O Estado de São Paulo, n. 46770, 05/11/2021. Internacional p.A16

 

Número de casos de covid na Europa volta a aumentar e preocupa OMS

 

A cobertura vacinal desigual e um relaxamento das medidas preventivas levaram a Europa a um “ponto crítico” da pandemia, disse ontem a Organização Mundial da Saúde (OMS), com casos novamente em níveis quase recordes e 500 mil mortes previstas até fevereiro.

Hans Kluge, diretor da OMS para a Europa – jurisdição que inclui países da Ásia Central –, disse que a região enfrenta “uma ameaça real do ressurgimento da covid”. Ele pediu que os governos restabeleçam ou mantenham as medidas sociais. “Estamos, mais uma vez, no epicentro de uma onda de covid”, disse.

Segundo a OMS, o número de casos na Europa e na Ásia Central aumentou 6% em uma semana, e as mortes, 12%, com as novas infecções diárias aumentando 55% no mês passado. Europa e Ásia Central agora respondem por 59% de todos os casos confirmados no mundo e quase metade de todas as mortes.

 

IDOSOS. O mais alarmante foi o rápido aumento de infecções e mortes em grupos populacionais mais velhos, com as taxas de internação mais do que dobrando em uma semana e 75% dos casos fatais ocorrendo entre pessoas com 65 anos ou mais, segundo a OMS.

“Se mantivermos essa trajetória, veremos mais meio milhão de mortes por covid-19 na Europa e na Ásia Central até 1.º de fevereiro e 43 países da região terão ocupação alta de leitos hospitalares”, disse.

 

RECORDES. A Alemanha é um dos países que vêm registrando recorde de casos, superando uma marca estabelecida em dezembro de 2020. Segundo autoridades de saúde do país, 33.949 contágios e 165 mortes foram confirmados nas últimas 24 horas.

O recorde foi quebrado um dia depois de o ministro da Saúde, Jens Spahn, ter afirmado que a Alemanha estava vivendo uma “pandemia de não vacinados” e a quarta onda de casos avançava com “força total”. Spahn se reuniu ontem com autoridades de saúde dos governos estaduais para definir uma estratégia de combate ao vírus durante o inverno europeu. Eles discutiriam a campanha de reforço vacinal e a possibilidade de reintroduzir restrições.

A campanha de vacinação contra a covid-19 na Alemanha está atrasada em relação a outros países da Europa: 66,5% dos alemães estão totalmente vacinados, bem menos do que os 90% de Portugal ou dos 80% da Espanha.

Ao falar da “pandemia de não vacinados”, Spahn sugeriu que o governo pode adotar novas restrições, como impedir que aqueles que não se imunizaram entrem em locais como lojas e restaurantes. Até agora, a Alemanha tem sido mais flexível que alguns de seus vizinhos, como França e Itália, que estão exigindo os chamados certificados de vacinação.

A OMS disse que a cobertura vacinal insuficiente e o relaxamento das medidas sociais e de saúde pública são os culpados pelo novo avanço da covid. Com um bilhão de doses administradas na Europa e na Ásia Central, as vacinas teriam mitigado o problema.

 

SURTOS. Mas, enquanto 70% das pessoas em alguns países estão totalmente vacinadas, há países com apenas 10% de imunizados. “Onde a absorção da vacina é baixa, em muitos países do Báltico, Europa Central e Oriental e nos Bálcãs, as taxas de internação hospitalar são altas”, disse Kluge.

As autoridades devem acelerar as campanhas de vacinação, incluindo vacinas de reforço para grupos de risco, de acordo com ele. “A maioria das pessoas hospitalizadas e morrendo de covid-19 hoje não está totalmente vacinada.”

No entanto, medidas de saúde pública, como testes e rastreamento, e medidas sociais, como máscara e distanciamento, são igualmente vitais, de acordo com a OMS. Segundo Kluge, se 95% das pessoas usassem máscaras na Europa e na Ásia Central “até 188 mil vidas da estimativa de meio milhão de mortos seriam evitadas”.

Catherine Smallwood, funcionária da OMS na Europa, disse que os países que suspenderam as medidas preventivas experimentaram surto de infecções. A vacinação é responsável por eles não terem as taxas de hospitalização ou mortalidade tão altas. “Mas, quanto mais casos houver, mais pessoas acabarão no hospital e mais pacientes morrerão”, disse Smallwood.

 

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Região da Itália que liderou protestos antivacina enfrenta surto

 

TRIESTE, ITÁLIA

 

Quando a Itália introduziu o passe sanitário mais rígido da Europa, no mês passado, a cidade portuária de Trieste – que já foi um centro cosmopolita do Império Austro-Húngaro – tornou-se o epicentro de protestos conduzidos pelos céticos da vacina, ao lado dos trabalhadores portuários, gritando que a medida infringia seu direito ao trabalho. Agora, duas semanas depois, Trieste vive um surto de covid ligado diretamente aos protestos, que ameaçam lotar as UTIs, forçar novas restrições de distanciamento social e arruinar a reputação da cidade.

"A situação em Trieste é particularmente preocupante", disse Fabio Barbone, epidemiologista que lidera o combate à propagação da covid na região de Friuli-Venezia Giulia, cuja capital é Trieste. O governador da região, Massimiliano Fedriga, foi mais direto. "É o momento de dizer com clareza: chega de idiotice".

As medidas restritivas da Itália, que entraram em vigor em 15 de outubro, exigem prova de vacinação, um teste rápido negativo ou recuperação recente de covid para ir ao local de trabalho.

Sob a liderança do primeiro-ministro, Mario Draghi, a Itália conseguiu conter os casos da covid depois de ter sido devastada no início da pandemia, fato elogiado na cúpula do G-20 que ele sediou no fim de semana, em Roma.

No entanto, o surto de Trieste mostra como uma minoria não vacinada – seja motivada por preocupações sobre liberdade, direito ao trabalho ou teorias de conspiração – ainda pode ameaçar a saúde pública e como é difícil convencer as pessoas resistentes à vacina.

A Itália não está sozinha. Na Alemanha, um aumento nos casos e hospitalizações levou o ministro da Saúde, Jens Spahn, a declarar que os alemães vivem "uma pandemia entre os não vacinados".

O vice-governador de Friuli-Venezia Giulia, Riccardo Riccardi, disse que o índice de infecção na região tem muito a ver com sua localização, no coração da Europa Central. Mas Valerio Valenti, principal autoridade policial de Trieste, disse que o surto atual estava "estritamente relacionado" aos protestos. Os médicos concordaram. "A maior aglomeração", disse Barbone, "surgiu em 93 pessoas que se amontoaram sem máscaras e gritaram slogans nos comícios em Trieste. Todas essas pessoas não foram vacinadas."/ NYT 

 

"Vivemos em uma zona onde existe uma circulação do vírus extremamente elevada"

Riccardo Riccardi

Vice-governador de Friuli-Venezia Giulia