O Estado de São Paulo, n. 46814, 19/12/2021. Política p.A8

 

Moro delega articulação política a presidente do Podemos

Luiz Vassallo

 

Filiado ao Podemos há pouco mais de um mês, o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro já experimenta obstáculos na articulação para consolidar uma candidatura à Presidência em 2022. Além do ambiente hostil de parte do mundo político por causa de sua atuação como juiz da Operação Lava Jato, Moro ainda enfrenta resistência de setores do próprio partido. A tarefa de costurar eventuais alianças e apoios foi delegada à presidente da legenda, a deputada federal Renata Abreu (SP).

Chamada de "chefe" por Moro, a parlamentar carrega a procuração do pré-candidato para conversas partidárias que envolvem o varejo político regional. A agenda de Moro ficou concentrada em reuniões com apoiadores, entrevistas à imprensa e eventos para a divulgação de seu livro, cujo acesso chega a custar R$ 90.

Na última semana, Moro esteve nos Estados Unidos para trazer sua mulher, Rosângela, e seus dois filhos de volta ao Brasil definitivamente. Enquanto isso, Renata comandou a reunião considerada até agora a mais importante para uma futura candidatura do ex-juiz. Ela esteve com o presidente do PSL, Luciano Bivar, e o deputado federal Junior Bozzella (PSL-SP). Ambos costuram a fusão entre o PSL e o DEM que resultará no União Brasil. As siglas representam, juntas, a maior bancada do Congresso.

As conversas ocorrem desde outubro. Bozzella é defensor da ideia de que o ex-juiz deveria ter Bivar como vice em 2022. O problema é que até agora o futuro presidente do União Brasil não mergulhou no projeto Moro.

Para Bozzella, ainda há margem para tirar aliados do presidente Jair Bolsonaro. "É um processo, vai levar um período lá na frente para a caneta do Bolsonaro começar a esvaziar. As pessoas também vão mudar as suas posições", disse.

Moro esteve ao lado de Renata com o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, logo após ele ser derrotado nas prévias do PSDB. Dirigentes do Podemos relataram que Renata deixou as portas abertas do partido para Leite, indicando a possibilidade de ele eventualmente ocupar o posto de vice. Pela lógica das negociações políticas, uma chapa pura tem menos chance de se concretizar, pois afasta possíveis alianças.

Empresária e advogada, Renata herdou do pai e do tio o comando do PTN – então um partido nanico –, que ela transformou no Podemos. Além de Moro, sua cartada maior, a legenda terá na eleição outros nomes que agregam uma imagem "lavajatista" e de centrodireita: Deltan Dallagnol e o general da reserva Carlos Alberto Santos Cruz. A presidente do Podemos tenta agora convencer Rosângela Moro a disputar uma vaga na Câmara, segundo afirmam aliados do exjuiz. No entanto, a ideia ainda enfrenta resistência do casal.

 

ESTADOS. Regionalmente, Moro continua a ter problemas internos no partido. O assunto foi discutido durante uma reunião no Rio, no último dia 9. Em Roraima, o dirigente da legenda, Pastor Isamar, já recebeu Bolsonaro em sua igreja e deixou o Podemos para se filiar ao PTB.

Outro reduto bolsonarista está no diretório de Mato Grosso, cujo maior representante é o deputado federal José Medeiros, também fechado com o presidente. Dirigentes do partido disseram ter dado um ultimato para que Medeiros anunciasse apoio de maneira clara e pública ao ex-juiz ou deixasse a legenda. O Estadão não localizou Medeiros. Seu gabinete não respondeu aos contatos da reportagem.

Outra preocupação está na relação entre o líder da bancada na Câmara, Igor Timo (MG), e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), outro pré-candidato à Presidência. Questionado sobre quem é seu favorito, Timo declarou apoio a Moro, ao lado de Pacheco: "A chapa dos sonhos".

Na Bahia, um dos mais antigos quadros do Podemos, o deputado federal João Carlos Bacelar, declarou abertamente, durante uma visita de Lula, apoio a Jacques Wagner (PT) para governador. Ele, no entanto, já deu declarações públicas de que vai apoiar o candidato de seu partido ao Planalto. Procurado, o deputado não se pronunciou.