Valor Econômico, v.20, n. 4870, 31/10/2019. Política p.A18

 

Cármen pontua diferença em relação a Toffoli sobre 2ª instância


Toffoli foi alvo de protestos por ter pautado tema para discussão


Por Carolina Freitas 

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia comparou-se ontem com o presidente da Corte, Dias Toffoli, para lembrar que, quando ela comandou a instituição, não se questionava ali se um condenado pode ou não ser preso após decisão da segunda instância da Justiça.

Cármen Lúcia presidiu o STF por dois anos até setembro do ano passado. Foi sucedida por Toffoli. Quando ocupou o comando da Corte, a ministra decidiu, apesar de apelos de colegas, não pautar a questão da prisão após segunda instância. Já Toffoli pautou. O plenário do Supremo iniciou o julgamento no dia 17 e prosseguirá em 7 de novembro. O questionamento é se condenados podem ser presos já nessa fase do processo ou se podem esperar o julgamento da última instância da Justiça.

Cármen foi questionada sobre o tema por pessoas que assistiam painel dela em evento do jornal “O Estado de S.Paulo”, ontem, na capital paulista. “As perguntas são ótimas, muito bem postas e mal dirigidas. Por uma razão simples: quando eu estava na presidência do Supremo, até um ano atrás, esse assunto não voltou. E o Brasil inteiro assistiu isso”, respondeu a ministra, ganhando aplausos.

“Quando eu era presidente eu achei que não havia mudança de entendimento do Supremo [sobre segunda instância] em dois anos e por isso não pautei”, disse. Ela será a primeira a votar quando o julgamento for retomado em novembro e deve ser favorável à prisão após segunda instância. O placar está em 4 a 3 a favor do cum- primento antecipado da pena.

“Nos tribunais superiores - STJ e STF - somos proibidos de olhar prova. O máximo que podemos verificar é se houve nulidade, a dosimetria, mas não muda mais condenação, a não ser em casos raríssimos”, afirmou Cármen.

A ministra associou a possibilidade de prisão após segunda instância à eficiência do sistema criminal. “Direito ineficiente é a mesma coisa de fomentar descrença. No final dos anos 90 tivemos linchamentos, porque as pessoas não acreditavam na Justiça e partiram para a barbárie.”

Cármen Lúcia deixou o local sem falar com a imprensa, pouco antes de Toffoli chegar ao evento. Ainda durante a fala dela começou em frente ao prédio um protesto, com público que flutuou de 6 a 15 pessoas ao longo de duas horas e meia. Com microfone, caixa de som e megafone, manifestantes gritavam contra Toffoli. Levavam cartazes que chamavam o ministro de “abutre” por aceitar revisitar a prisão após segunda instância.

Postaram-se do lado de fora do salão onde Toffoli almoçava e gritavam, batiam panelas e sopravam apitos ao longo de toda a palestra do ministro. De onde ele estava, ouvia-se nitidamente a confusão.

Na palestra, Toffoli disse considerar positivo que as pessoas conheçam mais o STF. “É bom hoje que as pessoas saibam que existe um STF, quem são os ministros, venham fazer protesto”, disse. “Mas será que o Supremo é o problema? Será que o problema do país é o Judiciário ou é a cultura do litígio?”

Para o ministro, depois da Constituição de 1988, casos sobre os mais diversos temas foram parar no Supremo. “Passamos a ser muito mais demandados e aumentou nossa presença na sociedade.”