Valor Econômico, v. 20, n. 4886, 23/11/2019. Brasil, p. A7

Governo muda planos para ter nova Lei de Informática

Daniel Rittner
Raphael Di Cunto


O governo e a Câmara dos Deputados avançaram em um acordo e tentarão votar, nesta semana ou na próxima, uma reforma na Lei de Informática - necessária para atender às exigências da Organização Mundial do Comércio (OMC). O tempo está acabando: o Brasil precisa mudar o sistema de incentivos até a virada do ano para evitar retaliações comerciais da União Europeia e do Japão.

A estratégia política do governo Jair Bolsonaro mudou. Em vez de uma medida provisória, como vinha sendo cogitado, a preferência agora do Palácio do Planalto é aproveitar um projeto de lei de autoria do deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP) e outros três parlamentares. O PL 4.805/19 já teve requerimento de urgência aprovado e pode ser votado diretamente em plenário.

Segundo análise do Planalto, a versão atual do projeto não adequaria integralmente a Lei de Informática às exigências da OMC. Por isso, a ideia é apresentar um texto substitutivo finalizado pelo governo após meses de intensas discussões na Esplanada dos Ministérios. As divergências elevaram o risco de estouro do prazo fixado pelo xerife internacional do comércio, que condenou inicialmente o Brasil em 2016.

Na reta final dos debates do governo com os deputados e o setor, a equipe econômica cedeu em dois pontos. Primeiro: as empresas poderão ser contempladas com os benefícios da nova legislação mesmo declarando Imposto de Renda por lucro presumido. Originalmente, a ideia era limitar os incentivos a quem declara IRPJ pelo lucro real. Isso deixaria de fora de 60 a 70 companhias de pequeno e médio porte.

Segundo ponto: ao contrário do que chegou a cogitar o Ministério da Economia, os incentivos da Lei de Informática após sua reforma vão valer indistintamente para empresas que já gozam dos benefícios e para quem quiser aderir a esse regime tributário. A intenção inicial de auxiliares do ministro Paulo Guedes era fechar as portas para novos entrantes. No entanto, a jurisprudência dos tribunais superiores indica que essa diferenciação poderia não se sustentar.

Resta uma indefinição: hoje o incentivo fiscal, condenado pela OMC, é gerado quase que instantaneamente, com a emissão da nota fiscal pela empresa contemplada. Pelo projeto de lei, a empresa receberia um crédito tributário por investimentos em pequisa, desenvolvimento e inovação, que seria usado para abater outros impostos devidos. A divergência é o período de apuração: mensal, como defendem as indústrias do setor e os deputados autores do projeto, ou anual, como pretende a Receita Federal.

Segundo o deputado Ubiratan Sanderson (PSL-RS), vice-líder do governo na Câmara, o Fisco quer garantir que os impostos foram realmente pagos antes de permitir o abatimento, por isso a apuração anual. “Tem que ser impostos líquidos e certos”, sustentou.

Esse seria agora o único desentendimento a travar a votação esta semana, mas a intenção é fechar um acordo em reunião amanhã entre representantes do governo, empresários e os deputados. “O governo não tem interesse em diminuir a indústria de tecnologia, que gera milhares de empregos, isso seria horrível. ”

O deputado Vitor Lippi (PSDB-SP), um dos autores do projeto, reforça a expectativa de selar um acordo que viabilize a aprovação do projeto esta semana, a tempo de envia-lo para análise do Senado até o recesso, que começa em quatro semanas. O texto final, destacou, deve ser votado por acordo em plenário e sem emendas que aumentem o rombo nas contas governamentais. “Fizemos um pacto de que não haverá nenhuma mudança que cause prejuízo fiscal. ”

A Lei de Informática tem vigência até 2029 e concede incentivos para fabricantes de computadores, celulares, tablets e outros equipamentos de tecnologia. Hoje eles têm desconto de 80% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) quando cumprem requisitos para fazer investimentos em pesquisa e desenvolvimento. A renúncia fiscal tem sido de R$ 6 bilhões anuais.

Mesmo se o projeto for aprovado na Câmara e no Senado neste ano, a reforma na Lei da Informática não entrará em vigor no dia 1º de janeiro, como havia determinado a OMC. Tudo por causa do prazo de 90 dias (noventena) necessários para mudanças em questões tributárias. A convicção da diplomacia brasileira, porém, é que a UE e o Japão - responsáveis pelo processo em Genebra - não vão criar caso por um estouro tão pequeno e querem, acima de tudo, uma sinalização clara.