Valor Econômico, v. 20, n. 4897, 10/12/2019. Opinião, p. A14

Educação completa dez anos de estagnação no Brasil

 

Novo levantamento do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês) mostra que a educação está estagnada no Brasil há pelo menos dez anos. Na defensiva, o governo de Jair Bolsonaro apressou-se em dizer que nada tem a ver com o desempenho ruim dos estudantes, uma vez que as notas referem-se a 2018. O ministro da Educação, Abraham Weintraub garantiu que “2019 será o ponto de inflexão” e que assumirá “integralmente a responsabilidade” se os números não melhorarem nas próximas avaliações.

A questão de fato não é procurar culpados e sim buscar mudar esse quadro lamentável, que é legado ao governante de plantão, quer tenha sido ele responsável ou não pela situação, com repercussão direta na gestão do país e no desenvolvimento e produtividade da economia. A estagnação da educação foi o principal motivo para a queda do Brasil no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), calculado pela ONU, em 2018. O país caiu do 78º para o 79º lugar entre 189 examinados. A expectativa de tempo de permanência na escola está estacionada em 15,4 anos desde 2016, enquanto a média efetiva de anos de estudo ficou em 7,8 anos, mesmo patamar de 2017.

O teste feito pelo Pisa no ano passado mostrou que a posição do Brasil praticamente não saiu do lugar desde 2009, nas três áreas avaliadas. O país ficou em 57º lugar em leitura, entre 77 países examinados; em 66º em ciências entre 78 avaliações; e em 70º em matemática, a pior posição, entre 78. A prova foi feita em 79 países e regiões, incluindo  membros e associados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Cerca de 600 mil estudantes foram testados no mundo todo, dos quais 10,7 mil brasileiros. Desses, 43% ficaram abaixo do nível mínimo de conhecimentos nas três áreas. Segundo os avaliadores do Pisa, menos de um terço dos estudantes brasileiros conseguem identificar situações do dia a dia que podem ser convertidas em operações matemáticas simples, como a comparação de preços em moedas diferentes.

Metade não alcançou o nível mínimo para leitura, o que significa que eles têm problemas para interpretar informações, identificar a ideia principal de um texto, refletir sobre o conteúdo exposto, além de ler notícias. A média entre os países mais desenvolvidos é de 77%. Nada menos que 55% chegaram até o nível 2 em ciências, falhando em identificar  se uma conclusão nessa área é válida a partir dos dados apresentados. O Pisa também evidenciou o efeito perverso que a educação deficiente das escolas públicas tem no aumento da desigualdade.

As principais medidas para a educação apresentadas até agora pelo governo não parecem ter o poder de mudar o quadro. Entre elas o ministro Weintraub destacou a aplicação da Nova Política Nacional de Alfabetização e do Future-se, o investimento em ensino integral e em escolas cívico-militares. Na outra direção, o governo cortou despesas na área, afetando instituições federais e a concessão de bolsas de mestrado e doutorado.

Reportagem do Valor (18/10) sustenta que há uma falsa polêmica sobre se o Brasil investe muito ou pouco em educação. Em relação ao PIB, o número é grande, de 5,4%, em comparação com os 4,8%, da média dos países da OCDE. Mas na relação investimento por aluno, o Brasil gasta US$ 3,8 mil, um terço dos US$ 10,1 mil da média da OCDE. Há quem questione  a necessidade de se aumentar o investimento em educação, argumentando que ele triplicou neste século, mas o resultado não melhorou. Outro argumento é que países que investem menos do que o Brasil, como Turquia e México, têm desempenho melhor no Pisa.

Os especialistas lamentam a ausência de um projeto de longo prazo, focado na valorização da carreira de professor, responsável último por ligar o conteúdo didático à vida prática.

A mudança na demografia vai afetar esse cenário. Nos próximos 40 anos, a população até 20 anos vai cair 43%, para 45,5 milhões de pessoas, o que reduzirá a necessidade de escolas e professores. O sistema de educação básica será um terço menor. Se a previsão se confirmar e mantido o volume de recursos para a área, o valor do investimento por aluno será naturalmente maior, os salários podem melhorar e os professores poderão ser mais selecionados. Como revelou estudo de Ricardo Paes de Barros, os pretendentes à licenciatura têm as menores notas entre os que procuram um lugar na universidade (FSP, 5-12). É preciso melhorar urgentemente sua qualificação.