O Estado de S. Paulo, n. 46720, 16/09/2021. Política, p. A10

Evangélicos tentam 'salvar' indicação de André Mendonça

Lauriberto Pompeu


Sem defensores empenhados e diante da falta de interlocução do governo com o Senado, o ex-ministro da Justiça e ex-advogado-geral da União André Mendonça conta apenas com o apoio dos evangélicos para se viabilizar como a segunda indicação do presidente Jair Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal (STF). O líder da bancada evangélica, deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP), procurou ontem o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para tentar destravar a indicação.

"Pacheco vai ajustar a pauta com Alcolumbre. Vai pautar rápido", disse o deputado, em tom otimista, ao citar o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Davi Alcolumbre (DEM-AP). Logo após o encontro com o presidente do Senado, Cezinha e líderes evangélicos foram até o Palácio do Planalto cobrar empenho de Bolsonaro. Em seguida, o próprio Mendonça foi até a sede do Executivo se reunir com o presidente.

Num movimento incomum e que expõe a crise na articulação política do governo, Alcolumbre tem se recusado a colocar a indicação de Mendonça na pauta desde o dia 13 de julho. Sem a sabatina e a votação na CCJ, o processo não anda na Casa. E ontem, apesar das pressões, avisou que não tem data definida.

Alcolumbre justifica a interlocutores que não há votos para aprovar o nome do ex-ministro da Justiça e sugere ao Planalto que troque Mendonça pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. Mas, nos bastidores, a interpretação é de que o ex-presidente do Senado tem usado essa agenda para "dar um troco" no governo após ser preterido em indicação para ministérios e ver seu irmão perder a eleição em Macapá com a demora do governo em resolver uma crise energética no Amapá, no fim do ano passado.

O Estadão apurou que, entre ministros do Supremo, o nome do procurador-geral da República também é considerado "mais robusto" para ocupar uma cadeira na mais alta Corte do País. Integrantes do tribunal têm ainda estranhado a falta de apoio do governo Bolsonaro a Mendonça depois da indicação, o que é bastante incomum.

Em rodas de conversas em Brasília, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistasal), também já se colocou contra a indicação do ex-advogado-geral da União. Nos encontros reservados, Lira costuma dizer que Mendonça seria "o Fachin de Bolsonaro", numa referência ao ministro Edson Fachin, indicado para a Corte pela expresidente Dilma Rousseff (PT) e relator da Operação Lava Jato no tribunal.

Além de Aras, nomes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como o presidente da corte, Humberto Martins, e o ministro Luis Felipe Salomão, são mais bem aceitos no meio político do que o de Mendonça.

Bolsonaro optou por Mendonça depois de prometer indicar para uma vaga no Supremo um nome "terrivelmente evangélico". Segundo interlocutores do Planalto, o presidente prefere que o Senado faça o papel de "derrubar" a indicação. Dessa forma, ele pode dizer que tentou "pagar a conta", mas, "politicamente", o nome não se viabilizou. "O presidente se obrigou a indicar um evangélico. Se quiserem fazer safadeza com o André, isso não desobriga o presidente, vai ter que indicar outro evangélico", disse o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Na reunião com os evangélicos ontem, Bolsonaro teria afirmado que "não tem plano B".

Cobrança. Ontem, os senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE), Alvaro Dias (Podemos-PR, Esperidião Amin (Progressistas-sc) e Soraya Thronicke (PSL-MS) fizeram um apelo público para que Alcolumbre paute a indicação. Como resposta, ouviram do presidente da CCJ que ainda não há previsão para essa agenda. Nenhum dos atuais ministros do Supremo teve de esperar tanto tempo para a sabatina.

"Quais as razões republicanas para que se tenha o maior retardo numa sabatina na história do Senado?", cobrou Vieira. "Fica registrado seu questionamento", esquivou-se Alcolumbre.

Após as cobranças, os líderes do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), e no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), se viram obrigados a pedir a Pacheco uma sinalização de data. O presidente do Senado respondeu, contudo, que não pode interferir numa decisão de Alcolumbre.

Mendonça tem apoio declarado do PSD e PL. O placar do Estadão mostrou que 25 senadores se dizem favoráveis à indicação. Ele precisa de 41 votos.

Agenda

"(Rodrigo) Pachecovai ajustar a pauta com (Davi) Alcolumbre. Vai pautar rápido." Cezinha de Madureira (PSD-SP)

Deputado e líder da bancada evangélica, sobre a sabatina de André Mendonça no Senado