O Estado de S. Paulo, n. 46734, 30/09/2021. Política, p. A8

‘Nunca se viu essa demora no Senado’

Eliane Cantanhêde


O presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, manifestou ontem preocupação com a demora inexplicável do Senado em sabatinar o exministro da Justiça André Mendonça para a 11.ª vaga do tribunal. Isso cria constrangimentos e um problema institucional, porque o plenário e a Segunda Turma da Corte passam a julgar e decidir com risco de empate no resultado.

Segundo Fux, o longo atraso em aprovar o substituto do ministro Marco Aurélio Mello causa prejuízos à pauta e ao trabalho do Supremo. “Por que essa demora? Outros que foram indicados depois do ex-ministro da Justiça já foram sabatinados e confirmados”, disse Fux ao Estadão, citando o procurador-geral da República, Augusto Aras, que já foi até empossado para um segundo mandato.

“A indicação de um nome para o Supremo (pelo presidente da República) pode até demorar, porque é preciso analisar nomes e escolher o melhor, mas nunca se viu essa demora no Senado para sabatinar o escolhido”, lembrou Fux, negando, porém, que tenha dado um único telefonema que fosse para o senador Davi Alcolumbre (DEMAP), principal responsável pelo adiamento sem prazo da sabatina de Mendonça.

Fux disse que já conversou institucionalmente, sim, com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para defender a agilização de sabatinas, não só de Mendonça, mas do indicado pelo Supremo para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Ele, porém, afirmou que não tentou e nunca tentaria pressionar Alcolumbre para marcar logo a sabatina e desmentiu que tenha falado com o senador sobre as posições de Mendonça quanto à Lava Jato e quanto à prisão após condenação em segunda instância.

“Desafio qualquer um a identificar um telefonema meu para o senador Alcolumbre”, disse. “E eu nunca falei com o ex-ministro André Mendonça sobre Lava Jato e segunda instância, nem sei o que ele pensa sobre essas questões. Minha posição é institucional”, acrescentou, relatando que o “incômodo” não é apenas dele, mas dos demais ministros do Supremo.

Fux disse que não sabe os motivos de Alcolumbre para adiar a sabatina de Mendonça, mas, no Supremo e no Senado, os motivos são bastante conhecidos – e comezinhos: uma retaliação ao governo federal, porque interesses pessoais e políticos de Alcolumbre no Amapá não estariam sendo atendidos. Ele tem o poder de marcar a sabatina por ser presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Julgamento. Na noite de ontem aconteceu o que Fux previra horas antes em entrevista ao Estadão: deu empate de cinco a cinco no plenário. Só com a posse do 11.º ministro o julgamento poderá ser concluído, para um lado ou para outro.

No caso, foram três ações contra o ex-prefeito de Pirambu (SE) e ex-deputado André Moura. Ele foi condenado nas duas primeiras, por 6 a 4, mas houve empate de 5 a 5 na terceira. Como o regimento do Supremo diz que nesses casos não vale a regra de “na dúvida, pró-réu”, o julgamento ficará inconcluso até ser preenchida a vaga do ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou em julho.

A expectativa de senadores ouvidos pelo Estadão é de que a sabatina de Mendonça seja marcada para a semana de 16 de outubro, mas Alcolumbre continua fazendo mistério e guerra de nervos. Isso não apenas desgasta Mendonça como incomoda o presidente e os ministros do Supremo e cria o risco de empate nas votações da Suprema Corte. Tudo por birra de um único senador.