Valor Econômico, v. 20, n. 4896 07/12/2019. Brasil, p. A6
 

Ipea define parâmetro para custo da poluição do ar
 Gabriel Vasconcelos 

 

Gestores públicos e analistas podem agora estimar com mais precisão o impacto financeiro do aumento ou redução da poluição do ar causados por projetos e programas de infraestrutura, saúde e meio ambiente. Nesse quesito, segundo pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), uma intervenção pode poupar ou custar, especificamente no Brasil, entre R$ 2,17 milhões a R$ 3,93 milhões por pessoa. O Ipea sugere que um valor dentro desse intervalo seja aplicado no cálculo da análise de custos e benefícios de políticas públicas que modifiquem a qualidade do ar no país.

A estimativa do Ipea expressa monetariamente quanto a sociedade brasileira estaria disposta a pagar pela redução do risco de morte prematura de um indivíduo por problemas respiratórios. A metodologia por “disposição a pagar” (WTP, na sigla em inglês) combina resultados de pesquisas de opinião realizadas pela Organização para a Cooperação e  Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 38 países que foram adaptadas à realidade brasileira por meio de modelo desenvolvido pelo Ipea.

As pesquisas apuram, por exemplo, quanto o entrevistado exigiria adicionalmente para trabalhar em ambiente poluído ou quanto estaria disposto a gastar para morar em local com ar mais puro. “As pessoas em geral não sabem precificar benefícios ou prejuízos relacionados à poluição. O questionário tenta extrair isso de forma indireta, por meio de formulações mais próximas à sua realidade”, explica o coordenador do estudo, Glauter Rocha.

Economista do Ipea cedido à Escola Nacional de Administração Pública (Enap), Rocha diz que o método é o mais preciso da literatura existente ao permitir mensurar ineficiências levando em conta critérios de bem-estar social que vão além dos preços de mercado. Outras abordagens, aplicadas com o mesmo fim, só consideram a renda perdida com mortes prematuras ou o custo das doenças.

A adaptação de pesquisas da OCDE, diz Rocha, se justifica porque aplicá-las de fato seria caro e efêmero. “São padrões que variam no tempo”, afirma. Então, os pesquisadores optaram por “transferir” os resultados de 12 países para a realidade brasileira por meio de uma fórmula que combina variáveis, como renda per capita, escolaridade e expectativa de vida, atribuindo pesos maiores para as nações cujas estatísticas sociais mais se aproximam do Brasil. “Chegamos a uma espécie de Brasil sintético”, diz. O resultado foi uma combinação de Tailândia (69,7%), China (26,4%) e Alemanha (3,9%). Demais países assumiram peso zero.

Item da lista dos chamados “preços-sombra” - por serem de difícil valoração - esse parâmetro era até então ignorado ou mal calculado no Brasil. Analistas usavam valores superestimados por terem sido importados de países com renda média maior que a brasileira, como Estados Unidos e Alemanha, diz Rocha. A imprecisão afetava a negociação entre governo e iniciativa privada, por vezes inflando a contrapartida considerada.

Além da poluição, outros “preços-sombra” dizem sobre impactos relativos à redução do tempo despendido, segurança viária, número de acidentes e poluição sonora. O Ipea mira alguns para estabelecer uma espécie de catálogo de parâmetros a serem adotados pela União. O trabalho é coordenado pela Diretoria de Estudos e Políticas Setoriais de Inovação e Infraestrutura do Ipea (Diset).

O preço-sombra relativo à poluição do ar poderá ser aplicado na análise da ampliação de uma rodovia, que reduza o tempo de emissão de gases de um carro em determinada região, ou em programas de subsídios para a renovação de caminhões, que visem frotas menos poluente. O mesmo vale para projetos com impacto negativo.

Objetivamente, para estimá-lo o gestor deve multiplicar a média anual de redução de risco pelo número de pessoas afetadas pela intervenção, conta da qual vai extrair o número esperado de prevenção de mortes em um ano. Para chegar ao benefício financeiro no período, bastará multiplicar o parâmetro pré-fixado pelo Ipea pelo número de mortes evitadas. Por fim, o benefício total vai variar de acordo com o tempo de vida da intervenção, o que deve ser projetado em valores presentes.