O Globo, n. 32724, 12/03/2023. Opinião, p. 3

O próximo ministro do Supremo

Sérgio Rabello Tamm Renault


Em breve, o presidente Lula escolherá o substituto do ministro Ricardo Lewandowski, que se aposentará compulsoriamente no Supremo Tribunal Federal em maio. Lewandowski deixará saudades como um juiz correto, íntegro e corajoso.

Ao fazer sua escolha, Lula deverá optar por um cidadão com mais de 35 e menos de 70 anos, reputação ilibada e notável saber jurídico. A indicação do ministro do Supremo é uma das prerrogativas mais relevantes que a Constituição Federal reserva ao presidente da República. Como se vê, pelos poucos requisitos a que o presidente deve obedecer, há uma enorme discricionariedade para o exercício dessa prerrogativa. Isso apenas torna ainda maior a responsabilidade do chefe do Executivo. A partir da indicação do presidente, cabe à Comissão de Constituição e Justiça do Senado submetê-lo a uma sabatina e ao plenário aprovar seu nome. A sabatina e a votação pelo Senado, que deveriam ser uma oportunidade para aprofundar, em nome da sociedade, o conhecimento a respeito do que pensa o indicado e de como ele pretende agir no tribunal, revelam-se nada mais que um ritual de passagem. A verdade é que a indicação do presidente reveste-se de força política suficiente para garantir a aprovação do nome sem grande dificuldade. Não há registro na nossa História recente de indicação de presidente que não tenha sido aprovada com certa tranquilidade pelo Senado.

A aproximação da data da aposentadoria do ministro Lewandowski cria grande expectativa, e nomes de candidatos surgem como se estivéssemos próximos de um processo eleitoral qualquer. Não é. Trata-se de uma eleição onde há apenas um eleitor, o presidente da República, legitimado pelas urnas para fazer sua escolha.

Lula indicou em seus dois mandatos anteriores oito ministros. Já é o presidente que mais ministros indicou para a Suprema Corte. Ele tem afirmado publicamente que, nas condições em que ocorreram as escolhas que fez, não se arrepende de nenhuma. Não se sabe se, no íntimo, se arrependeu de alguma indicação, mas o importante é que os ministros indicados por ele honraram a toga, e sua declaração pública hoje é fator de estabilidade institucional. É bom que se diga que o comportamento do presidente Lula em relação ao Judiciário tem sido irrepreensível. Ele jamais afrontou ou descumpriu decisões judiciais e hoje segue com rigor as liturgias e protocolos próprios do peculiar relacionamento entre Poderes.

Os tempos mudaram, o Judiciário passou a ser protagonista dos acontecimentos mais importantes do país, e o Supremo passou a cumprir papel diferenciado, fundamental para a estabilidade das nossas instituições e da própria democracia. As condições para a escolha de um ministro do Supremo são outras.

O presidente, ao indicar um ministro, leva em conta diversos fatores: proximidade pessoal, gênero, expectativa de lealdade, afinidade política, opinião de juristas próximos, currículo profissional, indicações políticas etc. Cada presidente privilegia os fatores que julga mais relevantes no momento da escolha. Lula 1 e 2 fez suas escolhas, Dilma Rousseff também. Assim como Michel Temer e Jair Bolsonaro fizeram as suas. Não é difícil identificar as reais razões das escolhas feitas.

É natural que no momento atual as especulações se avolumem, e qualquer previsão assume ares de adivinhação sobre o que se passa na cabeça do presidente Lula. Parece-me certo, contudo, que, sem Márcio Thomaz Bastos para auxiliá-lo, o presidente deixará guiar-se, mais do que nunca, por sua certeira intuição. Não há entre os nomes que aparecem publicamente na disputa alguém que pareça estar fora de lugar. Não há lugar nessa “disputa” para alguém que não se perfile ao lado dos garantistas, dos defensores intransigentes da democracia e do Estado de Direito. O presidente Lula tem dado demonstrações cotidianas de não querer agir com ressentimento, o que torna razoável acreditar que deverá indicar alguém sem olhar para o passado.