Correio Braziliense, n. 21542, 10/03/2022. Economia, p. 6

Procura-se consenso

Rosana Hessel
Ingrid Soares
Fernanda Strickland


Após mais um dia de reuniões sem consenso para evitar o aumento dos preços dos combustíveis, a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, considerou uma vitória o novo adiamento da votação dos projetos de lei que tratam do assunto no Senado Federal.

A equipe econômica tenta uma saída em que todos arquem com os custos e não apenas o governo federal, mas sem interferir na política de paridade de preços internacionais da estatal. A ala política do governo e o próprio presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda insistem nos subsídios e no  congelamento dos preços, medida que Guedes considera coisa de “maluco”.

Sem uma solução à vista, a estratégia do governo é ganhar tempo o máximo possível para criar um subsídio temporário, que pode ter um custo mensal de R$ 12 bilhões para o governo federal, para evitar os repasses nas bombas. O choque nos preços das commodities por conta da guerra no Leste Europeu tem feito o mercado elevar as projeções de inflação — que já estão acima do teto da meta, de 5% — e da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 10,75%, que passou a ter um piso de 13%, em dezembro.

Pelas contas de Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos, “um reajuste de 25% nos preços dos combustíveis implicará em  alta de 1 ponto percentual no IPCA” deste ano.

Os dois projetos relatados  pelo senador Jean Paul Prates (PT-RN) buscam medidas para conter a alta dos preços dos combustíveis e do gás de cozinha e estão na pauta do plenário desta quinta-feira. A sessão está prevista para começar às 10h. O horário é o prazo limite para entrega de emendas para os dois textos. O primeiro, o PLP 11/2020, muda a metodologia de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre os combustíveis, criando uma alíquota fixa e monofásica, e amplia a previsão para o auxílio gás para R$ 3,4 bilhões.

O segundo, o PL 1472/2021, implementa a Conta de Estabilização de Preços (CEP), com recursos provenientes, por exemplo, da tributação sobre a exportação do petróleo quando o barril ultrapassar US$ 45. A sugestão do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda e Finanças dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), de incluir a proposta do auxílio gás no PL 1.472, não foi acolhida pelo relator. Segundo ele, as mudanças feitas no substitutivo do PLP 11 “não implicam prejuízo aos orçamentos estaduais”.

Presidente do Congresso, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), fez um apelo em favor do entendimento. “Eu quero muito ter a colaboração de todas as bancadas, dos governadores dos estados, do governo federal. É muito importante cada um ceder um pouco pra gente poder ter soluções em relação a esse tema”, disse.

Após se reunir, na manhã de ontem, com Pacheco e Prates, Guedes sinalizou apoio apenas para o PLP 11. Mas, na reunião da tarde, o ministro recuou, ante o dissenso na cúpula do governo Bolsonaro. Segundo assessores, o Planalto vai esperar o resultado da votação dos projetos de Prates no Senado.

O vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) defendeu que subsidiar os combustíveis com recursos da Petrobras e do próprio governo seria a melhor alternativa. Membros da equipe econômica reconhecem que é possível reduzir uma parte da margem de lucro da estatal, “desde que não prejudique a saúde financeira da empresa”.

Entre os aliados, o clima é de expectativa. O líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), ressaltou que o governo tem acordo para votar apenas o PLP do ICMS. “Os governos estaduais apresentaram uma proposta de última hora e eu não conheço, nós [governo] não conhecemos e por isso não vamos votar”, disse. “Mas vai votar amanhã, mesmo que tenha que votar destaques”, acrescentou. Sobre o PL [da conta de estabilização] não tem acordo com o governo federal, mas vamos votar independentemente”, disse.

Para André César, cientista político, sócio da Hold Assessoria, a indefinição expressa o amadorismo por parte do governo. “O Planalto está correndo atrás porque, se for repassar a paridade do combustível, vai chegar a R$ 12 o litro. É muito pesado, tem impacto político eleitoral pesadíssimo, além do impacto inflacionário no resto, como o trigo. É bola de neve avassaladora”, acrescentou. Roberto Padovani, economista do banco BV, observou que a ideia do fundo de compensação é “boa no papel, mas ruim na prática”. “Não se sabe por quanto tempo vai ter um desvio de preço, qual a intensidade de elevação e o período de tempo em um momento em que o governo está aumentando a sua dívida”, alertou. (Colaboraram Taísa Medeiros e Raphael Felice)