FPM.

O entendimento da assessoria jurídica da CNM é de que a proposta de extinção de municípios é inconstitucional. “Nossa expectativa é que o relator da PEC [senador Marcio Bittar] retire a proposta de seu relatório”, diz Glademir Aroldi, presidente da confederação. Caso isso não aconteça, Aroldi espera “enterrar a proposta de vez” na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. O relatório de Bittar  apresentado primeiramente à CCJ, para depois ser apreciado no plenário da casa.

Abastecido com parte das receitas do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o FPM é uma das principais fontes de receita da maior parte das prefeituras brasileiras. Juntos, o FPM e o ICMS representam cerca de 60% do total de receitas em aproximadamente 70% das cidades brasileiras.

“O FPM é o maior alavancador da receita per capita. Todos os municípios com população até 10.188 habitantes recebem, dentro do seu Estado, o mesmo valor. Portanto, quanto menor a população, maior a sua receita per capita”, explica Bremaeker, do OIM.

Bremaeker explica que os recursos referentes aos municípios que deixarão de existir não serão repassados automaticamente ao novo ente federativo resultante da fusão. Serão redistribuídos entre todas as prefeituras de um mesmo Estado. Se não houver mudança na faixa populacional, o município terá mais habitantes enquanto a receita proveniente do FPM permanecerá a mesma.