O Estado de S. Paulo, n. 46724, 20/09/2021. Economia, p. B8

Diversidade é desafio no cargo de CFO

Jenne Andrade


A cadeira de CFO (sigla para chief financial officer, o diretor financeiro) de uma empresa não é fácil de se ocupar, principalmente se a pessoa for mulher ou negra. De acordo com a pesquisa "O Perfil do CFO no Brasil 2021", realizada pelo Insper em parceria com a Assetz Expert Recruitment, apenas 10% destes executivos são do gênero feminino e 8% são pretos ou pardos. O estudo ouviu 128 pessoas, integrantes de companhias com pelo menos R$ 1 bilhão em faturamento.

É importante ressaltar que, entre os participantes, apenas um CFO se encaixou nos dois principais grupos minoritários – ou seja, mulher e negra. No geral, o Insper apontou que os diretores financeiros das empresas brasileiras são majoritariamente brancos (85%), homens (90%) e com idade média de 47 anos. A maioria é formada em cursos de administração (46%), ciências econômicas (21%) ou engenharia (20%), sendo que 70% têm pós-graduação.

Em questão de diversidade, os números são piores do que os últimos dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Mensal (Pnad Contínua). Em 2019, por exemplo, as mulheres ocupavam 37,4% dos cargos gerenciais. Um ano antes, 30% dos profissionais negros trabalhavam em posições de liderança.

"É uma luta constante, um desafio do dia a dia de entrar, ter voz, ter vez e não passar despercebida em um processo. Fui CFO por mais de 14 anos, e não foi uma, nem duas vezes, que sentei na mesa e era a única mulher", afirma Rachel Maia, presidente da RM Consulting e conselheira administrativa, embaixadora da W-CFO Brazil, além de primeira mulher negra a assumir uma vaga em um conselho de empresa listada. "É fundamental a união desses 10% de mulheres."

O acesso restrito aos cargos de CFO, e de liderança como um todo, contrasta com a composição da população brasileira, formada 54% por negros e 51,8% por mulheres. "Essa pesquisa só confirma o que outras investigações apontam, que há uma espécie de sub-representação desses grupos em cargos, que, dentro do universo corporativo, são chamados de C-levels. Ou seja, CEOS, CFOS e por aí vai", afirma Márcio Macedo, professor e coordenador de diversidade da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP).

A desigualdade entre mulheres e homens, negros e brancos, pode ser observada no caminho percorrido por estes executivos até o cargo de chefia no mercado financeiro. Uma minoria das profissionais mulheres, por exemplo, teve acesso à educação superior pública (31%), contra 40% dos negros e 42% dos demais grupos.

As diretoras também estão há menos tempo no cargo: em média, atuam como CFOS há cinco anos, enquanto os negros estão, há sete anos e os demais grupos, há cerca de oito anos. Por outro lado, a maioria delas (85%) chegou à cadeira por meio de promoção interna da empresa, enquanto o mesmo ocorreu com apenas 30% dos executivos negros e 47% dos demais grupos.

O estilo de liderança diferente das mulheres é destacado por Silvia Vilas Boas, CFO da Natura & Co América Latina. Formada em engenharia mecatrônica pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (Puc-minas). "As mulheres escutam as pessoas e exercem empatia melhor do que os homens, o que é uma dádiva. Conseguimos entender e navegar melhor nos ambientes. Sempre usei muito essas qualidades", afirma.

Quando questionadas sobre como se imaginam em cinco anos, 62% das mulheres responderam que não se veem nem como CEOS, nem como CFOS (cargo atual), mesmo que a idade média delas (47 anos) seja similar à dos homens – a resposta foi a mesma para 50% dos executivos negros. Considerando o panorama geral, 66% dos 128 respondentes se projetam como CEOS até 2025.

Para Maia, uma das explicações para esse panorama está ainda nos desafios que mulheres líderes enfrentam na rotina profissional. "Todo dia é uma batalha para fazer valer a sua posição. Toda hora você é questionada. Então, muitas vezes é exaustivo", explica.

Oportunidades desiguais. Olhando pelo prisma racial, 60% dos CFOS negros são formados em administração, uma das formações mais comuns no País, e 50% deles realizaram um MBA (pós-graduação destinada a administradores e executivos). O mesmo grau acadêmico é apresentado por 62% do público feminino e 71% dos demais participantes da pesquisa.

Quando o assunto é trabalho ou estudos no exterior, a diferença é ainda mais gritante. Nenhum dos entrevistados negros teve a oportunidade de cursar um MBA em um país estrangeiro, ante 8% das mulheres e 19% dos demais profissionais. Esse grupo racial também tem menos experiência profissional fora do Brasil (31%), em comparação com os diretores financeiros brancos e de outros grupos raciais (44%).

O CFO do futuro? A pesquisa também aponta as habilidades técnicas e comportamentais que os CFOS acreditam que serão determinantes para o cargo no futuro. Dentre as habilidades técnicas, planejamento estratégico (51%), gestão de riscos (45%) e tesouraria estratégica (36%) foram apontados como as principais competências. Entre as skills comportamentais, adaptar-se às mudanças foi a característica preponderante para 67% dos entrevistados.

Vilas Boas afirma que a mais importante das habilidades para a contratação de um novo funcionário é a capacidade de aprender. "Tudo o que ele (o candidato) tem de conhecimento até hoje é importante, mas não será suficiente. Então busco pessoas que aprendam rápido, pois vivemos em um cenário de mudanças constantes."

10%

Dos CFOS no brasil são mulheres, e 8% são negros