Valor Econômico, v. 20, n. 4849, 02/10/2019. Brasil, p. A5

Serra tenta PL que reformula critérios para cumprimento da “Regra de Ouro”

Edna Simão 


Um projeto de lei de autoria do senador José Serra (PSDB-SP) propõe a reformulação na regra de cálculo da chamada “regra de ouro” para que seu cumprimento seja factível não só do ponto de vista econômico como também político. A ideia é estabelecer que como regra que o déficit primário seja menor ou igual ao investimento, ou seja, na prática se retira da conta as despesas como a de juros.

A “regra de ouro” está prevista no artigo 167 da Constituição Federal e proíbe o governo de emitir dívida em valor superior às despesas de capital (principalmente investimentos) do exercício. Na prática, o governo não pode emitir dívida para pagar despesa corrente como aposentadorias e salários. O risco de descumprimento nos últimos anos está relacionado à queda nos investimentos, agravado pelo teto de gastos e pela sequência de elevados déficits primários desde 2014, que aumenta a necessidade de emissão de dívida pública para financiar os resultados negativos.

A proposta de Serra acabou sendo retirada da pauta de votação na Comissão de Assuntos Econômicos com a alegação de que já há uma iniciativa sobre o assunto em tramitação na Câmara. O deputado Pedro Paulo apresentou uma proposta de emenda constitucional (PEC) 438, que obriga os governos federal e estaduais a adotarem duras medidas para o cumprimento da chamada “regra de ouro” das finanças públicas.

Independentemente disso, a equipe técnica de Serra negocia com o governo para que a matéria seja apreciada. Na avaliação do especialista em contas públicas Leonardo Ribeiro, que é assessor do senador, se a equipe econômica apoiar formalmente a PEC, estará apostando em uma regra f

O entendimento é que o governo precisa endereçar medidas para viabilizar a redução dos gastos obrigatórios e não tentar forçar sua queda por meio de gatilhos estabelecidos para cumprimento da regra de ouro.

“Impossível do ponto de vista político apostar em gatilhos para a regra de ouro. Isso é inexequível, vai gerar um problema. Não vai conseguir cumprir, sem recorrer a contabilidade criativa”, frisou, referindo-se ao fato que os entes públicos pensaram de alguma forma iniciativas para fugir dos gatilhos.

Para o assessor, é preciso resolver o rombo de R$ 367 bilhões, em 2020, para o cumprimento da “regra de ouro”. Ele destacou que, segundo nota da consultoria jurídica do Senado, não haveria necessidade de aprovação de uma PEC para regulamentar a regra.

Ribeiro explicou que a equipe de Serra já apresentou a proposta ao governo e disse acreditar que a reformulação da “regra de ouro” poderia ser trabalhada em conjunto com a PEC da Câmara porque os projetos do Senado e da Câmara não se chocam.

“O projeto de Serra estabelece a metodologia da operação da ‘regra de ouro’, trazendo-a para o mundo das contas primárias”, ressaltou o assessor.

Para garantir o cumprimento da “regra de ouro” deste ano, o Orçamento aprovado previa a necessidade de aprovação de decreto de crédito suplementar no valor de R$ 248,9 bilhões para pagamento de despesas obrigatórias, entre as quais o Bolsa família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Como não houve uma revisão dos critérios para cumprimento da “regra de ouro”, o mesmo expediente foi utilizado na proposta de Orçamento de 2020, encaminhada no fim de agosto ao Congresso Nacional. Desta vez, a equipe econômica vinculou o pagamento de R$ 367,031 bilhões de despesas obrigatórias a aprovação e crédito suplementar.