O Estado de S. Paulo, n. 46729, 25/09/2021. Política, p. A10

Falta de multa pode atrapalhar, diz especialista



O veto do governador João Doria (PSDB) à aplicação de multa em caso de descumprimento da lei que obriga condomínios a reportarem casos de violência doméstica é vista por especialistas como uma limitação para que a norma tenha mais efeito. O governo argumentou que estipular uma sanção financeira não seria de competência estadual, mas federal.

"Incumbe à União legislar sobre normas gerais, de alcance nacional, cabendo aos Estados pormenorizá-las com fundamento em sua competência suplementar", escreveu o governo, no documento em que explica o veto. Elisa Costa Cruz, defensora pública no Rio, concorda com a justificativa, mas prevê dificuldades com o veto. "Se houver o entendimento que a lei se refere a Direito Civil, por criar uma obrigação ao síndico, não deveria ter sido feita no Estado de São Paulo, mas no Congresso Nacional", diz. "O veto é ruim porque a ausência de punição deixa tudo no voluntarismo, no desejo que se realize."

Especialista em Direito Civil, Renato de Mello Almada também prevê limitações diante da falta de penalização financeira. "No Brasil, quando há uma lei sem previsão de sanção, ela acaba caindo no esquecimento", afirma. "A partir do momento que temos isso enquanto regra federal, derruba-se o argumento de incompetência legislativa e se torna uma ferramenta efetiva de combate à violência doméstica", avalia Almada. Aprovado no Senado, o projeto de lei nacional tramita na Câmara.

Já Marília Golfieri Angella, especialista em Direito da Mulher, não sente falta de multa. "A lei cumpre o papel dela de levar informação à população sobre a violência e a responsabilidade da sociedade."

Denúncia e sigilo. Para Elisa, outros pontos negativos foram a ausência de incentivo mais forte para que outros vizinhos denunciem e uma regra de sigilo, que assegure que o condomínio, por meio do síndico ou administrador, receba a denúncia de forma anônima. “Olha o medo que as pessoas sentem. Muitas não se sentem seguras de que vão contribuir”, alerta a defensora.