Valor Econômico, n. 4955, 10/03/2020. Política, p. A7

Bolsonaro minimiza crise e renova pressão sobre o Congresso

Marcelo Ribeiro
Fabio Murakawa
Renan Truffi
Vandson Lima


Em viagem aos Estados Unidos, o presidente Jair Bolsonaro colocou pressão sobre o Congresso. Ele afirmou ontem que Executivo e Legislativo passarão uma mensagem à população de que estão “afinados”, se os parlamentares aceitarem abrir mão de decidir a destinação de R$ 15 bilhões do Orçamento. Bolsonaro destacou que, com uma atitude nesse sentido, os congressistas poderiam conseguir reduzir a pressão popular e a manifestação marcada para o dia 15.

A declaração foi feita poucas horas depois de o próprio Bolsonaro revelar que havia tentado costurar uma ação conjunta com o Congresso, para combater os potenciais efeitos da crise internacional. Em viagem nos Estados Unidos, Bolsonaro afirmou que procura se comportar para evitar atritos e turbulência. Mas reconheceu que dá “umas caneladas por aí” de vez em quando.

“O relacionamento com o Parlamento já esteve pior do que está hoje em dia”, disse o presidente. “Ontem, anteontem, eu troquei umas mensagens com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, falando sobre a questão do dia 15 de março agora que, no meu entender, é algo voluntário por parte do povo, não é contra o Congresso, não é contra o Judiciário. É a favor do Brasil. Afinal de contas, devemos obedecer e seguir o norte apontado pela população. ”

Para Bolsonaro, o que a população demanda é que o Parlamento não seja o dono do destino de R$ 15 bilhões do Orçamento. “É isso que está em jogo no momento. Acredito ainda que, até o dia 15, os presidentes da Câmara e do Senado anunciem algo no tocante a dizer que não aceitam isso. Acredito que eles possam botar até um ponto final na manifestação. Não um ponto final, porque ela vai haver de qualquer jeito no meu entender, mas para mostrar que estamos sim afinados no interesse do povo brasileiro. ”

Maia e Alcolumbre foram os fiadores de um acordo feito com o governo federal para manter um veto presidencial. Neste acordo, o Planalto concordou em tornar impositiva metade das emendas do relator no Orçamento, correspondente aos R$ 15 bilhões mencionados pelo presidente.

O presidente também relativizou os riscos do coronavírus. “Está super dimensionado o poder destruidor desse vírus. Talvez esteja sendo potencializado até por questões econômicas. ”

Antes, Bolsonaro havia dito que conversara com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), pedindo apoio para a aprovação das reformas administrativa e tributária. Maia, defensor dessa agenda, afirmou ontem que a postura do Congresso será colaborativa. Mas ponderou que apenas as reformas não bastarão.

Segundo o Valor apurou, a conversa foi em tom ameno. Bolsonaro demonstrou preocupação com eventuais reflexos da crise internacional na economia brasileira e pediu a colaboração do Congresso para aprovar propostas que tenham a capacidade de evitar uma desaceleração da economia. Durante a chamada, de acordo com fontes, Maia teria reforçado que a Câmara e o Senado estão dispostos a fazer sua parte e ajudar. Bolsonaro, então, defendeu que a construção dessa proposta seja conjunta entre os Poderes.

Durante o dia, antes das novas declarações de Bolsonaro em apoio às manifestações, Maia destacou que o Congresso manteria uma postura colaborativa.

“A postura do governo é comandar o processo. E a postura do Parlamento, como sempre, é ser colaborativa e construir junto com o governo as soluções que possam minimizar o baixo crescimento que o Brasil já vinha tendo nos últimos meses e, somado a isso, a crise internacional que atingiu o Brasil no dia de hoje”, ponderou o presidente da Câmara.

No entanto, Maia destacou que as medidas não devem se restringir ao pacote de reformas. “Não é só reforma. O governo terá que tomar algumas ações, algumas atitudes”, complementando que parte da solução virá das reformas, embora o governo não tenha ainda apresentado suas propostas para a administrativa nem para a tributária.

“Acho que elas ajudam, mas não são o único ponto para solucionar os danos da crise. Então, acho que o governo precisa comandar esse processo, deixar claro para todos os atores da sociedade, para os outros dois Poderes o que ele pensa sobre a crise e de que forma que a gente pode ajudar. ”