O Globo, n. 32684, 31/01/2023. Economia, p. 13

Demandas da indústria

Ivan Martínez-Vargas


Em encontro ontem na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ouviu do presidente da entidade, Josué Gomes, um pedido para baixar as alíquotas da indústria de transformação e, no curto prazo, a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), antes mesmo da aprovação da reforma tributária. Haddad afirmou que o texto já poderia ter sido aprovado em 2022, não fosse a insistência do governo anterior em recriar um imposto nos moldes da antiga CPMF.

— Ouvimos dos 27 governadores discurso a favor da reforma tributária, salvo uma ou outra exceção. Ela só não foi votada no ano passado porque se insistia na agenda da CPMF —afirmou o ministro.

— Não houve vontade política (do governo Bolsonaro) para aprovar, mas havia um entendimento no Senado e na Câmara de que a reforma estava no caminho certo.

Agora, Haddad disse acreditar que o tema ganhará impulso após a eleição para o comando do Senado e da Câmara.

Em seu discurso, além da urgência da reforma, Josué propôs a depreciação, de maneira imediata, dos investimentos feitos na indústria de transformação, o que resultaria em pagamento menor de impostos.

— Tem uma mudança no fluxo de caixa do governo federal, mas isso ajudaria a indústria a investir mais rapidamente e recuperar produtividade —argumentou Josué.

O presidente da Fiesp também relembrou a demanda da indústria para zerar o IPI. A intenção do governo é acabar com o tributo no âmbito da reforma tributária.

— Talvez o senhor tenha de (...) abrir mão um pouco de arrecadação da indústria de transformação num primeiro momento para promover um crescimento que, pouco tempo depois, recuperará a receita com sobra. (...) Conseguir fazer com que os setores todos concordem com a neutralidade, diminuindo a carga da indústria de transformação não é fácil. A gente tem de reconhecer que a reforma tributária não foi ainda aprovada porque dentro do próprio setor privado não há consenso sobre ela —afirmou Josué.

Para ele, a alta carga tributária paga pela indústria retira capacidade de investimento e compromete a competitividade. O dirigente da Fiesp também criticou o custo elevado de capital no Brasil, com juros reais de 8% ao ano:

— Tivemos 28% do PIB e hoje temos 11%. E não foi porque o empresário industrial brasileiro desaprendeu. (...) O Brasil foi criando condições extremamente inóspitas para o desenvolvimento da indústria de transformação. A indústria de transformação recolhe 30% do total de tributos arrecadados no Brasil, apesar de ter apenas 11% de participação no PIB.

Haddad evitou se comprometer com desonerações, mas reiterou seu compromisso com a aprovação da reforma tributária e de uma nova âncora fiscal ainda no primeiro semestre. Sem dar detalhes sobre a nova regra para as contas públicas, ele voltou a dizer, porém, que o consenso é que há “a necessidade de substituir a regra que até hoje está em vigor”, no caso, o teto de gastos, por uma regra “mais moderna, confiável, crível, sustentável no longo prazo”.

— O diagnóstico está pacificado, desconstitucionalizar (tirar da Constituição). A “PEC da Transição” prevê o tratamento (da questão) por lei complementar. O prazo estamos trazendo de agosto para abril —disse Haddad.

Elogios e questionamentos

Durante o encontro com a cúpula da indústria, Haddad ouviu muitos elogios, mas também alguns questionamentos, como o comportamento do câmbio, o impacto do custo Brasil nos negócios e críticas à proposta de o BNDES voltar a financiar a exportação de serviços de engenharia no exterior. Questões que afetam o custo da produção, como a alta da energia, também foram abordadas.

Haddad disse compreender a insegurança de parte do empresariado em relação à agenda do governo e se comprometeu com a reindustrialização do país:

—É natural que as pessoas tenham uma certa ansiedade de respostas prontas para tudo, como se, em 30 dias, nós tivéssemos de dar conta de todos os problemas herdados do passado recente e do passado longínquo. Não será assim, mas será um governo de alta intensidade no sentido das reformas necessárias para o país andar.

Sem citar nomes, o ministro criticou economistas que vaticinaram “o caos econômico no Brasil” no início do governo. Atribuiu a valorização relativa do real frente ao dólar à entrada de investimento estrangeiro:

—Vejo que o ingresso de capital estrangeiro no Brasil só aumenta. O interesse no Brasil voltou como há muito tempo não se vê, um interesse genuíno na agenda brasileira.

O ministro ouviu pedidos de Eugênio Staub, que por décadas comandou a marca de eletroeletrônicos Gradiente, para que o câmbio brasileiro permaneça nos atuais patamares. Escutou também Eduardo Ribeiro Capobianco, representante do Sindicato da Construção Civil de São Paulo (Sinduscon-SP) na Fiesp, dizer que “não faz sentido” o Brasil financiar obras de infraestrutura no exterior enquanto o país necessita de investimentos na área, e o BNDES “tem hoje uma taxa de juros elevada, que dificulta muito a captação de recursos” pelo empresário brasileiro.

Sobre isso, Haddad respondeu que o governo federal espera turbinar concessões e parcerias público privadas, principalmente tirando o que o ministro chamou de “travas burocráticas”, sem dar detalhes.