O Estado de São Paulo, n. 46754, 20/10/2021. Política p.A12

 

Alvo de PEC na Câmara, Conselho do MP vai investigar força-tarefa da Lava Jato do Rio

Decisão ocorre após órgão mandar demitir procurador do Paraná; votação de PEC que altera composição de colegiado é adiada

 

Alvo de uma proposta de emenda constitucional em tramitação no Congresso, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) determinou ontem a abertura de procedimento disciplinar para apurar a conduta de 11 procuradores da extinta força-tarefa da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro. A decisão foi tomada um dia depois de o órgão responsável por fiscalizar a conduta de promotores e procuradores determinar a demissão de Diogo Castor de Mattos, integrante da Lava Jato em Curitiba, pela compra de um outdoor para homenagear a força-tarefa.

As ações do CNMP que atingem ex-integrantes da operação ocorrem no momento em que a Câmara tenta votar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 5/21) que busca alterar a composição do CNMP, ampliando os poderes do Congresso sobre o órgão. A PEC gerou um debate sobre a atuação do conselho. O argumento dos parlamentares que defendem a reforma do órgão é que ele se tornou corporativista e ineficaz. Representantes do Ministério Público e entidades chamam o texto de "PEC da Vingança" – como se fosse uma resposta da classe política a investigações contra a corrupção.

A PEC altera a composição e a função do colegiado, criado em 2004. Entre os principais itens da proposta estão o aumento de assentos reservados a indicações do Congresso, que passam de dois para cinco, e a determinação de que um dos escolhidos pelo Poder Legislativo seja também o corregedor-geral do órgão.
Ontem, o da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), cancelou a sessão plenária marcada para votar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que muda a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Nos bastidores, líderes dizem que ainda não há votos suficientes para aprovar a proposta. Por ser uma PEC, a aprovação demandaria maioria qualificada, com três quintos dos deputados em dois turnos de votação – ou 308 votos entre os 513 deputados. É a terceira vez que a votação é adiada. O texto pode ser apreciado hoje.
Na semana passada, os partidos se dividiram sobre a proposta. Enquanto o PT e o PC do B eram favoráveis ao texto, PSB, PDT e PSOL orientaram os deputados a votar contra.

No centro, a rejeição foi manifestada pelo MDB e Podemos. Ontem, Lira voltou a defender a aprovação do texto. "Quem apura erros do MP? Qual o controle externo? Não tem sequer Código de Ética", afirmou, em entrevista à revista Veja.
Um novo texto circulou nos bastidores ontem, que seria resultado de um acordo com a Procuradoria-geral da União (PGR) e as Procuradorias-gerais da Justiça nos Estados, mas não teria apoio das entidades sindicais que representam procuradores e promotores. Esse novo texto manteria o aumento dos membros de 14 para 17, mas uma das vagas novas passaria a ser dos Ministérios Públicos Estaduais, enquanto Câmara e Senado teriam um assento a mais cada. Já o corregedor-geral seria, necessariamente, da carreira do MP Estadual, indicado a partir de uma lista quíntupla pelos procuradores-gerais dos Estados, com escolha final alternada entre Câmara e Senado.

 

HISTÓRICO.
Desde a sua criação, o conselho aplicou algum tipo de pena em 5% dos casos avaliados pelo órgão. Conforme dados do próprio CNMP, das 6150 reclamações disciplinares abertas a partir de 2005, foram aplicadas 308 penas disciplinares (5% do total).
Diogo Castor disse ontem que vai recorrer da decisão do colegiado que lhe impôs pena de demissão. Em nota, ele classificou a decisão do colegiado como "desproporcional" e vai na contramão da recomendação de suspensão, pelo prazo máximo de 90 , emitida pela comissão processante que investigou o caso. A Corregedoria do Ministério Público também foi favorável à conversão da pena de demissão em suspensão.
"A alegada falta funcional foi praticada fora do exercício da sua função pública em investigações e processos e sem envolver recursos públicos, de modo que a pena aplicada é desproporcional, mesmo quando comparada com as penas aplicadas pelo próprio conselho nos demais casos ao longo dos últimos anos", disse o procurador na nota.

No caso envolvendo a extinta força-tarefa da Lava Jato no Rio, o CNMP referendou a decisão individual do corregedor acional Rinaldo Reis Lima, que mandou abrir procedimento administrativo disciplinar para apurar se os 11 procuradores violaram o sigilo funcional ao divulgarem uma denúncia contra os ex-senadores Romero Jucá e Edison Lobão e o filho dele, Márcio Lobão, no portal do Ministério Público Federal. Foram oito votos a favor da abertura do processo, um contrário e outros dois favoráveis à abertura de sindicância.

A maioria do colegiado entendeu que há "justa causa" para o aprofundamento a investigação. Prevaleceu o entendimento de que parte dos dados estava encoberta por sigilo judicial na data em que eles foram divulgados no site institucional. O procedimento disciplinar pode terminar em suspensão e até demissão. Procurado, o MPF no Rio informou que não iria se manifestar. 

"O ponto central que nós temos que debater para referendar esse PAD é se o membro do Ministério Público, como titular da ação penal, tem o domínio do sigilo daqueles dados que são sigilosos por lei (...) Os fatos estavam sob o sigilo e não poderiam ser publicizados."
Rinaldo Reis Lima Corregedor do Conselho Nacional do Ministério Público.

 

Sanções aplicadas

6.438
reclamações disciplinares foram abertas pelo CNMP desde 2005

308
penas disciplinares foram aplicadas (5% do total)

1
pena de admoestação verbal foi aplicada

77
advertências

70
censuras

96
suspensõ

8
remoções compulsórias

19
cassação de disponibilidade

22
demissões/exonerações

12
cassações de aposentadoria

 

RAYSSA MOTTA, ANNE WARTH E WESLLEY GALZO