Valor Econômico, v. 20, n. 4888, 27/11/2019. Política, p. A11

Toffoli e Maia criticam fala e presidente silencia

Raphael Di Cunto
Matheus Schuch


Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, criticaram o ministro da Economia, Paulo Guedes, por dizer que não era para ninguém se assustar “se alguém pedir [novo] AI-5” por causa das convocações da esquerda para protestos de rua contra o governo, a exemplo do que ocorre na Bolívia e Chile.

O presidente Jair Bolsonaro não quis comentar a declaração do ministro, mas reforçou que Guedes é responsável pela área econômica. “Eu falo de AI-38. Quer falar de AI-38? Eu falo agora contigo aqui. Aí está o meu número, pô! Meu número”, afirmou Bolsonaro, em referência ao número de seu futuro partido, o Aliança pelo Brasil, que adotará o número 38 nas urnas.

No mês passado, quando um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), falou na possibilidade de adotar um regime de exceção contra a esquerda, o presidente refutou a ideia e criticou a declaração publicamente. Adotado em 1968, durante a ditadura militar, o Ato Institucional número 5 (AI-5) causou um endurecimento do regime, com fechamento do Congresso, cassação de parlamentares, aumento da censura e repressão contra adversários.

Em viagem aos Estados Unidos, Guedes explicou que o governo considera adiar as reformas tributária e administrativa para o ano que vem por causa dos protestos e citou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estava convocando a população as ruas, o que seria uma irresponsabilidade e que depois “o filho do presidente fala em AI-5, aí todo mundo assusta".

“Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo para quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem, então, se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez?”, questionou o ministro, durante entrevista à imprensa em Washington.

Para o presidente da Câmara, Lula está errado em convocar manifestações e radicalizar o clima político do país, mas que isso não dá direito ao governo insinuar a adoção de um AI-5 contra os protestos e que esse tipo de declaração que gera insegurança na população e nos investidores sobre as intenções do governo.

Para o presidente da Câmara, Lula está errado em convocar manifestações e radicalizar o clima político do país, mas que isso não dá direito ao governo insinuar a adoção de um AI-5 contra os protestos e que esse tipo de declaração que gera insegurança na população e nos investidores sobre as intenções do governo.

Maia afirmou ontem que falar em fechar instituições democráticas só por causa de manifestações de rua “não faz sentido”. “Você está usando argumento que não faz sentido do ponto de vista do discurso, e como não faz sentido, você acaba gerando insegurança em todos nós sobre qual é o intuito por trás da ação, de forma recorrente, desta palavra [AI-5]", disse. Para ele, a forma de combater a insatisfação das ruas é fazer as reformas econômicas e o país crescer mais.

A declaração de Guedes também foi condenada por Toffoli que, em nota, disse que o AI-5 é “incompatível” com a democracia. “Não se constrói o futuro com experiências fracassadas do passado”, disse o presidente do STF, que não se manifestou sobre a declaração de Eduardo Bolsonaro na época. O filho do presidente teve dois processos de cassação instaurados ontem no Conselho de Ética da Câmara pela fala. Ele pediu desculpas pela declaração, mas diz que, como deputado, não pode ser punido por suas opiniões.