O Globo, n. 32770, 27/04/2023. Mundo, p. 21

Em Madri, Lula volta a defender integridade territorial da Ucrânia

Ana Rosa Alves


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a se pronunciar sobre a guerra na Ucrânia ontem, após declarações prévias sobre o conflito desatarem repúdio das potências ocidentais nos últimos dias. Em encontro com o premier da Espanha, Pedro Sánchez, em Madri, Lula disse que “não pode haver dúvida” de que Brasília condena a invasão russa, mas que não cabe a ele decidir a quem pertence a Península da Crimeia, anexada pela Rússia em 2014.

Ao ser indagado por uma jornalista sobre a quem pertence a Crimeia e o Donbass —região ucraniana composta por Donetsk e Luhansk, territórios anexados por Moscou em setembro juntamente com as regiões de Kherson e Zaporíjia

— Lula não deu uma resposta direta:

— Não cabe a mim decidir de quem é a Crimeia. Quando você se sentar em uma mesa de negociação, você pode discutir qualquer coisa, até a Crimeia. Mas não sou eu que vou discutir isso, quem vai discutir isso são os russos e os ucranianos.

Lula e Sánchez responderam a perguntas da imprensa após uma reunião no Palácio de la Moncloa, a sede do governo, para onde o presidente brasileiro viajou na terça-feira após cinco dias em Portugal. Os dois líderes assinaram três memorandos de cooperação sobre educação, trabalho e desenvolvimento, mas as declarações do petista sobre a guerra voltaram a se sobressair.

A Crimeia foi anexada pela Rússia no início de 2014, após ser ocupada por tropas russas e forças pró-Moscou e em seguida à realização de um referendo unilateral. Votações similares foram realizadas no ano passado por grupos ligados ao Kremlin no Donbass, em Kherson e Zaporíjia. Nenhuma delas tem resultado internacionalmente reconhecido.

‘Nuances’ sobre guerra

A devolução das áreas é uma demanda do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, para negociar, mas parece improvável que os russos aceitem neste momento. Lula já indicou crer que ambos os lados do conflito precisam ceder e voltou a comentar o assunto ao defender a criação de um “clube da paz” para a mediação.

O pronunciamento de Lula em Madri veio após declarações durante sua viagem à Ásia neste mês causarem mal-estar diplomático entre o Brasil e as potências ocidentais. Na ocasião, o petista disse que os americanos e seus aliados europeus precisam parar “de incentivar a guerra” e equiparou as responsabilidades russas e ucranianas pelo conflito.

O premier agradeceu o “comprometimento do Brasil com relação a assuntos globais” após os anos de afastamento da cena multilateral no mandato de Jair Bolsonaro, mas ressaltou que há “nuances” entre as posições de Madri e Brasília.

— Sabemos que nessa guerra existe um agressor e um agredido. O agressor é Putin e o agredido é esse povo que busca lutar por sua liberdade e soberania nacional —afirmou.

Após o encontro com Sánchez, Lula teve um almoço no Palácio Real com o rei Felipe VI, acompanhado da primeira-dama, Janja. De lá, o presidente seguiu para o aeroporto, de onde partiu para o Brasil.