Valor Econômico, v. 20, n. 4807, 03/08/2019. Política, p. A6

Procuradores discutiram saída de Dallagnol

André Guilherme Vieira



Em meio ao agravamento da crise provocada pela divulgação de mensagens trocadas pelo aplicativo Telegrama, integrantes do Ministério Público Federal (MPF) abordaram com o procurador da República Deltan Dallagnol a possibilidade de o coordenador da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Curitiba se afastar provisoriamente da equipe.

A ideia surgiu como uma forma de minimizar os prejuízos causados à imagem da força-tarefa de Curitiba desde que o site 'The Intercept Brasil' começou a questionar, em junho, a conduta ética de Dallagnol e os limites de sua atuação como procurador, com a divulgação de conversas mantidas por ele com o atual ministro da Justiça, Sergio Moro, e integrantes da força-tarefa. Uma eventual saída de Dallagnol ao menos diminuiria os holofotes negativos lançados sobre a força-tarefa paranaense.

Por outro lado, o desligamento poderia se traduzir em uma 'confissão de culpa' aos olhos da opinião pública, gerando eventuais questionamentos sobre a necessidade de manutenção da força-tarefa. Além disso, a hipótese de afastamento voluntário de Dallagnol enviaria um sinal trocado, dando margem a interpretações de que a equipe de procuradores está fraturada. Prevaleceu esse entendimento.

Nos últimos dias, investigadores reiteraram a jornalistas, de forma reservada, que não existem divergências sobre o tema dentro da força-tarefa do MPF, e garantiram que o apoio a Dallagnol é unânime.

Foi a revelação de que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) articulam medida com o propósito de afastar Dallagnol da Lava-Jato do Paraná o fator a unificar o grupo de investigadores de Curitiba em torno do coordenador da equipe.

Em termos práticos, procurador da República não pode ser apeado de sua atribuição, salvo por ordem judicial, decisão colegiada do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) ou por julgamento de procedimento disciplinar pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável por fiscalizar administrativa, financeira e disciplinarmente o Ministério Público.

A Constituição prevê garantias à atuação dos membros do MPF, como o princípio do promotor natural (Dallagnol já estava lotado em Curitiba quando a força-tarefa foi criada, em 2014), a independência funcional e a inamovibilidade - prerrogativa concedida a procuradores, promotores e magistrados que assegura que eles não serão removidos de seus ofícios, exceto na hipótese de "relevante interesse público".

A força-tarefa de Curitiba foi constituída pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em abril de 2014, para ampliar as investigações que, na época, se voltavam à apuração da origem de R$ 10 bilhões movimentados ilicitamente por Alberto Youssef e outros três doleiros.

Com os desdobramentos das investigações e a determinação do STF de que a competência de atuação dos procuradores está circunscrita à Petrobras e suas subsidiárias, o prazo de duração do grupo - que começou com 6 integrantes - tem sido ampliado desde então. Hoje, 15 investigadores compõem a força-tarefa no MPF em Curitiba.

A última prorrogação ocorreu em 2018 e está prestes a expirar. No ano passado, a atual procuradora-geral, Raquel Dodge, estendeu a manutenção da estrutura de investigação até o dia 9 de setembro de 2019. Raquel concorre à recondução ao cargo por fora da lista tríplice elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e que pode, ou não, ser acatada pelo presidente Jair Bolsonaro.

Na quinta-feira, o ministro Luiz Fux atendeu a pedido do PDT e determinou o envio ao STF do material apreendido pela Polícia Federal (PF) com o suspeito de hackear o celular do ministro da Justiça, Sergio Moro.

Horas depois, também na quinta-feira, outro ministro do STF, Alexandre de Moraes, requisitou cópia integral de todo o inquérito da Operação Spoofing da PF, incluindo as mensagens que foram entregues pelo principal investigado, Walter Delgatti Neto.

Moraes é o relator de inquérito que tramita no STF sob alegada necessidade de apurar 'fake news' e ameaças contra ministros da Corte e seus familiares. A investigação foi aberta de ofício pelo presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, no dia 14 de março.

Com acesso à íntegra das mensagens interceptadas por Delgatti via aplicativo Telegrama, Moraes, e eventualmente os demais ministros da Corte, tomarão conhecimento de todo o conteúdo de mensagens trocadas por Dallagnol.

O Valor procurou a assessoria de imprensa do MPF em Curitiba e perguntou se a saída de Dallagnol foi tratada em conversas informais dele com outros integrantes da equipe.

Em nota, a resposta foi que "não há conversa alguma sobre isso na força-tarefa".