Valor Econômico, v.20, n. 4930, 30/01/2020. Política p.A10

 

Mentor da Lei de Abuso de Autoridade, Renan aposta em candidato do MP


Alfredo Gaspar, atual procurador-geral de Justiça, pode disputar Prefeitura de Maceió

Raphael Di Cunto

Mentor da Lei de Abuso de Autoridade e crítico da operação Lava-Jato, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e seu filho, o governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), apostam agora na candidatura de um procurador do Ministério Público estadual para vencer a eleição para a Prefeitura de Maceió e assim pavimentar o caminho para manter seu grupo no comando do governo local.

Alfredo Gaspar, atual procurador-geral de Justiça do Ministério Público de Alagoas, ensaia concorrer e virou a aposta do clã para vencer a eleição na capital, que esteve sempre alinhada com candidatos de oposição a eles. A aliados, o governador diz apostar que ele venceria já no primeiro turno, mas procura desvincular isso de uma onda “pró Lava-Jato”.

Na avaliação do MDB, o principal trunfo do procurador é a fama de linha-dura e a redução da criminalidade no Estado, que já chegou a ser o mais perigoso do país. A capital Maceió, que em 2007 tinha 92,4 homicídios a cada 100 mil habitantes, alcançou seu menor índice de assassinatos durante a gestão de Gaspar como Secretário de Segurança Pública. Em 2015, foram 56,7 mortos a cada 100 mil moradores, queda de 23% em relação ao ano anterior.

Gaspar, contudo, durou pouco no cargo porque o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que procuradores e promotores deveriam renunciar ao MP para integrar órgãos do Executivo. Ele deixou a Pasta em março de 2016, quando ocorreu a mínima histórica de homicídios na capital, e foi eleito para chefiar o MP local. No ano seguinte, os assassinatos voltaram a crescer.

A fama no combate a criminalidade lhe rendeu prestígio, mas é justamente a exigência de abandonar o MP o principal entrave para que ele se lance de vez na vida pública. O procurador fez movimentos para concorrer ao Senado em 2018, mas desistiu em cima da hora - recuo que favoreceu a reeleição de Renan Calheiros. Agora, já gravou vídeo de fim de ano para as redes sociais e deu entrevistas defendendo que só a política tem a capacidade de transformar a vida das pessoas e se dizendo tentado a contribuir de outra forma com a sociedade.

Adversários também já preparam o arsenal para ataca-lo e dizem que todas as investigações de escândalos no governo partiram da Polícia Federal, enquanto o MP local, chefiado por ele, “blindou” os Calheiros. Ao Valor, Gaspar disse que “não tergiversar no cumprimento da função” e enviou por mensagem uma série de reportagens que mostram ações do MP contra o governo.

Ele está de férias em janeiro e pretende bater o martelo em fevereiro. Por ora, nega a candidatura e afirmou que são apenas “ especulações”. As pesquisas eleitorais feitas no ano passado mostram ele em uma posição intermediária, atrás de adversários como o deputado federal JHC (PSB), que já concorreu duas vezes a prefeito, e do deputado estadual Davi Davino Filho (PP), mas a frente de nomes tradicionais da política local.

Outro impasse é se ele será mesmo candidato pelo MDB. Adversário dos Calheiros, o prefeito Rui Palmeira (PSDB) não pode mais concorrer e abriu conversas para que ele concorra pelo Podemos. A vantagem dessa aliança seria desvincular o procurador de Renan, alvo de investigações na Lava-Jato e em outros casos de corrupção. Cortar essa relação, contudo, não será fácil, já que, além de ter sido secretário do atual governador, o procurador teve um filho nomeado para cargo no governo recentemente.

Procurados, o governador e o senador disseram que a eleição está distante e não quiseram comentar. No grupo político deles, outros aliados tentam se viabilizar apostando na desistência do procurador, como o ex-ministro de Infraestrutura e atual secretário estadual na mesma área, Maurício Quintella (PL), e o deputado federal Marx Beltrão (PSD). O presidente Jair Bolsonaro, que perdeu a eleição no Estado, deve ter como candidato o deputado estadual cabo Bebeto (PSL), caso consiga fundar seu partido a tempo de disputar a eleição municipal.