Valor Econômico, v.20, n. 4865, 24/10/2019. Política p.A14

 

Câmara aprova projeto sobre aposentadoria de militares


Proposta foi aprovada em caráter terminativo, mas falta votar destaques


Por Renan Truffi e Marcelo Ribeiro

Em acordo costurado entre o governo Jair Bolsonaro e a bancada do PT, a Câmara dos Deputados aprovou ontem o texto-base do projeto de reforma da Previdência e reestruturação da carreira dos militares. A negociação se deu em torno de uma bonificação concedida de última hora para os chamados “praças”, que ocupam os postos mais rasos na hierarquia militar. A equipe econômica e o relator da proposta, deputado Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), garantem que a despesa não gera impacto fiscal.

Na semana que vem, a comissão especial destinada a analisar o assunto ainda precisará votar os destaques, sugestões de alteração do texto que podem mudar o conteúdo da matéria. Após esta etapa, a medida poderá ser enviada diretamente da comissão especial para o Senado, já que o texto está tramitando em caráter terminativo. Apesar disso, foi necessário negociar com a oposição para tentar barrar justamente um requerimento que tornasse necessária a votação no Plenário da Casa.

A conciliação foi acertada pelo líder do governo na Câmara, deputado Vitor Hugo (PSL-GO), junto aos deputados Carlos Zarattini (PT-SP) e Reginaldo Lopes (PT-MG). Os petistas pediam a retirada de um trecho da proposta que estabelecia gratificação de representação de 10% sobre a remuneração dos generais, quando estes alcançassem a reserva das Forças Armadas. Em troca, sugeriram um bônus similar, mas oferecido para todos os militares que vierem a ocupar postos de comando.

Com essa mudança, o objetivo do PT foi estender o benefício - hoje concedido somente aos oficiais -para os militares com graduações mais baixas, conhecidos como praças. Se aprovada, a gratificação precisará ser regulamentada por cada uma das forças (Exército, Marinha e Aeronáutica), informou uma fonte do Ministério da Defesa. Um exemplo de possíveis militares a serem beneficiados estão nos Tiros de Guerra (TG), órgãos de formação de reserva gerenciados por praças.

Em troca do bônus, a liderança do governo Bolsonaro estabeleceu compromisso de que o PT não vai assinar requerimento para que o projeto tenha que ser apreciado também no plenário. Como são necessárias 51 assinaturas nesse tipo de recurso que evitaria a tramitação conclusiva na comissão, a participação dos petistas era fundamental. O acordo desmontou a estratégia de outros partidos, como Novo e Psol, que não têm bancadas numerosas, mas pretendiam postergar a aprovação da matéria na Câmara por não concordarem com o teor do projeto.

Questionada pelo Valor, a equipe econômica negou que a concessão dessas gratificações reduza a economia fiscal da reforma. “Reduziu-se a base de cálculo para quem ganha mais e aumentou-se para quem ganha menos”, informou a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. “O texto base mantém a questão da economia para a União em aproximadamente R$ 10 bilhões em dez anos. Não mudamos nada em relação a isso”, reforçou o relator, Vinicius Carvalho, aos jornalistas.Desde segunda-feira os governistas vinham trabalhando para garantir a aprovação do texto-base ainda nesta semana. Devido à pressão das categorias, também foi necessário amenizar regras de transição para a aposentadoria de alguns dos atuais policiais militares e bombeiros. Isso porque varia, dependendo do Estado, o tempo de serviço mínimo para a inatividade do profissional. Em geral, o período exigido é de 30 anos, mas há algumas unidades da federação que exigem 25 anos de serviço.

Para resolver essa disparidade, o relator criou uma espécie de pedágio. Nos casos em que a regra atual é de 25 anos obrigatórios, o sistema exigirá somente quatro meses de trabalho para cada ano excedente. Ou seja, se o militar precisar de mais anos para alcançar os 30 anos de serviço, não serão contados os anos completos, mas sim os quatro meses correspondentes a cada um deles. Tratou-se de suavizar a transição para os casos em que os Estados exigiam somente 25 anos de serviço para o militar se aposentar. Assim, se faltarem cinco nos para atingir os 30 anos, o militar terá que trabalhar 20 meses e não os cinco anos restantes. Por fim, o texto impede que os Estados e a União alterem antes de 2025 a alíquota da contribuição previdenciária.

 

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Com acordo, Previdência segue para promulgação


Novas regras para aposentadoria valerão apartir de novembro


Por Vandson Lima 

A reforma da Previdência teve a tramitação concluída ontem no Senado, com a aprovação de um destaque apresentado pelo PT, que abre uma brecha para a concessão de aposentadoria especial para trabalhadores em atividades com periculosidade, como vigilantes armados. O governo era contra a mudança, pois queria deixar expresso na Constituição que não há tal previsão para a categoria, evitando ações na Justiça, como tem ocorrido.

O destaque do senador Paulo Paim (PT-RS) foi aprovado após um acordo entre o governo e o Senado. O entendimento foi que, em troca do aval para o destaque e conclusão da reforma da Previdência, o Senado tramite rapidamente um projeto que trará condições para concessão de aposentadoria especial por periculosidade.

Segundo o secretário especial da Previdência, Rogério Marinho, o destaque não trará impacto fiscal caso o projeto seja aprovado posteriormente, como acertado. Hoje há um vácuo jurídico que permite que trabalhadores que enfrentam um grau de perigo sejam equiparados a quem lida com agentes nocivos à saúde e, assim, requisitem aposentadoria especial. O governo estimava uma economia da ordem de R$ 23 bilhões com sentenças judiciais, envolvendo pelos menos 75 categorias.

A mudança, como é redacional, também não fará a PEC da reforma da Previdência voltar à Câmara. “O acordo preserva os R$ 800 bilhões de economia com a reforma”, apontou Marinho.

Principal militante da causa previdenciária no Congresso, Paim foi o responsável por chamar a atenção para o ponto, em um discurso emocionado na noite de terça-feira. Por isso, recebeu homenagens de quase todos os senadores presentes, de oposição e situação.

O presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP) cedeu a cadeira de presidente ao petista para que ele anunciasse o resultado da votação do destaque. Alcolumbre, que horas depois assumiu a presidência da República temporariamente por causa das ausências no país do presidente Jair Bolsonaro, do vice Hamilton Mourão e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-AP), pontuou que a reforma da Previdência é, acima de tudo, uma vitória do Congresso.

“Foi dito aqui que reformas foram feitas em todos os governos, mas esta reforma foi feita pelo Parlamento brasileiro. O governo federal tem consciência disso”, disse.

Do ponto de vista político, a avaliação corrente foi de que, além do discurso de Paim, pesou para os senadores o cálculo eleitoral. Eles se viram constrangidos com a possibilidade de prejudicar a categoria dos vigilantes que atuam nas cidades, o que poderia lhes prejudicar no futuro - o próximo ano é de eleições municipais, e partidos como o MDB, o maior do Senado, têm grande interesse em recuperar terreno nas administrações locais.

As novas regras para a aposentadoria valerão após a promulgação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), em novembro, quando o presidente Jair Bolsonaro retornar de viagem à Ásia.

 

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Associação de juízes deve acionar Supremo


Votação da PEC da Previdência foi concluída pelo Senado ontem. Proposta será promulgada em novembro


Por Isadora Peron e Murillo Camarotto

Após a conclusão da votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência pelo Congresso, pelo menos uma entidade, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) confirmou que vai acionar a Corte nas próximas semanas.

Em outra frente, o procurador-geral da República, Augusto Aras, disse ao Valor que vai começar a estudar o texto para decidir se vai questionar algum ponto no Supremo.

A votação da PEC foi concluída pelo Senado ontem, com o exame dos últimos destaques. A proposta será promulgada em novembro, após a volta do presidente Jair Bolsonaro de viagem à Ásia. “Sem prejuízo de eventual provocação de terceiros, começaremos os estudos acerca da reforma previdenciária”, disse Aras.

No início do mês, o novo PGR tinha dito que poderia acionar o STF após a conclusão da votação e que via problemas nas regras de transição de “certas carreiras”.

Em nota divulgada ontem, a Ajufe manifestou “preocupação” com as novas regras e afirma que "praticamente não existiram" debates no Congresso para mudar "normas tão importantes para o futuro dos brasileiros”.

“A preocupação de que cada um passe a cuidar da sua aposentadoria foi clara desde o início, com pouquíssimas reflexões sobre aqueles que já estão por décadas no Regimes Geral da Previdência Social e no Regime Próprio dos Servidores Públicos", diz o texto.

Em relação às alterações para magistrados, a associação classifica como "lamentáveis" as normas referentes a progressões de alíquotas previdenciárias, que diz ser "um autêntico confisco se somadas as alíquotas de Imposto de Renda, possibilitando que se tribute praticamente metade da remuneração".

A Ajufe também critica a "drástica" redução da pensão por morte para 50% do valor da remuneração, acrescido de 10% por dependente. A entidade afirmou serem “extremamente cruéis” as regras de transição aprovadas.

“A Ajufe reconhece a necessidade de ajustes na Previdência, mas não pode concordar com a falta de debates, com o descaso com aqueles que estavam no mercado de trabalho por bastante tempo e não terão regras de transição razoáveis, e com regras que incentivem a informalidade", diz o texto.

Ao todo, a reforma da Previdência altera regras de aposentadorias e pensões para mais de 72 milhões de pessoas, entre trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos federais.

Agora, quem receber um salário maior terá que contribuir com mais - até 14% no INSS e até 22% no serviço público federal, para quem receber acima do teto constitucional de R$ 39,2 mil por mês.

Com a reforma, o país passa a ter uma idade mínima para aposentadorias, de 65 anos, para homem, e 62 anos, para mulher. Quem já está na ativa poderá contar com diferentes regras de transição.A equipe econômica do governo estima que a economia, com as novas regras, será de R$ 800 bilhões nos próximos dez anos. A previsão inicial era de um alívio fiscal de mais de R$ 1 trilhão.

 

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Tasso prevê ressarcimento ao INSS por isenção


PEC paralela deve ser votada na CCJ em 6 de novembro


Por Vandson Lima 

Relator da reforma da Previdência, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) mudou o texto da chamada Proposta de Emenda à Constituição (PEC) paralela, que tramita em separado do texto principal, já aprovado pelo Congresso Nacional. A mudança de maior impacto é em relação à isenção de entidades consideradas filantrópicas, nas quais estão incluídas universidades e hospitais.

O texto de Tasso faz com que o Tesouro Nacional passe a ser obrigado a arcar com esse custo, tendo de ressarcir o INSS. O relator também prevê a apresentação de um projeto de lei complementar, de sua autoria, para regulamentar a questão.

Deste modo, Tasso induz o governo a fazer o seu projeto caminhar, já que arcaria com a despesa daqui em diante.

“Fica desde já previsto que a União deverá compensar o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) por esta renúncia, com impactos inclusive na apuração do déficit previdenciário. Por mais nobre que sejam os fins perseguidos por esta renúncia, seu tratamento deve ser transparente, e isso inclui o trato das contas da Previdência”, apontou o senador tucano em seu relatório.

Valor adiantou, na segunda-feira, que Tasso estudava obrigar o Tesouro Nacional a arcar com a isenção, que ele calcula ser da ordem de R$ 12 bilhões ao ano.

“Nos próximos dias, eu apresentarei projeto de lei complementar regulamentando esta questão. Temos que ser francos de reconhecer que existem hoje no Brasil, principalmente no setor de educação, muitas entidades empresariais disfarçadas de entidades filantrópicas”, destacou o relator.

A PEC passa a prever também a criação de um benefício fiscal destinado à criança em situação de pobreza.

“A universalização proposta, comum em países desenvolvidos, não geraria custo fiscal extra, pois poderia ser financiada pela unificação diversas políticas públicas, focalizada na população infantil”, pontua Tasso no relatório. Estimativas iniciais sugerem que mesmo sem custo fiscal extra, a pobreza infantil poderia ser reduzida em 30%, segundo o parecer.

“A universidade, como proposta, implicará em um gasto social mais focalizado e mais progressivo”. Mesmo com a aprovação desta PEC, uma lei específica terá de ser aprovada para efetivar a nova política.

“O texto que propomos meramente abre espaço para que a Constituição a autorize”, conclui o relatório.

Outra inovação da PEC paralela é sobre a adesão de Estados e municípios ao novo sistema de aposentadorias.

Da mesma forma que poderão aderir à reforma obtendo o aval de suas assembleias legislativas para a medida, via projeto de lei, os entes terão um mecanismo para posteriormente voltar atrás na decisão, também aprovando projeto nesse sentido. Contudo, eles não poderão fazer isso com 180 dias ou menos para o término do mandato.

A PEC paralela foi lida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A presidente do colegiado, Simone Tebet (MDB-MS), anunciou que o relatório terá vista coletiva (tempo de análise) de 15 dias e marcou para o dia 6 de novembro a votação do relatório da proposta.