Valor Econômico, v. 20, n. 4877, 09/11/2019. Empresas, p. B4

Lei das estatais não vale para conselho fiscal, diz Justiça

Ana Paula Ragazzi


A 21ª Vara Federal de Minas Gerais manteve o entendimento de uma liminar de 2018 que avaliava que as recomendações do artigo 17 da Lei das Estatais para a indicação de conselheiros de administração nessas empresas não valem para as escolhas de integrantes do conselho fiscal.

O Estado de Minas Gerais levou o caso à Justiça depois que, no ano passado, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) questionou indicações de secretários de Estado para o conselho fiscal da Cemig. A autarquia, por meio de ofício, dizia que esse tipo de escolha estava entre as vedações do artigo 17 da Lei 13.303/2016 e que eram aplicáveis também ao conselho fiscal.

A Procuradoria Federal da CVM comunicou a decisão aos acionistas que questionaram as indicações e se disse impedida de apurar “eventual infração”. A autarquia já protocolou uma apelação da decisão judicial e aguarda julgamento.

A Lei das Estatais surgiu com o intuito de ser um instrumento de prevenção à corrupção e também de afastar interferências indevidas dos governos na administração dessas companhias.

O conselho fiscal é o órgão responsável por fiscalizar os atos da administração e verificar o cumprimento de seus deveres legais e estatutários. Os integrantes examinam a regularidade administrativa e contábil da empresa, sem se envolver nos atos de gestão e nos negócios da companhia.

Foi a partir dessa ótica que a Justiça mineira sustentou o seu entendimento. A avaliação é que pelo fato de o conselheiro fiscal não interferir na administração, a lei não trouxe a esses integrantes as mesmas restrições impostas ao conselho de administração.

A decisão destacou que não há proibição para que secretários de Estado ocupem o conselho fiscal, reforçando que quando a lei trata desse órgão não faz nenhuma remissão ao artigo 17, que se refere os conselheiros de administração. Nesse sentido, o “silêncio” não constituiria “mera omissão”, mas sim “explicita a vontade do legislador de tratar de forma diversa tais órgãos de controle de estatais”. E reforçou que a norma não poderia ser interpretada por analogia, “como parece pretender” a CVM.

A Justiça determinou que o governo tem o direito de fazer as indicações e tornou sem efeito a orientação da CVM, determinando que a autarquia não instaure qualquer processo contra o Estado de Minas ou a Cemig.

O caso começou no ano passado, mas o atual governo Romeu Zema, do Partido Novo, fez, neste ano, indicações de cinco secretários estaduais para o conselho fiscal da Cemig. Três são efetivos: Gustavo Barbosa (Fazenda); Marco Barcelos (Infraestrutura e Mobilidade); Elizabeth Jacometti (Desenvolvimento Social). Eles receberão R$ 13,7 mil mensais pelo conselho e, somando o salário de secretário, no total, R$ 23 mil. Os secretários do Meio Ambiente e da Saúde são suplentes e recebem, no total, R$ 20 mil mensais. O governo também indicou secretários para conselhos fiscais de Taesa e Light. Esse bônus aos secretários, via conselhos de estatais, foi um ponto polêmico da reforma administrativa de Zema. Procurado, o governo de Minas não deu entrevista. A Amec, associação de investidores no mercado de capitais, disse que ainda precisa estudar o tema.