O Globo, n. 32684, 31/01/2023. Política, p. 8

PF avalia ouvir Valdemar sobre decreto golpista

Alice Cravo


O diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Passos, afirmou ontem que o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, poderá ser chamado a depor na investigação sobre a minuta de decreto golpista encontrada na casa do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal Anderson Torres. O documento foi localizado durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão.

O dirigente, que está à frente do partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, afirmou em entrevista ao GLOBO que propostas similares circularam e poderiam ser encontradas com diversos interlocutores da antiga gestão.

— Provavelmente, eu não posso aqui cravar que isso acontecerá, provavelmente ele (Valdemar) e qualquer outra pessoa que tiver informação ou relação com os episódios investigados podem ser chamados a serem ouvidos como testemunhas para poder ajudar a esclarecer os fatos — afirmou Andrei em entrevista à GloboNews.

No último dia 12, a PF apreendeu na residência de Torres, em Brasília, uma minuta de decreto presidencial que sugeria a Bolsonaro uma espécie de intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pro meio da instauração do estado de defesa, o que poderia abrir caminho para mudar o resultado da eleição em que o então chefe do Executivo foi derrotado por Lula.

A minuta passou a integrar a apuração da PF que mira a atuação de Torres, preso sob acusação de omissão no caso dos atos golpistas de 8 de janeiro, e de outros suspeitos de envolvimento nos ataques à democracia.

Em entrevista ao GLOBO, Valdemar afirmou que propostas semelhantes circulavam no entorno de Bolsonaro. O dirigente afirmou que chegou a receber sugestões similares e que teve o “cuidado de triturá-las”.

— Nunca comentei, mas recebi várias propostas, que vinham pelos Correios, que recebi em evento político. Tinha gente que colocava (o papel) no meu bolso, dizendo que era como tirar o Lula do governo. Advogados me mandavam como fazer utilizando o artigo 142, mas tudo fora da lei. Tive o cuidado de triturar. Aquela proposta que tinha na casa do ministro da Justiça, isso tinha na casa de todo mundo. Muita gente chegou para mim agora e falou: “Pô, você sabe que eu tinha um papel parecido com aquele lá em casa. Imagina se pegam” —afirmou comandante do PL.

Pedido ao STF

No sábado, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que investigue Valdemar acerca da circulação da minuta. O pedido do senador foi destinado ao ministro Alexandre de Moraes —no documento, o parlamentar pede que a Polícia Federal tome com urgência o depoimento do presidente do PL. Contarato cita a possibilidade da prática de crime por “destruir, suprimir ou ocultar, em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, documento público ou particular verdadeiro, de que não podia dispor”.

Na avaliação de ministros da Corte, é necessário desvendar quem participava da elaboração de tal tipo de material. Para um magistrado, a declaração mostra uma ampliação da participação de pessoas no suposto crime.

Integrantes da cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) endossam o entendimento e acrescentam que, além do STF, o TSE também poderá dar prosseguimento às apurações.