O Globo, n. 32720, 08/03/2023. Brasil, p. 10

Na linha de frente

Henrique Gomes Batista
Thayz Guimarães


Aos 22 anos, Helena de Souza Monteiro se tornou a primeira fuzileira naval brasileira em dezembro do ano passado. Embora o Brasil esteja atrasado em relação às forças militares de grandes potências e de países vizinhos, a Marinha comemorou o feito como um marco que pode levar mulheres a ocupar, em breve, 20% das posições da força.

— Todas são capazes, se estão determinadas —recomenda a fuzileira naval a possíveis interessadas. —Se desejam a carreira militar, estudem, se preparem fisicamente e façam parte.

Natural de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, Helena sempre aspirou ao mundo militar, mesmo sem ter ninguém da família próxima desse meio. Solteira e sem filhos, ela conta que, ao fazer o ensino médio em Quintino, na Zona Norte do Rio, ainda não conhecia bem as divisões militares e detalhes da carreira. Mas se preparou para o concurso de ingresso na Escola Naval.

Mudança em etapas

Atualmente, dos 358 mil militares brasileiros, 35.109 são mulheres, ou 9,78% do total, em diversos postos e graduações. Foi no fim do governo Dilma Rousseff, em 2014, que a Marinha autorizou a entrada de mulheres na Escola Naval. Mas elas tinham obrigatoriamente de ir para o quadro de intendentes, assumindo funções administrativas.

Em 2019, o Congresso criou a possibilidade de as alunas também irem para o corpo da Armada ou integrarem os Fuzileiros Navais — na linha de frente.

Dentre os 180 aspirantes da turma de Helena, a primeira em que essa escolha era possível, havia oito mulheres. Cinco optaram pela Armada e duas pela intendência. Embora Helena tenha sido a única mulher entre 30 novos fuzileiros, o caminho começa a se abrir: duas outras fuzileiras navais devem se formar em 2023, e mais uma no ano seguinte.

— É uma oportunidade que jamais imaginei, de ser a primeira. Sou muito grata a Deus e à Marinha. Quanto mais puder motivar as mulheres, melhor.

Helena sustenta que não sofreu machismo na Marinha ou na Escola Naval. Fez o mesmo treinamento físico, tático e estratégico dos outros aspirantes. Conquistou o respeito da tropa e muitas vezes tem liderança entre os colegas.

— Cada dia que passa tem mais mulheres no meio militar, fazendo algo novo, um curso diferente, vamos vencendo cada etapa —diz.

O vice-almirante Pedro Luis Gueiros Taulois, comandante do Pessoal de Fuzileiros Navais, é entusiasta da participação feminina:

— A mulher vem se inserindo há muito tempo, com muita responsabilidade e muito profissionalismo. É natural. Há espaço. A mulher é parte da solução da Marinha.

Disputa concorrida

Taulois conta que, na próxima turma da Escola Naval, que está com as inscrições abertas para o concurso, são esperados 480 alunos. Destes, 96 aspirantes, ou 20%, serão mulheres, afirma. O mesmo percentual é citado pelo almirante quando questionado sobre o crescimento da participação das mulheres na Marinha:

— Estamos em estudo (sobre o maior percentual de mulheres). A ideia é ampliar gradativamente até chegar a pelo menos 20% no curto prazo (atualmente, é de 11,57%). Fomos estudar outros países que incorporaram as mulheres nas forças armadas. Países de características diferentes: anglo-saxões, germânicos, latinos. Nossa expectativa é muito boa. O número de inscritas é muito alto: 7.450. Proporcionalmente, as vagas de mulheres estão mais concorridas que a dos homens —comenta o almirante, sobre a disputa para fazer parte da nova turma.