O Globo, n. 32645, 23/12/2022. Política, p. 4

Frente ampla adiada

Paula Ferreira
Manoel Ventura
Bruno Abbud

A dez dias de tomar posse, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou ontem um pacote de 16 futuros ministros, dando cara à equipe do seu terceiro governo, que já tem a maioria (21 de um total de 37) dos ministérios definidos. A segunda leva adiou para a semana que vem o caráter de frente ampla que o petista tem afirmado pretender dar à sua gestão. Até aqui, metade dos nomeados são de partidos políticos, todos da coligação eleitoral de Lula, com preponderância de seu próprio partido: o PT já tem sete vagas, o PSB, três, e o PCdoB, uma. Entre os ministros não-partidários, também ficou demarcado um perfil por ora mais à esquerda do novo governo.

Assim, o presidente eleito deixou para a última semana a cessão de cargos a partidos de centro ou centro-direita que não o apoiaram na eleição mas negociam espaço no governo e integram a base aliada no Congresso. Lula tem tratado com PSD, União Brasil e com o MDB, que reivindica duas pastas além da que será entregue à senadora Simone Tebet, ex-presidenciável que simbolizou a ampliação do arco de alianças no segundo turno. Lula estava esperando o Congresso aprovar a PEC da Transição, e o Orçamento de 2023, o que ocorreu nesta semana, para destravar a negociação com os novos aliados. No dia em que reforçou a predominância petista da nova gestão, o presidente eleito voltou a prometer que dará espaço para outras correntes políticas:

— É mais difícil montar o governo do que ganhar as eleições. Estamos tentando montar um governo que a gente consiga representar o máximo de forças políticas que nos ajudaram na campanha — discursou o petista, num auditório do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de Brasília, onde ocorre a transição de governo.

Alckmin vira ministro

Com os 16 nomes anunciados ontem, restam outros 16 para completar as 37 pastas previstas. Não por acaso, algumas delas são justamente as mais cobiçadas por partidos de centro para aderir ao novo governo. Ministérios como os de Cidades, Integração Nacional e Transportes, que incluem grande volume de recursos e obras públicas, são prioridades para os novos aliados.

Entre os anunciados, Lula recorreu ao vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, para comandar a pasta de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, para a qual vinha tendo dificuldade de convencer um empresário a assumir — o presidente da Fiesp, Josué Gomes , foi um a recusar o convite.

Com Alckmin, o PSB, principal partido aliado, chegou a três pastas. Além de Flávio Dino na Justiça, a legenda ganhou ontem a nova pasta de Portos e Aeroportos, que ficará a cargo do ex-governador de São Paulo Márcio França.

É o PT, contudo, quem garantiu o maior espaço. São sete ministros filiados ao partido, quatro deles anunciados ontem: Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Luiz Marinho (Trabalho), Camilo Santana (Educação) e Wellington Dias (Desenvolvimento Social). As duas últimas nomeações ilustram como a legenda têm sido efetiva ao garantir os principais espaços. Lula não abriu mão de deixar com o PT a Educação, um dos maiores orçamentos da Esplanada e que tinha a governadora do Ceará, Izolda Cela (sem partido), como uma das cotadas, e o Desenvolvimento Social, pasta prioritária por controlar o Bolsa Família e que era cobiçada por Simone Tebet.

O partido tende ainda a aumentar seu espaço, já que possui alguns cotados para pastas não definidas por ora, como o deputado Paulo Teixeira (Comunicações).

Esquerda presente

O PCdoB, histórico aliado do PT nas eleições, teve direito à pasta de Ciência e Tecnologia, que ficará com a presidente da sigla, Luciana Santos.

Entre os nomes sem filiação partidária, a primeira metade do ministério mantém um perfil mais à esquerda. Nomes como o do jurista e filósofo Silvio Almeida, à frente da pasta de Direitos Humanos, de Anielle Franco (Igualdade Racial), de Cida Gonçalves (Mulheres) e de Margareth Menezes (Cultura) reforçam um alinhamento ideológico com o partido do presidente.

A rigor, apenas o já confirmado ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e o vice e agora futuro titular da Indústria, Geraldo Alckmin, têm um histórico de carreira política mais ligado à direita.

Lula avançou em parte na promessa de buscar um equilíbrio de gênero na equipe. Depois de ser criticado por não nomear nenhuma mulher na primeira leva de ministros, foram seis nomeadas ontem.

A partir da reunião de hoje com Tebet, o presidente eleito passará a definir os 43% restantes do seu time, justamente a parte que deverá dar mais dor de cabeça para acomodar aliados e acalmar descontentes, mas que será a mais decisiva para lubrificar a reação com o Congresso Nacional.