Correio Braziliense, n. 21717, 01/08/2022. Política, p. 2

“Auxílio de R$ 600 deve-se ao Congresso”

Entrevista: Soraya Thronicke


Candidata à Presidência pelo União Brasil, a senadora Soraya Thronicke disse acreditar que “tudo é possível” em relação às suas chances de avançar ao segundo turno das eleições. Nas últimas pesquisas, ela aparece sem pontuar, mas argumenta que, em 2018, na corrida ao Senado, só surgiu nas consultas na última semana. “E eu estava em quinto lugar. No domingo, estava eleita”, frisou.

A parlamentar, que ganhou destaque nacional pelo bom desempenho no debate de presidenciáveis, no domingo, na Band, disse que, se eleita, continuará com a “política assistencialista”. “Quero, também, deixar claro que as pessoas que estão recebendo auxílio emergencial de R$ 600, hoje, devem isso ao Congresso Nacional. Se fosse pela proposta do governo federal, estariam recebendo R$ 200”, enfatizou, em entrevista ao programa CB.Poder, parceria entre o Correio e a TV Brasília.

A presidenciável afirmou que continua com as mesmas bandeiras com as quais foi eleita senadora pelo PSL, de combate à corrupção e defesa do liberalismo econômico, e acusou o presidente Jair Bolsonaro, que era do mesmo partido dela, de ter abandonado essas pautas.

Thronicke frisou não ver problemas nas emendas de relator e, sim, em quem faz mau uso delas, e criticou o termo orçamento secreto. “Não dá para você apelidar a emenda de relator, que foi criada para uma questão nobre, de orçamento secreto. Tive a oportunidade, por conta do meu trabalho de incidência, sim, de emendas de todos esses tipos, como todos os candidatos. Só que as minhas são transparentes, aí está a diferença”.

 

A proposta do imposto único, que está no seu programa de governo, gera muita discussão entre os economistas. Vai ser um único imposto mesmo? O que acontece com as contribuições que, hoje, são exclusivas da União, como Cofins, CSLL e Cide?

A reforma tributária é a mãe de todas as reformas. O que nós queremos trazer, primeiro de tudo, é a consciência às pessoas de que precisamos arrumar a casa na questão da economia. Se a economia vai bem, tudo consegue ir bem. Então, por isso, trazemos a reforma tributária e a proposta do imposto único federal como nosso mote primordial de campanha.

 

Mas já vai direto para o imposto único ou dá um passo antes, reduzindo o número de tributos?

Esse é um estudo já antigo. Essa proposta vem sendo estudada há 30 anos pelo meu vice, o professor Marcos Cintra, uma pessoa brilhante, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas), com 17 anos de Harvard. Não é qualquer pessoa. A ideia inicial é a universalidade de todos os impostos, mas temos de respeitar o pacto federativo. Então, ao longo desses 30 anos, ajustes foram feitos na proposta. E de que forma vamos começar? Excluindo 11 tributos federais e substituindo por um imposto só, a ser cobrado no depósito e no saque. Essa movimentação financeira é a forma mais rápida de a gente controlar, evitando sonegação e lavagem de dinheiro. E é digital, não analógica. Bem especificamente, está fora, neste momento, o Imposto de Renda. Existe o projeto de, posteriormente, incluir o IR e o imposto de importação e exportação. Dentro dessa proposta econômica nossa, iremos, também, isentar o IR e INSS de quem recebe até cinco salários mínimos, ou seja, quem ganha até R$ 6.060. Com isso, a gente consegue reaquecer a economia, liberar o empresariado da carga da contribuição previdenciária, sem tirar os direitos previdenciários. O Imposto Único Federal consegue bancar toda a nossa Previdência. Vamos tirar a contribuição dos ombros de quem ganha até cinco salários mínimos, mas, na verdade, tirar de todos. O INSS, todos os contribuintes deixarão de pagar, mas continuarão com o benefício, por meio do Imposto Único Federal. E por que ele consegue fazer tudo isso? Porque aumenta a cadeia de arrecadação.

 

A senhora vai continuar com o Auxílio Brasil, ou não tem como financiá-lo no primeiro momento?

A próxima presidente da República toma posse em 1º de janeiro de 2023, e não é por causa da virada da meia-noite do réveillon que as pessoas vão parar de sentir fome e revirar lixo neste país para buscar o que comer. Isso não muda com a virada do ano, então, não tem como mudar a política de forma nenhuma, essa política assistencialista. Eu sou liberal na economia e entendo que foi necessário flexibilizar, porque as pessoas estão passando fome e isso me preocupa demasiadamente. Quero, também, deixar claro que as pessoas que estão recebendo auxílio emergencial de R$ 600, hoje, devem isso ao Congresso Nacional. Se fosse pela proposta do governo federal, estariam recebendo R$ 200. O nosso compromisso com a população é em nível máximo.

 

A senhora foi eleita pelo PSL, então partido de Bolsonaro. Agora, virou uma opositora dele. Em um segundo turno que mantenha a polarização, apoia o presidente ou o PT?

Fui eleita erguendo as bandeiras do combate à corrupção e do mercado liberal, focado na economia deste país, na prosperidade das pessoas. Naquele momento, Jair Bolsonaro, também. Fui eleita em um momento anti-PT e contrário àquele esquema de corrupção, com o sistema econômico muito retrógrado. Fui eleita com essas bandeiras dentro do PSL. Continuo com as mesmas bandeiras: de combate à corrupção, de liberalismo econômico, liberdade, respeito às instituições, respeito a todos os brasileiros. Continuo no partido, que hoje é o União Brasil, o maior deste país. Então, não fui eu que abandonei as bandeiras.

 

Acredita nas pesquisas, ou tudo pode mudar?

Em 2018, eu só fui aparecer nas pesquisas na última semana. Três ou quatro dias antes da eleição. E eu estava em quinto lugar para o Senado. No domingo, eu estava eleita. Acredito, sim, mas a pesquisa é a foto do dia, você tem de entender o filme, e muitos brasileiros, neste momento, estão procurando sobreviver. Ando nas ruas e converso com as pessoas. Pessoas que não têm dinheiro para comprar gasolina para ir a uma motociata, por exemplo. O que eu vejo é que elas sequer sabem quem são todos os candidatos, muitas não me conhecem mesmo. Chego e pergunto: você já tem candidato para a Presidência da República? A maioria fala que não. Pergunto: você conhece todos os candidatos? Respondem que não, ou seja, elas não têm sequer tempo para isso. Como eu também sequer vejo que tenho tempo para ficar em discussões ideológicas — estou interessada naquilo que interessa para o país —, o que posso e que aceito no segundo turno é conversar com todos que queiram contribuir com a parte boa de cada partido, porque eu não gosto de generalizar absolutamente ninguém.

 

Como avalia o orçamento secreto? Esta semana, saiu notícia de que a senhora apresentou emendas ao seu estado que somam quase R$ 95 milhões.

O trabalho do parlamentar é legislar e fiscalizar e, sim, buscar todos os recursos possíveis para o seu estado. O problema não é o tipo dessa emenda, só as pessoas que operam essas emendas. Então, a gente não pode generalizar nunca. Se alguém faz mau uso da  emenda individual ou da emenda de comissão ou da bancada, é secreto. Não dá para você apelidar a emenda de relator, que foi criada para uma questão nobre, de orçamento secreto. Tive a oportunidade, por conta do meu trabalho de incidência, sim, de emendas de todos esses tipos, como todos os candidatos. Só que as minhas são transparente, aí está a diferença.

 

Tem acompanhado o dinheiro destinado ao Mato Grosso do Sul?

Destinei para todos os municípios, sem olhar se o prefeito é meu amiguinho, ou não; se é do meu partido, ou não. Fui eleita sem nenhum prefeito, meu critério foi o povo, a necessidade de cada local. Por isso, tenho emendas em todos os municípios, e deixo aqui a dificuldade de acompanhar. Por isso, faço o seguinte: toda vez que eu consigo uma emenda para determinado município, faço um vídeo e falo: olha, município tal, estou enviando emenda de R$ 500 mil para a saúde.

 

Por que é difícil acompanhar?

Porque as prefeituras não têm portal da transparência, como deveriam. Isso tem de ser cobrado delas, do Poder Executivo. É difícil acompanhar, também, porque tem dois critérios: emenda de custeio e emenda de investimento. E investimento demora mais para ser executada. Presido a frente parlamentar da transparência no gasto público.

 

O que tira dessa frente para levar a seu programa de governo?

Sou completamente favorável à transparência. Quando cheguei ao Senado, fiquei chocada com a dificuldade que a gente tem de monitorar toda essa questão de orçamento e de fiscalizar. Aí, nós formamos a Frente Parlamentar da Transparência da Gestão dos Gastos Públicos. E um dos meus projetos de lei é o 155/2020, que está com dificuldade de caminhar lá no Congresso. Visa acompanhar a transparência na execução, porque a gente fala em transparência posterior, e, depois que termina uma obra, presta contas. Nós queremos saber como é que essa obra está sendo executada.

 

Ou seja, antes de haver qualquer confusão, já vai ver como está se dando a obra. Se não tiver a contento, pode suspender, é isso?

Isso. É ver antes de o leite derramar. Essa é a questão. Queria também aproveitar para falar que, ontem (terça-feira), fui vítima de fake news, falando de indicação de orçamento secreto. Fui logo para as redes sociais dizer que isso é uma mentira. Fui uma das primeiras parlamentares a enviar o documento que a ministra Rosa Weber (do Supremo Tribunal Federal) pediu para a Casa, indicando cada centavo que indiquei de recurso para o meu estado, para qual município, referente a qual pasta e também qual é o convênio e projeto. Então, de “secreto” não tem nada.

 

Por falar em pesquisas, no debate da Band, parecia que havia uma espécie de dobradinha entre a senhora e a senadora Simone Tebet, duas parlamentares de Mato Grosso do Sul. O que promete de diferente para as mulheres nesta eleição?

A minha dobradinha é com o que está certo. Meu compromisso é com o que é justo e o que é correto. Poderia acontecer qualquer coisa naquele debate. Se fosse uma injustiça com o candidato do meu lado direito, com o candidato do meu lado esquerdo, eu ia levantar. Essa é a minha forma de agir. Injustiça com qualquer pessoa, não é porque era mulher.

 

Em um segundo turno, apoiaria Bolsonaro, ou há alguma chance de aproximação com o PT?

Aceito o apoio de Bolsonaro no segundo turno. Não trabalho com outra hipótese, porque, se eu focar lá na frente, não vou conseguir trabalhar. Sou uma brasileira idealista, otimista e tenho um projeto para oferecer às pessoas. Acredito em Deus, acredito que tudo é possível. Estou aqui, acredito, por um propósito e vou focar nisso.

 

Qual é o projeto específico que tem para as mulheres?

Há alguns projetos muito importantes. Nós sabemos da violência doméstica e da necessidade que elas têm de se defender. Um dos meus projetos é de armas não-letais para as mulheres. Moro na divisa do Mato Grosso do Sul com o Paraguai, e é interessante como a gente consegue comprar facilmente um spray de pimenta, aqueles jatos de espuma, arma de eletrochoque. Tenho projeto de lei relacionado a isso, que também estou trabalhando firme para que a gente consiga avançar, mas as pessoas parecem que querem só armas letais.

 * Estagiários sob a supervisão de Cida Barbosa

 O entrevistado de amanhã do CB.Poder é o presidenciável do Novo, Felipe D’Avila

 

Leia em: https://flip.correiobraziliense.com.br/edicao/impressa/3675/01-09-2022.html?all=1