Valor Econômico, v.20, n. 4928, 28/01/2020. Brasil p.A4

 

Orçamento impositivo desafia os técnicos da área econômica

 

Edna Simão

 

Os técnicos da equipe econômica batem cabeça para chegar a um consenso sobre como aplicar algumas das regras estabelecidas no orçamento impositivo, que começou a valer neste ano. Existem dúvidas sobre como elencar o que deve ser cortado de gastos, em caso de contingenciamento de recursos, já que todo o orçamento é impositivo. Ou ainda, no caso da liberação dos cortes, quem deverá ser atendido primeiro.

A avaliação é de que o governo terá menos flexibilidade para remanejar recursos pois passará a ter limites para o remanejamento sem aval parlamentar. Além disso, as emendas impositivas (individuais e de bancada), que somam R$ 15,4 bilhões em 2020, retiram ainda mais a margem de manobra do governo nas chamadas discricionárias (aquelas sobre as quais o governo tem maior controle). A situação é ainda pior para o Executivo com a criação das emendas do relator.

Para os técnicos, o orçamento impositivo acaba com a possibilidade de se fazer reserva de recursos para ajustar as dotações ao longo dos meses. Outra crítica: cortes do Executivo têm de ser lineares.

A ideia do governo é fechar entendimento sobre esses pontos até o fim de fevereiro para que a equipe econômica possa divulgar em março o relatório de receitas e despesas primárias, que apontará a necessidade ou não de contingenciamento para cumprimento da meta de resultado primário, de déficit de R$ 124 bilhões.

Uma nota técnica vai ser divulgada para uniformizar o entendimento. O objetivo é garantir segurança jurídica para que não sejam questionados no futuro. “É um momento conflituoso e incerto. Os técnicos têm receio da forma de interpretação”, destacou uma fonte. Um dos desafios é adequar o adicional de R$ 6 no salário mínimo neste ano - cujo valor passou de R$ 1.039 para R$ 1.045. O impacto nas despesas será de R$ 2,13 bilhões. A incorporação do aumento de gasto terá que ser compensada com a redução de outra despesa.

Os técnicos reforçam que a aprovação do orçamento impositivo reduziu a flexibilidade do governo em fazer remanejamento de recursos, aumentando a rigidez orçamentária. Por exemplo, antes, como a peça orçamentária era autorizativa, o governo poderia fazer por decreto remanejamento de dinheiro para atender, por exemplo, um projeto prioritário ou para destinar para um novo projeto.

Agora, por exemplo, há limites - que são variáveis dependendo do tipo da despesa - para esse tipo de remanejamento. Caso o limite seja ultrapassado, o Executivo precisará de aprovação dos parlamentares. Um técnico de orçamento do Congresso Nacional destacou que neste ano, com receitas discricionárias de R$ 89,664 bilhões, um dos patamares mais baixos da história, o Executivo terá que enviar neste ano ao Congresso pedido elevado de crédito suplementar e justificar o cancelamento da despesas para conseguir remanejar os recursos orçamentários para áreas consideradas prioritárias.

Por outro lado, técnicos do governo acreditam que a mudança de um orçamento autorizativo para um impositivo deve exigir no médio e longo prazos do governo um planejamento melhor de suas prioridades. Isso porque projetos encaminhados de última hora teriam que ser aprovados pelo Congresso e a chance de ser bem-sucedido em cenário de restrição fiscal é muito pequena. Esse, no entanto, é um ponto considerado positivo.