Valor Econômico, v. 20, n. 4828 03/09/2019. Política, p. A8

Maia e ruralistas articulam agenda ambiental paralela

 Cristiano Zaia
 Marcelo Ribeiro


Diante da crise dos incêndios na Amazônia que ganhou contornos internacionais e atingiu o presidente Jair Bolsonaro, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a bancada ruralista traçaram uma agenda ambiental paralela ao governo para contrapor, no Congresso, as críticas da comunidade internacional ao aumento do desmatamento no país.

A ofensiva, já discutida em duas reuniões na residência oficial de Maia nas últimas semanas conta com a participação da ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Há uma insatisfação crescente de deputados e senadores ruralistas com a retórica ambiental do presidente e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. No ano passado, houve grande apoio da bancada e do setor agropecuário à eleição do atual presidente. Segundo um deputado do núcleo ruralista, "Bolsonaro tem que descer do palanque e o radicalismo é uma praga que está prejudicando o país", diz um deputado do núcleo ruralista.

A pauta inclui uma viagem à Europa, que integra os esforços dos ruralistas do agronegócio brasileiro - sobretudo os agroexportadores - de melhorar a imagem do setor no exterior e marcar posições na defesa do uso racional de agrotóxicos e da produção agropecuária com viés de preservação ambiental. Com paradas previstas na Alemanha, Inglaterra, França e Itália, a ideia é mostrar que o produtor rural brasileiro não é culpado pelas queimadas e pelo desmatamento ilegal na região amazônica.

Ao Valor, Maia afirmou que a viagem tem como objetivo emplacar a tese de que o Parlamento brasileiro tem compromisso com a preservação do meio ambiente. O parlamentar do DEM acredita que a viagem também servirá para enterrar as possibilidades de os parlamentos europeus atrasarem a análise do acordo entre o Mercosul e a União Europeia.

Durante a viagem, Maia e os ruralistas também pretendem falar sobre os contratos bilaterais firmados entre Brasil e o Reino Unido antes do plebiscito de 2016 que aprovou o "Brexit". Segundo fontes, há alguns contratos que precisam ser revistos para evitar prejuízo ao comércio exterior brasileiro após a saída do Reino Unido da União Europeia. O Brasil é superavitário em suas relações comerciais com o Reino Unido, segundo dados da balança comercial, divulgados pelo Ministério da Economia.

Hoje, em café da manhã na Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Maia, parlamentares da bancada do agronegócio e dirigentes da rede de federações da entidade voltarão a discutir projetos de lei que entendem dar uma resposta ao impasse ambiental. Entre eles, o que prevê o Pagamento por Serviço Ambientais (PSA) - que deve ter o requerimento de urgência aprovado no plenário da Câmara ainda nesta semana. Também deve entrar na lista o que agiliza e simplifica o licenciamento ambiental no país e o que trata de defensivos agrícolas.

Menos avançados, outros dois projetos também devem sair do papel nos próximos meses: um deles tem como objetivo tratar do desmatamento ilegal e da regulação fundiária e outro que endurece penas contra delitos ambientais.

"Não apenas somos contra desmatamento ilegal como defendemos mais fiscalização", afirma o deputado Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). "Estamos tentando destravar na Câmara uma agenda ambiental que consolide uma imagem de que o agronegócio é sustentável e preserva o meio ambiente. Sempre fomos muito tímidos em fazer esse contra-ataque. Mas dadas as circunstâncias, temos que mostrar que a responsabilidade ambiental e o nível tecnológico do setor são altos", destaca o deputado Evair de Melo (PP-ES), que é vice-presidente da FPA.

Relator do projeto de licenciamento ambiental, o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), trabalha em uma nova versão do texto. Ele afirmou que já está "com 70% do texto pronto", mas destaca que ainda não tem uma data certa para que o texto seja apreciado. Ele admite que a onda de queimadas e os dados de desmatamento "contaminaram o debate", o que pode, em sua avaliação, atrasar os planos de aprovação da proposta.