Correio Braziliense, n. 21657, 03/07/2022. Política, p. 5

Uma cadeira incômoda no STF

Luana Patriolino


O ministro Luiz Fux entra na reta final da sua presidência do Supremo Tribunal Federal, um período marcado pelos constantes ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores à Corte e aos magistrados que a compõem. A contragosto, segundo fontes do Judiciário, ele viu o STF tornar-se o protagonista dos debates políticos, o que fez com a convivência entre os poderes, outrora harmônica, estivesse sujeita aos humores de vários atores políticos interessados em enfraquecer a Corte.

Fux se prepara para entregar o comando do Supremo à ministra Rosa Weber, que, a partir de 9 de setembro, terá o desafio de tocar a Casa no durante a mais tensa campanha eleitoral desde a redemocratização do país.

Na semana passada, no discurso de encerramento do semestre do Judiciário, Fux afirmou que o STF continuará vigilante para garantir a lisura das eleições de outubro. O ministro ainda destacou a produtividade dos ministros para julgar os processos, e salientou que “não foram poucas, nem triviais, as controvérsias”.

Perfil

Com um perfil considerado discreto, a postura de Fux, porém, é alvo de críticas de seus pares. Alguns esperavam que ele tivesse uma posição mais firme ante aos sucessivos ataques de Bolsonaro (PL).

O analista político Melillo Dinis destaca que o presidente do STF navegou em mares inóspitos ao longo de dois anos. “De um lado, a pressão sobre o Judiciário causado pelo papel de muro de contenção exercido a partir do presidencialismo de coalizão de Bolsonaro. De outro, as relações com os outros 10 ministros, em um momento de mudanças de nomes (Kassio Nunes Marques e André Mendonça, ambos indicados pelo presidente da República) e de pautas”, apontou.

Uma crítica que paira sobre a atuação de Fux remete ao silêncio quando a Corte foi atacada pelos aliados do presidente por conta do julgamento do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) — condenado por atos antidemocráticos. Um contraste em relação ao 7 de Setembro de 2021, quando, em discurso, o ministro avisou que “ninguém fechará” o Supremo e que não aceitaria intimidações.

Para o cientista político André César, a data da Pátria no ano passado “mostra a dificuldade que qualquer pessoa sentada naquela cadeira, naquelas circunstâncias, teria enfrentado. O Supremo se tornou um ator político importante. Está com um protagonismo que historicamente não tinha”, observou.

Para a ministra Rosa Weber, que sucede Fux, o principal desafio é manter uma relação equilibrada entre a Corte e o Palácio do Planalto. Contrária aos holofotes, ela passou os últimos 10 anos no STF praticamente sem conceder entrevistas. Além disso, é vista pelos seus pares como discreta e técnica.

O comportamento da magistrada ainda é um mistério e os bastidores no Supremo trabalham com a tendência de que ela se mantenha longe de polêmicas. Algo que, segundo André César, pode não ser adequado.

“A discrição é uma maneira de proteger, tentando minimizar ao máximo o conflito. E quando se fala em conflito, a gente fala de Bolsonaro, que é um alimentador disso”, frisou.

O cientista político Leonardo Queiroz Leite, doutor em administração pública e governo pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP), destacou a importância do equilíbrio. “Uma coisa é um ministro como um ministro, outra é um ministro como presidente de um poder. Trata-se de algo muito mais delicado do que um magistrado emitir uma decisão ou opinião que possa causar desconforto ou discordância”, ressaltou.