Valor Econômico, v. 20, n. 4893 04/12/2019. Brasil, p. A2

 

País completa década perdida no Pisa, e paralisia no MEC eleva preocupação
 Hugo Passarelli 

 

A aprendizagem dos estudantes brasileiros ficou estacionada em 2018, completando uma década de estagnação pelos critérios do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês), divulgado ontem pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

No ano  passado, a nota brasileira em leitura garantiu a 57ª posição entre 77 países; em matemática, o 70º lugar entre 78; e em ciências, o 66º posto de 78 avaliações. A prova foi aplicada em 79 países e regiões, incluindo membros e associados da OCDE, mas nem todos os resultados foram considerados válidos.

O exame é realizado de três em três anos com jovens de 15 anos. Entre 2015 e 2018, o Brasil mostrou leve melhora numérica nas três avaliações, mas a OCDE diz que a variação não tem relevância estatística. Além disso, as notas brasileiras seguem abaixo da média dos membros da entidade.

A entidade destaca que, embora as notas dos países estejam na mesma escala, a diferença entre uma e outra nem sempre indica uma disparidade significativa de aprendizagem. Em leitura, por exemplo, o Brasil atingiu 413 pontos, acima da Colômbia (412) e abaixo da Jordânia (419) e da Malásia (415). A OCDE considera que a nota brasileira é equivalente  à destes três países.

O avanço lento também preocupa em um momento em que especialistas questionam a eficácia das ações do Ministério da Educação (MEC) comandado por Abraham Weintraub. “Mantida a rota adotada pelo atual governo, o que poderemos verificar, pela primeira vez, é uma queda no Pisa de 2021”, estima Priscila Cruz, diretora-executiva e cofundadora do movimento Todos pela Educação.

Segundo a especialista, as medidas anunciadas por Weintraub destoam das melhores práticas já conhecidas. “A militarização das escolas e a perseguição de professores estão rigorosamente na contramão do que os primeiros colocados fazem”, afirma.

“Sem um projeto de longo prazo, que pense na valorização dos professores, na atratividade da carreira (marca de todos países do topo e dos latino-americanos que mais avançaram) e na formação inicial e continuada dos profissionais é difícil ter boas expectativas”, diz Gregório Grisa, doutor em educação e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS).

“Para isso precisaríamos de um MEC que participe mais do financiamento da educação básica, via ampliação da complementação do Fundeb, que coordene políticas com diretividade política e técnica, tudo que não vimos até agora”, completa.

Para Priscila, do Todos Pela Educação, é alarmante a falta de reação da sociedade em meio ao que classifica como uma gestão de protagonismo ideológico do MEC. “Essa violência que tem sido feita com o Brasil, contra a possibilidade de um país que possa crescer e distribuir renda, não tem sido debatida pelas elites do país”, observa.

A OCDE estabelece uma escala de proficiência de 1 a 6 para as três disciplinas e constatou que, no caso brasileiro, 43% dos avaliados ficaram abaixo do nível mínimo de conhecimentos nas três matérias. Na média da OCDE, o percentual é bastante inferior, de 13%. De modo inverso, apenas 2% dos alunos brasileiros ficaram no topo da escala de proficiência em ao menos uma matéria, contra uma média de 16% da OCDE.

O desempenho do Brasil no Pisa vem mostrando um aumento de desigualdade entre os alunos de diversos segmentos sociais, o que pode ser explicado pela recuperação das escolas particulares.

 

Em 2018, os alunos com melhores condições socioeconômicas tiveram, na prova de leitura, nota superior em 97 pontos ante os mais vulneráveis. Em 2009, a diferença entre os dois extremos sociais era de 84 pontos.

“Esta desigualdade impacta a qualidade de vida e as economias local e global. Não há e não haverá desenvolvimento sustentável com tamanha desigualdade”, afirma Rosalina Maria Soares, assessora de pesquisa e avaliação da Fundação Roberto Marinho.

Ontem, o ministro da Educação atribuiu ao Partido dos Trabalhadores (PT) o baixo desempenho do Brasil. “O Pisa é de 2018, não tem relação com a gestão atual. Nem atribuiria ao [ex-presidente Michel] Temer, porque não deu tempo”, disse.

Há duas semanas, Weintraub também estimou que o Brasil ocuparia a lanterna da América Latina no Pisa 2018, o que não se confirmou. A nota brasileira de leitura no Pisa de 2018 foi de 413 pontos, acima das de Argentina (402), Peru (401), Panamá (377) e República Dominicana (340).

O Chile é o país da região com melhor desempenho. Em leitura, por exemplo, os estudantes chilenos obtiveram 452 pontos, o suficiente para garantir a 43ª posição, ainda assim inferior à média da OCDE, de 487 pontos.