Valor Econômico, v. 20, n. 4904, 19/12/2019. Legislação e Tributos, p. E1

 

STF mantém regras para filantrópicas
Joice Bacelo
Beatriz Olivon 

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que os aspectos procedimentais para a concessão de imunidade tributária a entidades filantrópicas podem ser definidos por lei ordinária. O entendimento valida, por exemplo, a Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social (Cebas) - o documento concedido pelo governo federal para que organizações que desenvolvem projetos na área de saúde, educação e assistência social tenham direito ao benefício.

 

A decisão, na prática, mantém as regras mais rígidas para o enquadramento das entidades. Os ministros tinham que decidir se a fixação dos critérios poderia ser feita por lei ordinária ou se somente por meio de lei complementar e, na ausência de uma específica sobre o tema, seguir o que consta no Código Tributário Nacional (CTN) - que traz menos  requisitos para a concessão da imunidade.

O CTN estabelece como condição para a imunidade tributária e previdenciária a inexistência de distribuição de patrimônio e rendas e ainda haver a reaplicação dos resultados em suas atividades.

Já a Lei nº 8.212, de 1991, que foi objeto de discussão, condiciona o benefício à emissão do Cebas e impõe outras condições, como a exigência de que, no mínimo, 60% das atividades das entidades sejam voltadas ao Sistema Único de Saúde (SUS). Os dispositivos dessa lei foram revogados em 2009 e atualmente há uma outra complementar semelhante em vigor, a de nº 12.101.

Haveria impacto bilionário aos cofres públicos, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), se os ministros tivessem entendido de forma diferente. Seriam R$ 15,6 bilhões de perdas anuais na arrecadação e mais de R$ 76 bilhões se tivesse que devolver para entidades os valores por elas recolhidos nos últimos cinco anos.

Esse tema foi julgado em embargos de declaração. Os ministros analisaram se havia divergência entre o que foi decidido no recurso extraordinário (RE) 566622, com repercussão geral, e nas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 2036, 2621, 2028, 2228.

No recurso apresentado à Corte constava que no recurso extraordinário foi fixado que qualquer normatização relativa às filantrópicas deveria estar vinculada à lei complementar, enquanto que nos julgamentos das ADIs havia ficado definido que os aspectos procedimentais (certificação, fiscalização e controle) poderiam ser definidos por lei ordinária.

A maioria acompanhou o voto da relatora das ações diretas de inconstitucionalidade, a ministra Rosa Weber, mantendo o entendimento proferido nas quatro ações. Para a ministra não havia “divergência intrínseca” entre o que foi decidido no RE e nas ADIs. A fundamentação, ela afirmou, seria convergente.

“O resultado parece o proposto pelo ministro Teori [Zavascki, morto em um acidente aéreo no ano de 2017], que é o relator original das ações”, disse o seu sucessor, o ministro Alexandre de Moraes, ao votar o tema. “Não é necessário lei complementar para definir aspectos meramente procedimentais, relacionados à certificação, fiscalização e controle das entidades beneficentes de assistência social”, enfatizou, acompanhando o voto da relatora.

O ministro Luís Roberto Barroso acrescentou que “uma coisa é o procedimento e a outra coisa é a exigência material”. Somente a segunda situação, para Barroso, seria dependente de lei complementar. Marco Aurélio foi o único que divergiu do entendimento. Já o ministro Celso de Mello não estava presente na sessão.

Com o julgamento, a tese de repercussão geral foi reformulada. O texto diz que “a lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo artigo 195, parágrafo 7º, da Constituição Federal, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas".