O Globo, n. 32629, 07/12/2022. Economia, p. 13

PEC avança com R$ 168 bi

Fernanada Trisotto
Natália Portinari
Vítor da Costa


A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem, em votação simbólica, a “PEC da Transição”, que abre espaço no Orçamento de 2023 para promessas de campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como manter o Bolsa Família em R$600 e dar aumento real ao salário mínimo. A proposta de emenda à Constituição, que deverá ser avaliada hoje pelos senadores em plenário, prevê um impacto total de R$ 168 bilhões: amplia o limite do teto de gastos em R$ 145 bilhões e permite a liberação de R$ 23 bilhões em investimentos fora da regra fiscal. A expectativa é de aprovação sem alterações no Senado, e o texto então seguirá para a Câmara dos Deputados.

Para conseguir aprovar a medida em 20 dias desde que a equipe de transição apresentou formalmente a primeira minuta da proposta, em 16 de novembro, o PT precisou aceitar quatro grandes mudanças. A primeira foi permitir que a PEC comece a valer ainda este ano, o que pode abrir um espaço fiscal de R$ 23 bilhões que seria usado para descongelar verbas de ministérios e pagar R$ 7,7 bilhões em emendas de relator, o chamado orçamento secreto.

Validade de dois anos

Além disso, a equipe de Lula teve de concordar com uma validade de dois anos da PEC — a ideia original era garantir espaço fiscal em todo o mandato do petista, por quatro anos. O texto aprovado ainda obriga o governo eleito a enviar uma nova proposta de âncora fiscal para o país, em substituição ao teto de gastos (que limita o aumento das despesas da União à inflação do ano anterior), até agosto de 2023. E, principalmente, o novo governo teve de reduzir o impacto total da medida, que em vez dos R $198 bilhões pleiteados, ampliará os gastos públicos em R$ 168 bilhões.

O texto apresentado na manhã de ontem pelo relator da PEC, senador Alexandre Silveira (PSD-MG), mantinha um impacto total de R$198 bilhões, mesmo valor da proposta original do PT, mas com valida dede dois anos. O relatório, contudo, previa um aumento do teto de gastos em R$ 175 bilhões, deixando apenas os R$ 22,9 bilhões para investimentos, resultado de excesso de arrecadação, fora da regra fiscal. Depois de horas de negociação, a PEC foi aprovada com uma redução de R $30 bilhões, permitindo que o teto seja ampliado em R$ 145 bilhões.

Apesar de alguns senadores já indicarem que tentarão diminuir ainda mais o valor com a apresentação de emendas no plenário, a expectativa é que o texto consiga ser aprovado como veio da CCJ.

Entre os deputados, há o compromisso de aprovar a PEC com a mesma redação do Senado na próxima semana. A equipe de Lula tem como prazo final o dia 22 de dezembro para ter a PEC promulgada, a tempo de fazer alterações no Orçamento de 2023.

Alexandre Silveira, que continuará como relator da PEC no plenário, diz que o acordo cria um ambiente mais propício para a votação prevista para hoje:

— É difícil fazer essa avaliação, nós precisamos de 49 votos, mas acho que teremos para aprovar o texto do jeito como ele saiu da CCJ. Agora, para alterar o texto, são eles que precisam de 49 votos (para qualquer mudança) e não vão colocar.

Redução bem recebida

A aprovação de uma PEC mais enxuta foi bem avaliada por especialistas do mercado, ainda que o valor de R$ 168 bilhões seja considerado alto.

— Reduz um pouco o impacto, mas ainda fica em um valor elevado. Com os R$ 168 bilhões, estamos falando em um aumento de despesas em torno de 1,7% do PIB — disse o economista da XP Tiago Sbardelotto.

Ele avalia como positiva, contudo, a manutenção do programa dentro de um teto de gastos ampliado:

— Com o Bolsa Família fora do teto, não haveria freio para a expansão do programa.

A economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, afirma que os investidores já esperavam um texto desidratado. Ela destaca, no entanto, que ainda restam dúvidas sobre o cenário das contas públicas:

— O que acontece com esses benefícios a partir de 2025? É difícil pensar que os valores serão reduzidos. Outra dúvidaéo que será feito com os R$ 105 bilhões que ficarão disponíveis dentro do Orçamento. Essaéa primeira das muitas discussões que podem vira acontecer para a acomodação dos gastos.

Ontem, a Bolsa subiu 0,72%, aos 110.189 pontos, ganhando impulso coma aprovação do texto desidratado. Já o dólar caiu 0,25%, negociado aR $5,26 após atingira mínima de R $5,22.