O Estado de São Paulo, n. 46815, 20/12/2021. Política p.A7

 

Planalto reciclou boatos para atacar urnas, diz PF

 

Samuel Lima

 

O governo de Jair Bolsonaro (PL) selecionou boatos de internet sem critério, não checou informações e ignorou alertas de peritos da Polícia Federal para montar a live em que atacou as urnas eletrônicas com um compilado de falsidades, em 29 de julho deste ano, como se fossem "provas" de fraude nas eleições.

A informação consta nos depoimentos de alguns dos envolvidos no caso para a PF, cujo relatório propôs a investigação de Bolsonaro no inquérito das milícias digitais. Segundo os relatos, o tema da live foi escolhido pelo próprio presidente.

O então ministro-chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, organizou o evento e delegou a coleta e produção de conteúdo ao ex-assessor da pasta Eduardo Gomes da Silva. Ele é quem aparece ao lado de Bolsonaro e apresenta os vídeos.

À PF, Gomes negou ter conhecimento de informática, programação, matemática ou estatística, nem sobre o funcionamento da urna eletrônica. Para subsidiar a apresentação, disse ter procurado "vídeos e assuntos da internet", usando sua "experiência funcional e pessoal". O coronel da reserva admitiu que "não checou a veracidade dos fatos" e se justificou dizendo que este "não era o objetivo" da live.

 

PLANILHA. A PF menciona diversas vezes um vídeo falso que mostra um "especialista" – que diz ter uma empresa de informática – argumentando que um algoritmo manipulou votos na eleição de 2014. A prova seria uma "alternância de votos" entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB).

Dois peritos criminais da PF participaram de reunião prévia, no dia 23, com Bolsonaro, Ramos e Gomes, na qual apontaram inconsistências no método e pediram que a planilha fosse enviada para análise. Ramos, segundo um dos peritos, teria sinalizado que não haveria tempo hábil para isso. E a planilha foi citada na live.

Procurado, o Palácio do Planalto não comentou.