Valor Econômico, v. 20, n. 4895, 06/12/2019. Empresas, p. B8
 

Teles fazem proposta à Anatel para destravar 5G
Rafael Bitencourt 

 

As principais operadoras de celular do Brasil apresentaram ontem à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) uma proposta para acabar com o impasse sobre o risco de interferências dos serviços de quinta geração (5G) no sinal de antenas parabólicas da TV aberta. O embate em torno do tema, que envolve o uso da faixa de 3,5 gigahertz (GHz) conhecida como banda C, já provocou o adiamento do leilão de licenças do primeiro para o segundo semestre do próximo ano.

No ofício entregue ao órgão regulador, ao qual o Valor teve acesso, as prestadoras aceitam arcar com o custo de R$ 455 milhões para financiar medidas que garantam a convivência do serviço de TV com o novo padrão tecnológico na mesma radiofrequência.

Ontem, as teles marcaram posição em momento crucial de discussão sobre as regras da licitação, na Anatel. Representantes das empresas e do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular (SindiTelebrasil) estiveram com Emmanoel Campelo, diretor da agência, para mostrar o estudo que defende a convivência dos serviços sem ter que migrar as parabólicas para outra banda.

Campelo apresentará nova proposta de edital ao comando da agência na próxima quinta-feira, última reunião do conselho diretor neste ano. Na ocasião, poderá ser aberta a consulta pública para discutir as regras da licitação com os setores envolvidos.

A opção por assumir o custo de mitigação de interferências surge como alternativa à solução levantada por técnicos do governo e defendida pelas radiodifusores: migrar toda a recepção de parabólicas da banda C para a banda Ku.

As teles, no documento enviado à Anatel, alegam que a migração vai gerar despesa de R$ 7,7 bilhões para quem comprar as licenças de serviços 5G. As teles alegam que esse caminho inibe o potencial de arrecadação na cobrança de outorgas no leilão e de investimentos que serão estabelecidos para expandir as redes de serviço no país.

A análise técnica foi assinada por executivos da Telefônica (dona da marca Vivo), Claro, TIM, Oi, Algar e do SindiTelebrasil. Eles consideraram dados da pesquisa encomendada ao Ibope pela entidade do processo de digitalização da TV aberta, a EAD.

As teles chegaram ao número de 12,5 milhões residências com parabólicas ativas no país. Desse total, 72% dos domicílios (9 milhões) estão em áreas urbanas. Chegou-se, então, a 2,2 milhões de casas - 18% dos acessos urbanos que estarão próximos a antenas 5G - que poderão receber o equipamento. Seria oferecido um kit que sairia ao custo unitário de R$ 200, sendo R$ 80 do filtro de sinal, mais R$ 80 da mão de obra especializada e R$ 40 do deslocamento urbano.

Os dados das operadoras são questionados pelas principais associações do setor de radiodifusão (Abert e Abratel). As entidades reforçam a defesa de que as parabólicas sejam transferidas para a banda Ku. “Consideramos que não há viabilidade de convivência entre os serviços e, ao mesmo tempo, atender a demanda crescente das operadoras por radiofrequência. Há risco de desperdícios de esforços e recursos públicos numa solução que não é definitiva”, afirmou Wender Souza, engenheiro da Abratel.

As emissoras de TV aberta também contestam os custos indicados pelas teles. A migração para a banda Ku, afirmam, sairia por no máximo R$ 2,9 bilhões.

Para chegar ao custo de R$ 7,7 bilhões na migração para a banda Ku, as operadoras consideraram a compra de kit mais robusto para todos os 12,5 milhões de domicílios com parabólicas. Neste caso, o kit ficaria bem mais caro (R$ 620), dando direito à nova antena parabólica e ao filtro (R$ 120), à troca do receptor (R$ 200), à mão de obra (R$ 200) e deslocamento urbano e rural (R$ 100).

O diretor de tecnologia da Abert, Luiz Carlos Abrahão, ressaltou que o dado mais confiável sobre o total de parabólicas ativas foi produzido pelo IBGE, na PNAD TIC 2017, que apontou para o número de 22,1 milhões. Ele lembra, no entanto, que só famílias de baixa renda seriam beneficiadas.

No documento, as operadoras tentam convencer a agência sobre outros temas do edital do 5G. Ao diagnosticar o risco de interferência nas parabólicas, as teles constaram que é possível ofertar mais 100 MHz na faixa de 3,5 GHz para os serviços 5G. A proposta da Anatel já previa 300 MHz nessa faixa para o novo padrão tecnológico.

Questionado sobre a possibilidade de incluir mais 100 MHz, Campelo disse que está “muito em cima” para levar a proposta à audiência pública. Ele disse que tal mudança demanda análise adicional da área técnica, porém considera o acréscimo de radiofrequência positivo, o que poderá ser acatado na consulta e incorporada à versão final do edital.