Valor Econômico, n. 4916, 10/01/2020. Finanças, p. C8

Mais risco nos investimentos de fundos de pensão
Guilherme Benites


A necessidade de aumento de risco nos portfólios em 2020 não é novidade para ninguém. Nesse texto, vamos abordar tal situação em um grupo particular de investidores, as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPCs), a partir da experiência de trabalhar com esse público na confecção de suas políticas de investimentos há alguns anos.

A realidade de juros baixos impacta diretamente os investidores de longo prazo, evidentemente, mas a reação de cada um deles depende de fatores como situação atual da carteira e apetite a risco - no caso em questão, de seus participantes, o que torna a questão ainda menos óbvia.

Em nossa amostra de clientes que possuem planos do tipo benefício definido (BD), nos quais o risco atuarial é acentuado, predomina a estratégia de construção da carteira com títulos públicos de longo prazo marcados na curva, a taxa média normalmente superior a IPCA mais 6% ao ano - títulos adquiridos, majoritariamente, entre 2014 e 2016. Nesses planos, o elevado “carrego” da carteira permite que a adição de risco seja feita de forma gradual, sem grandes impactos no curto prazo. Além disso, o arcabouço legal já criado pelo regulador incentiva a diminuição das taxas atuariais no tempo, o que deve implicar uma convergência para taxas atuariais mais baixas em um cenário de maior normalidade dos juros.

No caso dos planos do tipo contribuição definida (CD), notamos maior preocupação com o aumento de risco no curto prazo. Por um lado, os títulos de longo prazo a mercado geraram ganhos significativos em 2019, mas não garantem taxas elevadas para 2020. Por outro lado, trata-se do tipo de plano em que o participante controla mais de perto a sua cota, o que implica que a volatilidade decorrente do aumento de risco tenda a ser mais sentida - e, em certa medida, mais “cobrada”.

Ainda que as carteiras desses planos não tenham sido conservadoras ao longo dos últimos anos, o forte fechamento das taxas de juros e o bom desempenho das ações acabaram por gerar ótimos resultados com volatilidade consideravelmente baixa. 

O contexto atual sugere, portanto, aumentar a parcela de risco justamente quando os prêmios estão mais baixos (para reflexões mais profundas sobre prêmio de risco, sugerimos os textos de Jair Ribeiro, da Fundação Real Grandeza, nesse mesmo espaço) e a sensação de volatilidade tende a ser maior, pois o lastro da carteira, normalmente em CDI, deve render abaixo de 0,4% ao mês.

Dentre esses planos, existem aqueles que oferecem perfis de investimentos a seus participantes. É um caso em que a situação tende a ser mais simples, uma vez que a alocação de um determinado perfil deve ser coerente com um público específico, que optou por ele e, ao menos em tese, aceita a volatilidade correspondente à alocação estabelecida.

Ainda que haja casos distintos em um mesmo tipo de plano, não vemos solução simples para nenhum deles. Temos assistido a uma contínua migração de participantes para perfis mais agressivos, nas EFPCs que oferecem essa possibilidade, e pressão por maiores retornos naquelas que não oferecem - sobretudo de participantes que visavam ao consumo do montante acumulado a taxas próximas de 1% ao mês.

Apesar do desejo por maiores retornos, ainda existe enorme aversão ao risco quando os resultados não vão bem, e isso foi raro nos últimos três anos, o que não ajudou em nada em termos de educação financeira. O órgão regulador, a Previc, tem estimulado o debate sobre educação e adequação dos participantes, mas esses são temas ainda distantes da maioria dos brasileiros, e em particular dos investidores em previdência.

Em nossa visão, a realidade de juros muito baixos chegou muito antes de uma cultura de investimentos sólida, e provavelmente os investidores que estão mais distantes do mercado financeiro ainda levarão algum tempo para se adaptar a esse novo mundo. Quanto às alocações, nosso tema central, acreditamos que acompanharão esse processo de aprendizagem: o risco vai aumentar em 2020, mas não de forma a compensar os ganhos reais dos anos anteriores. Em que pese a maior parte desses planos mirar retorno real de 4% ao ano, não vislumbramos que a projeção para 2020 fique muito além de 3%, sem otimismo exagerado quanto ao desempenho da bolsa.

A maior parte das EFPCs deve ampliar o espaço para renda variável e para fundos multimercados, classes que já vêm sendo utilizadas com a finalidade de aumento de risco há anos. Depois de algum tempo, os fundos imobiliários também tendem a voltar para as carteiras.

Na renda fixa, a alocação estrutural em NTN-Bs deve ser diminuída, em razão da assimetria atual da curva de IPCA. Acreditamos também no retorno do crédito, que estava relegado a segundo plano, mas passou a ser enxergado como oportunidade depois de outubro último.

E, por fim, o segmento de investimento no exterior deve permanecer ganhando espaço, principalmente como elemento de diversificação em um mercado local cada vez mais correlacionado e com prêmios menores do que estávamos acostumados.