O Estado de São Paulo, n. 46691, 18/08/2021. Política p.A8

 

Braga Netto nega papel de 'poder moderador' das Forças.


Ministro da Defesa adota tom cauteloso em audiência na Câmara e tenta desvincular militares de ideia de ruptura no País

Lauriberto Pompeu

 

Em audiência pública na Câmara, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, adotou ontem tom cauteloso diante da escalada de tensão dos últimos dias entre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal e procurou amenizar declarações do presidente Jair Bolsonaro de que as Forças Armadas têm papel de "poder moderador" numa eventual crise.

Após o Estadão revelar que Braga Netto condicionou a realização das eleições de 2022 ao voto impresso no País, o general tentou desvincular os militares de qualquer plano de ruptura institucional. Negou que tenha feito ameaça à democracia e, diante de uma plateia de deputados, disse que nunca houve ditadura militar no Brasil. "Se houvesse ditadura, talvez muitas pessoas não estariam aqui", afirmou ele na sessão conjunta das comissões de Relações Exteriores, Fiscalização e Trabalho da Câmara.

Braga Netto se recusou a comentar o aviso de Bolsonaro de que pedirá o impeachment dos ministros do Supremo Luís Roberto Barroso, também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Alexandre de Moraes. O presidente alega que os dois "extrapolaram" os limites da Constituição e ainda ontem repetiu que solicitará ao Senado – a quem cabe julgar processos desse tipo – o afastamento dos magistrados.

"Não vou agora tentar cooptar senadores, de uma forma ou de outra, oferecendo alguma coisa para votarem o impeachment deles (ministros do STF)", disse Bolsonaro em entrevista à Rádio Capital Notícia, de Cuiabá. "Mas não pode um ministro do Supremo, no caso o Alexandre de Moraes, ele mesmo abre o inquérito, ele investiga, ele julga e ele prende. Não tem nem a participação do Ministério Público, nada. Vai fazer uma busca e apreensão na minha casa?"

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), mostrou que não levará o assunto adiante. "Precipitarmos uma discussão de impeachment, seja do Supremo ou do presidente da República, qualquer tipo de ruptura, não é algo recomendável para um Brasil que espera a retomada do crescimento, a pacificação geral, o combate à miséria e ao desemprego", afirmou Pacheco.

No auge da crise entre os poderes, Braga Netto tem atuado como escudo de Bolsonaro e tenta agora abrandar o discurso sobre o "papel moderador" dos militares. "O País tem somente três poderes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, que têm de estar harmônicos e independentes. A Força Armada trabalha com o que está em cima do artigo 142 (da Constituição Federal). É isso, sem especulações e sem ilações", declarou.

 

Recado. O ministro da Defesa foi questionado sobre reportagem do Estadão mostrando que, no dia 8 de julho, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), recebeu um recado dele, por meio de importante interlocutor político. Na ocasião, o general pediu para comunicar, a quem interessasse, que não haveria eleições em 2022 sem aprovação do voto impresso. A mudança no sistema eletrônico de votação foi rejeitada depois tanto na comissão especial da Câmara quanto no plenário da Casa.

"Reitero que não enviei ameaça alguma, não me comunico com presidentes dos poderes por intermédio de interlocutores. No mesmo dia, ainda pela manhã, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, confirmou publicamente que não houve esse episódio", afirmou Braga Netto. Apesar da declaração do general, Lira não negou o teor da reportagem. Disse apenas que as eleições de 2022 estão asseguradas. O Estadão mantém as informações.

"Quem decide sobre voto impresso não é Vossa Excelência. Quem decide é o Congresso Nacional e a Vossa Excelência caberá obedecer", afirmou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP). "E, caso não obedeça, será preso." O general disse que não daria mais opinião sobre voto impresso, embora já tenha divulgado nota defendendo a ideia. "Eu não vou dizer se sou a favor ou não. Estou aqui para esclarecer as posições dadas pelas Forças Armadas", argumentou.

 

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Câmara aprova em 2º turno PEC da reforma eleitoral.

 

A Câmara aprovou ontem, em segundo turno, a PEC da reforma eleitoral. O texto traz de volta as coligações entre partidos nas disputas proporcionais e restringe o alcance de decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as eleições. A PEC foi aprovada por 347 votos a 135. Houve três abstenções. Até a conclusão desta edição não havia mudanças no texto em relação ao que foi aprovado na semana passada.

O texto segue agora para o Senado, onde também precisa ser aprovado em dois turnos. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), prometeu pautar a reforma eleitoral. "Em respeito à importância da matéria, vamos submetê-la à apreciação do Senado", disse ele ao Estadão/broadcast.