Valor Econômico, n. 4951, 03/03/2020. Política, p. A10

Alas do PSL negociam desfiliação pacífica de aliados de Bolsonaro
Marcelo Ribeiro
Raphael Di Cunto
Luísa Martins


Um parecer do Ministério Público Eleitoral abriu caminho para uma eventual pacificação entre as duas alas do PSL, ex- partido do presidente Jair Bolsonaro. Em crise interna desde o ano passado, bolsonaristas - parlamentares alinhados ao chefe do Poder Executivo - e bivaristas, aliados do presidente da sigla, Luciano Bivar (PE), iniciaram uma negociação para tentar viabilizar uma saída menos traumática para os parlamentares que querem se desfiliar da sigla.

Após meses de embate, os bolsonaristas acenaram para a possibilidade de deixar o PSL abrindo mão do fundo partidário e do tempo de televisão. Em contrapartida, todos teriam a garantia de manter seus mandatos preservados. A ideia dos parlamentares é deixar a sigla comandada por Bivar e aguardar a criação do Aliança pelo Brasil, novo partido de Bolsonaro, que já reconheceu que não conseguirá o número de assinaturas necessárias para sair do papel até abril. Esse o prazo para viabilizar a participação de seus candidatos nas eleições municipais.

Mesmo com o PSL tendo sua bancada reduzida pela metade, a ala bivarista também estaria disposta a aceitar um desfecho de consenso. O acordo evitaria que a crise com os aliados de Bolsonaro prejudicasse o desempenho do PSL nas urnas neste ano.

A pacificação também colocaria um fim na batalha de listas pela liderança do partido na Câmara dos Deputados. No ano passado, os dois grupos protagonizaram algumas disputas pelo cargo. Os deputados Delegado Waldir (PSL-GO), Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, e Joice Hasselmann (PSL-SP) se revezaram no posto durante a crise.

Segundo fontes, a reaproximação dos dois grupos teria ocorrido após um parecer recente do Ministério Público Eleitoral. O documento é referente ao pedido de 26 deputados bolsonaristas que entraram com processo para desfiliação do PSL por justa causa.

O vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques, pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que consulte cada um dos parlamentares sobre seu interesse em resolver o problema por meio de consenso. No documento, Jacques citou artigo do Código de Processo Civil segundo o qual a conciliação “deve ser estimulada pelo Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.

O pedido, ainda não apreciado pelo ministro Edson Fachin, o relator, ocorreu diante da proximidade da fase de instrução, em que os parlamentares precisam demonstrar que o PSL de fato desviou-se de seu programa partidário e agiu com discriminação pessoal em relação a eles.

Aliado de Bivar, Waldir defendeu, em entrevista ao Valor, a desfiliação imediata de bolsonaristas do PSL. “Água e óleo não podem continuar. Está na hora de se separarem”, afirmou. O ex-líder do PSL na Câmara destacou, porém, que o grupo dissidente deve deixar de fazer acusações contra os bivaristas.

“Não vamos deixar sair com tempo de TV e fundo partidário. Mas quem não está contente pede para sair, não tem problema. Agora, não queira criminalizar a nossa conduta, tripudiar com isso, dizer que sai por falta de transparência”, disse Waldir.

Ainda que reconheçam que as negociações estejam acontecendo, bolsonaristas evitam afirmar abertamente que um “acordo” esteja sendo costurado. Eles temem que o termo possa representar um “argumento jurídico” para que seus suplentes recorram pelos mandatos na Justiça Eleitoral.