Valor Econômico, v. 20, n. 4810, 08/08/2019. Política, p. A14

Fux assume como voz do STF na defesa de Dodge

 Luísa Martins
Mariana Muniz
Isadora Peron



Futuro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), com posse prevista para setembro do ano que vem, o ministro Luiz Fux assumiu a articulação da Corte junto ao governo federal para tentar reconduzir a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para mais um biênio no cargo. Seu primeiro mandato se encerra em 17 de setembro e o presidente Jair Bolsonaro pretende anunciar o sucessor até segunda-feira.

Com a anuência dos demais colegas do tribunal, Fux assumiu protagonismo ao se tornar uma espécie de "mensageiro" do Supremo na defesa de Dodge. O próprio presidente do STF, ministro Dias Toffoli, delegou a seu vice a competência de defendê-la perante Bolsonaro - uma vez que, caso ele próprio encabeçasse a empreitada, poderia soar como uma pressão do Poder Judiciário sobre o Poder Executivo.

Na quarta-feira, ao reunir-se com o presidente Jair Bolsonaro, Fux teria demonstrado que a Corte tem restrições ao nome do subprocurador Augusto Aras, um dos candidatos mais cotados pelo Palácio do Planalto para assumir a PGR. Crítico ferrenho da lista tríplice (à qual, assim como Dodge, não concorreu), Aras já se encontrou com o presidente pelo menos quatro vezes, sempre fora das agendas oficiais.

O subprocurador tem defendido um "novo modelo" para a PGR, menos garantista e engessado. As mudanças, embora alinhadas a uma corrente do governo, não são bem vistas por muitos colegas do Ministério Público, nem por integrantes do STF, conforme relataram ao Valor auxiliares de membros da Corte.

De acordo com essas fontes, Fux fez questão de dizer a Bolsonaro que, apesar de a lista tríplice ser uma tradição seguida desde 2003, é dele a discricionariedade para escolher o novo PGR. Mas ponderou que, caso o presidente queira levar em conta a avaliação do Supremo, Dodge seria o melhor nome para o cargo.

Ministros da Corte têm dado declarações públicas favoráveis à recondução. Na terça-feira, o ministro Marco Aurélio Mello elogiou publicamente pela primeira vez a atuação da chefe do Ministério Público Federal (MPF).

Na avaliação de Marco Aurélio, Dodge "tem fortes trunfos e fortes apoios" dentro da Corte - uma referência a Toffoli e Fux. "Ela tem meu aplauso pelo cumprimento desses dois anos", afirmou o ministro. Para ele, seu período à frente da PGR foi "profícuo em termos de saneamento da Casa [Ministério Público] e também de atuação junto ao Supremo Tribunal Federal".

Marco Aurélio lembrou que a lista tríplice não tem caráter vinculativo. "Cabe ao presidente definir a escolha dele. Ele não está preso a nenhuma lista, ao contrário do que ocorre em relação aos Ministérios Públicos Estaduais", completou o ministro.

Em meio aos recentes episódios envolvendo a divulgação de mensagens atribuídas a procuradores da força-tarefa da Lava-Jato, o ministro Gilmar Mendes disse não acreditar que a recondução de Dodge fique contaminada pelas revelações, em mais um aceno favorável ao seu nome.

Nos bastidores do Planalto, o entendimento é o de que Bolsonaro se incomoda com a relação de proximidade entre a atual procuradora-geral e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Também desagradou o governo o fato de Dodge ter votado contra a indicação do procurador bolsonarista Ailton Benedito para integrar a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.

Em razão disso, interlocutores afirmam haver uma chance de que o presidente decida não escolher nem Aras - para não se indispor com o Supremo -, nem Dodge, vindo a surpreender no anúncio de sua opção.

Nas últimas semanas, outros candidatos têm chegado ao radar do presidente. Pelos corredores do Planalto, voltou a circular o nome do subprocurador Mario Bonsaglia, primeiro colocado da lista tríplice. De perfil discreto, este ainda não falou pessoalmente com Bolsonaro, mas ambos já costuram uma reunião. Bonsaglia será recebido hoje por Toffoli - com quem já esteve reunido no início de julho.