Valor Econômico, v. 20, n. 4913, 07/01/2020. Política, p. A6

Enfraquecido, Terra pode perder Bolsa Família
Cristiano Zaia 


O ministro da Cidadania, Osmar Terra, tornou-se alvo de críticas de autoridades do Palácio do Planalto. A pasta nasceu com status de superministério e com um amplo campo de atuação. Mas começa 2020 mais esvaziada, num momento em que o presidente Jair Bolsonaro analisa a possibilidade de fazer mudanças pontuais no primeiro escalão.

Em um ano, Terra perdeu a Secretaria de Cultura para o Ministério do Turismo e no fim de 2019 deixou de comandar o “Pátria Voluntária”, programa social cujo conselho é presidido pela primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Segundo o Valor apurou, embora Bolsonaro não tenha tratado de forma concreta da substituição de Terra, não estão descartadas novas desidratações na pasta da Cidadania. Duas possibilidades citadas são a perda da Secretaria de Esporte ou o remanejamento do Bolsa Família, programa identificado com os governos petistas e que Bolsonaro quer reformular.

O decreto com a da mudança do Pátria Voluntária foi assinado pelo próprio Bolsonaro e publicado na edição do "Diário Oficial da União" de 31 de dezembro. O programa foi transferido para a Casa Civil, sob a gestão do ministro Onyx Lorenzoni. De acordo com fontes do Palácio do Planalto ouvidas pelo Valor, Michelle teria demonstrado desconforto em despachar numa sala na sede do Ministério da Cidadania. Agora, deve ter um local de trabalho no terceiro andar do Palácio do Planalto, o mesmo do gabinete do presidente da República.

A possibilidade de o ministro capitalizar politicamente a imagem da primeira-dama também não agrada à cúpula do governo. Terra é do MDB do Rio Grande do Sul, mesmo Estado do ministro da Casa Civil. Em 2022, Onyx Lorenzoni, que é filiado ao DEM, pode disputar o governo gaúcho. Além disso, recentemente a Câmara dos Deputados passou a disputar com o Executivo o protagonismo nas discussões sobre programas da área social.

Um assessor presidencial questiona resultados apresentados até agora pelo Ministério da Cidadania. A pasta herdou a estrutura do antigo Ministério do Desenvolvimento Social, que Osmar Terra também administrou na gestão do ex-presidente Michel Temer. No Palácio do Planalto, também existem reclamações sobre declarações do ministro em relação à liberação da maconha para fins medicinais pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

No fim de novembro, pouco antes de a agência reguladora aprovar a liberação da venda em farmácias de produtos à base de cannabis para uso medicinal no Brasil, o ministro chegou a dizer que o então presidente da Anvisa, William Dib, “não entende nada” sobre a discussão da liberação do uso medicinal da maconha e que a agência atuaria “em consonância com poderosos interesses”. Essa posição não é consensual no governo.

Se de fato o ministro Osmar Terra perder a gestão do Bolsa Família, quem pode sair ganhando é a ministra Damares Alves, que comanda a pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Ela foi recentemente bem avaliada em pesquisa Datafolha, e também recebe elogios do próprio presidente da República. A área de Esporte poderia ser remanejada para os ministérios de Turismo ou até mesmo Educação.

Procurado pelo Valor, Osmar Terra não quis comentar o assunto. Em seu balanço do ano, o Ministério da Cidadania destaca, por exemplo, o prêmio internacional conquistado pelo programa Criança Feliz - política voltada ao desenvolvimento infantil. A pasta também elenca o combate a irregularidades no Bolsa Família e o início de entregas da Estação Cidadania - espaço que integra, em um só local, diversos programas sociais.