O Globo, n. 32639, 17/12/2022. Economia, p. 13

O plano B do PT para a 'PEC da transição'

Fernanda Trisotto
Bruno Góes


Diante do impasse político que impediu a votação da "PEC da Transição" na Câmara dos Deputados nesta semana, o PT decidiu aumentar a pressão entre os parlamentares para manter o prazo de dois anos de validade da medida no texto. A estratégia foi admitir que o partido passou a discutir um plano B para garantir espaço no Orçamento de 2023 para uma das principais promessas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na campanha presidencial: a manutenção do Bolsa Família em R$ 600 mensais a partir de janeiro, com a inclusão de um adicional de R$ 150 por criança até seis anos nas famílias de beneficiários. O partido ainda não chegou a um consenso sobre o plano B, mas há várias possibilidades na mesa. Uma delas seria a edição de medida provisória, outra seria uma solução jurídica, com um mandado de injunção. Esse instrumento faz valer as determinações da Constituição junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Saída para o Bolsa Família

Mas seja qual for a opção escolhida, caso opte por um caminho alternativo, ele só resolverá a garantia de recursos para o Bolsa Família. Sem a PEC, o futuro governo não conseguirá turbinar o Orçamento em R$ 145 bilhões, dos quais R$ 70 bilhões estão reservados para a transferência de renda. O restante seria destinado à recomposição de verbas de programas como Farmácia Popular e Minha Casa Minha Vida. Partir para um plano B também significaria abrir mão de R$ 23 bilhões para investimentos que poderiam ser feitos fora do teto de gastos (a regra que limita o crescimento das despesas públicas). A liberação de recursos para investimentos prevista na PEC seria feita por meio do uso de um percentual do excesso de arrecadação do governo. Isso valeria para 2022 e poderia ser usado para desbloquear os R$ 7,7 bilhões do orçamento secreto, congelados por causa das limitações impostas pelo teto de gastos e na berlinda com o julgamento sobre a constitucionalidade das emendas de relator no Supremo Tribunal Federal (STF). Parlamentares, economistas e juristas, inclusive ligados ao PT, já reconheceram que a melhor maneira de garantir recursos no Orçamento seria por meio de emenda constitucional, para evitar questionamentos judiciais.

O anúncio do plano B pode ser mais um instrumento de pressão política para fazer frente à ofensiva do Centrão por espaço no governo Lula e pela contrariedade com o julgamento do STF que pode tornar ilegal o orçamento secreto.

Contando os votos

O presidente da Câmara, Arhur Lira (PP-AL),marcou a votação da PEC para terça-feira. Os petistas esperam que Lula dê um ultimato a Lira para que não haja alteração no texto com redução do prazo. A expectativa era que os dois se reunissem ontem, mas o encontro não aconteceu. Enquanto a conversa não acontece, a bancada do PT na Câmara já se articula para barrar mudanças na PEC, como a pretendida pelo PL para reduzir o prazo de validade de dois para um ano. O PT vai apresentar emenda ao relator, Elmar Nascimento (União-BA),pedindo um ajuste no texto, sem alteração de mérito. No rascunho da emenda ao qual O GLOBO teve acesso, saem as menções aos anos 2023 e 2024 e entra a expressão "para os dois exercícios financeiros subsequentes à promulgação desta Emenda Constitucional".

Essa mudança seria apenas uma adequação da redação do artigo e não exigiria que o texto voltasse ao Senado, caso seja acatada. De quebra, inviabiliza a sugestão do PL, de reduzir a validade da PEC. O PT segue contando os votos para garantir a aprovação da proposta. O partido precisa entregar até 250 votos, contando a futura base, para que o texto prospere. Em contrapartida, espera de Lira e do Centrão ao menos 90 votos. Apesar de Lira estar pessoalmente envolvido com a articulação do apoio à PEC, o suspense em torno do futuro do orçamento secreto com o julgamento no STF afetou a garantia de apoio, já que não há certeza de que as emendas já negociadas serão pagas.

Dívida bruta pode chegar a 81,8%
> Uma nova proposta de âncora para as contas públicas não será capaz, sozinha, de solucionar o endividamento público brasileiro, aponta relatório do Tesouro Nacional. A nova regra precisará vir acompanhada de medidas de redução de despesas ou de aumento de receita, capazes de melhorar a trajetória do resultado primário no curto prazo e trazer a dívida para níveis sustentáveis, diz o texto.

> A "PEC da Transição", que abre espaço no Orçamento de 2023, obriga o governo a enviar no próximo ano uma nova regra fiscal, em substituição ao teto de gastos (que trava as despesas federais).

> Com base nos parâmetros da PEC, o Tesouro calcula que a dívida bruta brasileira vai aumentar em 2,7 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026, em relação ao cenário de referência. A previsão passaria de 79,1% do PIB em 2026 no cenário-base para 81,8% do PIB, "em trajetória ascendente". (M.V.)