O Globo, n. 32736, 24/03/2023. Política, p. 8

Decisão sobre MPs aumenta rixa entre Lira e Pacheco

Gabriel Sabóia
Lauriberto Pompeu


Sem um acordo sobre o rito das medidas provisórias (MPs), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), determinou ontem a retomada das comissões mistas, formadas por deputados e senadores, que analisam os textos antes de serem votados no plenários das Casas. No mesmo momento em que o senador fazia o anúncio, o deputado Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, chamou a decisão de “truculenta”. Mais tarde, por meio de nota, o deputado baixou o tom e afirmou que “segue em busca de entendimento” com Pacheco.

O impasse diz respeito ao andamento das MPs no Congresso. Até a pandemia, elas começavam a ser analisadas pelas comissões mistas. Durante a pandemia de Covid-19, para dar celeridade ao processo, o modelo foi modificado para que o ponto de partida da tramitação pasasse a ser o plenário da Câmara, seguindo ao Senado em seguida. Lira não quer a volta do formato original, já que o atual dá mais poder aos deputados, enquanto Pacheco não deseja a manutenção do atual modelo. Uma possível saída é a apresentação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que definiria a alternância entre os plenários das Casas, mas o acordo pelo texto empacou.

Há assuntos relevantes para o governo enviados via MP, como a reestruturação na Esplanada dos Ministérios (com o fim da Funasa, por exemplo) e a retomada do voto de qualidade do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf ), que voltaria a beneficiar a União.

— Já se passaram mais de 50 dias, o prazo das medidas provisórias está sendo contado desde então. É muito importante que haja uma solução. Eu confio muito no bom senso, na razoabilidade. Vamos buscar estabelecer a ordem constitucional. —afirmou Pacheco.

Ele analisou uma questão de ordem do senador Renan Calheiros (MDB-AL), relembrando que a Constituição determina o funcionamento das comissões mistas. Mesmo se Lira não concordar com o modelo, como presidente do Congresso, Pacheco pode tentar negociar com os líderes da Câmara a indicação dos membros que cabem à Casa. Aliados de Lira acham a equação improvável.

Segundo Pacheco, as MPs que sobraram do governo de Jair Bolsonaro serão votadas primeiro pela Câmara. Já as editadas no governo Lula passarão por comissões mistas:

Em meio à queda de braço, Lira ameaçou ontem não cumprir a determinação de Pacheco e até driblar uma eventual decisão do STF ordenando o funcionamento do modelo. Em entrevista ao Valor, ele disse que os líderes da Câmara, “politicamente”, podem não indicar os membros do colegiado, por exemplo.

— Este gesto (de Pacheco) não vai levar a lugar nenhum. Não defendemos ir contra a Constituição, mas queremos um rito mais atual, que atenda a demanda das duas Casas. Não queremos guerra, mas não fui eu quem mudei texto e mudei com a minha palavra. A comissão mista truculenta não vai andar com medidas provisórias. As lideranças do governo querem que o rito atual seja obedecido. Esta é uma decisão unilateral que não ajudará o Brasil — disse, alfinetando Pacheco em seguida.

— A gente está com algumas dificuldades em quem manda ou quem dirige o Senado.

No fim do dia Lira amenizou o discurso e anunciou que pautará na próxima semana as 13 MPs editadas pelo governo Bolsonaro em 2022 — as 29 enviadas por Lula estão paradas, o que preocupa a base governista. Com o gesto, Lira ganha prazo para negociar um novo rito de tramitação das medidas com o Senado.

“A presidência da Câmara dos Deputados segue firme em busca do entendimento com o Senado Federal, sem ferir as devidas prerrogativas, para buscarmos a melhor solução para avançar, e não retroagir a um modelo superado. Dessa forma, a presidência da Câmara entende como positiva a atitude do Senado Federal em encaminhar para análise desta Casa as 13 medidas provisórias oriundas do governo anterior.

“Já se passaram mais de 50 dias, o prazo das MPs está sendo contado. Vamos estabelecer a ordem constitucional”

Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado