Valor Econômico, v. 20, n. 4835 12/09/2019. Política, p. A12

Relatores da reforma divergiam sobre proposta

 Raphael Di Cunto
 Renan Truffi
 Marcelo Ribeiro


 

Horas antes do secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, ser demitido, e a recriação da CPMF ser descartada, Senado e Câmara demonstraram ter visões inteiramente divergentes sobre o tema. Propostas de reforma tributária tramitam nas duas casas do Congresso.

Enquanto o relator da reforma tributária na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) rechaçou a recriação da CPMF e disse que não há clima para aprovação, no Senado o tucano Roberto Rocha (MA), que relata outra proposta de PEC que reformula os tributos, apoiou o imposto como alternativa. Os dois participaram de debate na Confederação Nacional do Transporte (CNT).

Os deputados pressionam o governo a mandar sua própria proposta de emenda à Constituição, o que consolidaria a Câmara como a Casa original para a discussão do tema. Ao sinalizar que toparia discutir a CPMF, algo que a Câmara resiste, Roberto Rocha buscaria apoio para que o debate ocorra ao mesmo tempo nas duas Casas - e o Senado é muito mais ágil para votar PECs.

A proposta que tramita na Câmara foi apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), a partir de um estudo coordenado pelo economista Bernardo Appy. A do Senado, formalmente proposta pelo presidente da casa, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), é uma reedição do texto do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, que tramitou na legislatura passada.

Rocha disse que só conhece outra alternativa além da CPMF para desoneração da folha de pagamento das empresas de 20% para 10%, que é aumentar a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) - que seria criado pela reforma com a junção de impostos sobre consumo e serviços - em cerca de 3%. "É justo? Acho que não", disse. "Vai aumentar a carga tributária, sou contra."

Para ele, faltou tato político para vender a nova CPMF, quando o governo não deixou claro de início que o imposto seria recriado com o objetivo de desonerar a folha. "O governo muitas vezes bota mais calor do que luz. Se você precisa desonerar a folha, é uma substituição", afirmou.

O tucano disse ainda que conversou com as confederações nacionais da Indústria (CNI) e da Agropecuária (CNA) e que teve o apoio, "se não unânime, da maioria" dos integrantes dessas entidades e que, nos próximos cinco anos, a maioria dos países estará discutindo impostos eletrônicos como a CPMF. A CNI respondeu, em nota, que maioria dos filiados à entidade "tem muitas restrições" ao tema, mas que ainda não tomou decisão. A CNA não retornou.

Questionado depois pela imprensa, ele foi menos enfático, mas não descartou o apoio e rebateu que, se a CPMF tem efeito cumulativo, as contribuições sobre a folha também teriam. "Defendo a desoneração da folha e a CPMF é um caminho, mas não necessariamente o único", disse. "O que está em discussão é ouvir qual é a proposta mais razoável para criar empregos."

Aguinaldo Ribeiro, por outro lado, foi assertivo contra a proposta da equipe econômica do governo Bolsonaro. "Como relator, você abre mão de posições pessoais e constrói o relatório que tem condições de ser aprovado pela maioria e na Câmara não há clima para esse tipo de imposto", disse. "A CPMF é cumulativa, paga em cascata, é altamente regressiva", reforçou.

Ribeiro disse que estuda alternativas para desonerar a folha e que podem envolver tributação maior sobre a renda e patrimônio, mas que isso carece de mais estudos sobre se é a solução.

Apesar da declaração de Rocha, no Senado o sentimento também é de antipatia ao imposto. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), criticou a proposta e lembrou que, quando deputado, votou contra a prorrogação da CPMF. "Conseguimos tirar essa contribuição, entre aspas, da vida dos brasileiros. Lógico que estou escutando o governo falar sobre isso, e da minha parte quero reafirmar minha posição", disse.